A casa dos Cabello parece cem mil quilômetros mais longe, por conta da ansiedade. Primeiro, minha mãe quase não deixa que eu saia de casa, com um interrogatório enorme. Segundo, eu sei que assim que estiver naquela casa, terei que enfrentar Sinuhe primeiro, antes de ter qualquer contato com Camila.
Está tudo bem, Lauren. Sussurro para mim mesma na porta da casa, antes de bater três vezes. Cada segundo é uma tortura. Quase não consigo respirar enquanto ouço os passos se aproximarem da porta.
Quando a porta se abre, Sofia pula em mim, rindo e gritando "Lolo" várias vezes. Me pergunto se ela fica ali perto da porta, esperando que eu bata para atender.
- O-Oi, Sofi. Tudo bem?
- Tava com saudade. Você nunca mais veio aqui. Esqueceu, foi? Aposto que a Kaki tá com saudade também. Vem, entra - A garotinha me puxa pela mão para dentro, animada. Não tenho tempo de impedi-la quando ela vai indo em direção a escada, mas Sinu nos impede.
Paraliso bem ali, olhando fixamente para os olhos de esmeralda da mulher. Ela não parece brava. Mas seu semblante é sério. Sei que não tenho como escapar da conversa.
- Boa tarde, Lauren - Um sorriso formal aparece em seus lábios, e aquilo me deixa mais assustada por algum motivo. Talvez porque eu fico assustada com tudo - Sofi, deixe a Mama falar um pouco com a Lauren, sí? Vá lá com sua irmã, logo ela chega lá.
A pequena hesitou, mas logo obedeceu e saiu correndo para o andar de cima. E eu fiquei ali, ainda paralisada.
- Sente-se um minuto comigo, querida.
Querida. É bom sinal, não é? Preciso que seja. Nos sentamos no sofá da sala, e a mulher segura minhas mãos entre as suas. Seu olhar é preocupado. Me pergunto se meu olhar é apavorado demais.
- Sabe que eu gosto muito de você, não sabe, Lauren? Como não poderia, te conheço desde pequenininha. Eu confio em você, essa conversa não significa o contrário, lembre disso, ok? - Assinto, trêmula e hesitante - Bem, nós duas sabemos que a Camila está doente. E que a doença faz com que ela seja... menos resistente do que nós somos. Você está entendendo o que eu quero dizer? - Não consigo assentir de novo, porque não estou entendendo qual é o ponto. Ela respira fundo. Aquela conversa parece ser tão difícil para Tia Sinu quanto é para mim - O que quero dizer, minha filha, é que Camila não é como você. Ela não vai poder ficar se aventurando pela noite ou pelo dia, ou vivendo tudo que você pode viver porque ela está muito doente. É tão duro dizer isso, mas é necessário. Você me entende? Eu não sei bem o que vocês fizeram ontem mas e se ela desmaiasse de novo? O que você poderia fazer, Lauren?
Não digo nada por alguns minutos. Só observo os olhos cheios de água da mulher em minha frente e tento entender sua dor. É compreensível. Seu medo é compreensível, e não me é estranho. Eu também sinto aquele mesmo medo. Mas eu quase posso ouvir Camila falando de como se sente viva, e aquilo me dá forças para responder.
- Tia Sinu... eu entendo o seu medo. Eu entendo que o que nós fizemos foi perigoso demais e que qualquer coisa pode acontecer a qualquer hora, e ela tem que estar protegida. Mas a sua filha tem tanta vida por dentro! Ela é infinitamente finita, é o que eu sempre digo. E pará-la assim seria quase matá-la. Eu sei que parece estranho o que eu estou dizendo, mas por favor, pense nisso. Camila não está doente por dentro. Ela me mostrou que isso é possível. Só observe, e a senhora vai ver o quão viva ela está, apesar de tudo.
As lágrimas descem pelo rosto da mulher mais velha. Aquela situação é difícil e compreensível, e eu percebo de repente que não estou com medo. Ela é bem parecida comigo. Nós duas só queremos proteger a garota dos olhos castanhos de algo que já está nela. Nós duas só queremos que aquilo desapareça.

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La Vie
RomanceCamila e Lauren se reencontram em um hospital, depois de oito anos. As duas estão doentes, e o tempo está passando mais rápido do que deveria. Mas sempre há mais tempo. Tempo de consertar; tempo de amar. E essa é a vida.