Camila

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     Alejandro Cabello, eis aquele a quem o senhor nos recomendou. Minha mãe trabalhava como auxiliar de limpeza na grande casa dele e sua família.

      Antes falemos de minha mãe, Jenny Foster Wolfgang. Eis aí uma mulher forte e batalhadora, porém ao mesmo tempo sensível e triste. Mamãe desfaleceu precariamente após a morte de meu pai. Vi a vivacidade de seu rosto desvanecer aos poucos ao longo dos anos enquanto ela dividia seu tempo aos filhos e ao parco trabalho que ela podia fazer. Havia estudado até o segundo ano do ensino médio sem poder completá - lo em razão de - segundo me foi relatado por ela - ter de cuidar de sua mãe doente, perdeu o ano, e neste mesmo ano a mãe veio a falecer.
  
      Sem estudo completo, restou - lhe fazer os trabalhos que lhe eram oferecidos para poder se manter: foi auxiliar de limpeza em lojas e hospitais,trabalhou como merendeira em escolas, entregou folhetos nas ruas, porém, o serviço que lhe coube em praticamente toda a sua vida foi ser auxiliar de limpeza ou doméstica. Pelo menos, conheceu papai, o seu 'amor de salvação', que lhe deu uma boa família e uma vida feliz embora humilde. Mamãe era feliz, até perder o seu companheiro. Porém, ela precisava viver pelos filhos, e o fez com seu trabalho árduo, o pouco dinheiro que meu pai deixou e com sua ajuda, senhor Carter. Não faltou nada a mim e a meu irmão.

       Pois bem, voltemos agora ao senhor Cabello. Ele era rico, o senhor sabe disso tão bem quanto eu, porém, apesar de rico e elegante, Alejandro carregava um espírito humilde e solidário, gostava de minha mãe, do meu irmão, mas eu sempre soube que gostava acima de tudo de mim. Aos 19 anos questionei a ele porque tinha tanta preferência por mim ao invés de meu irmão. Ele sorriu, me olhou atentamente e disse:

      - Você tem os olhos de sua mãe e o gênio de seu pai. Eu conhecia seu pai, você sabia? - Neguei com a cabeça e ele continuou - Não importa bem como o conheci, mas saiba que sempre achei ele um bom homem. -Ele sorriu.

        - O senhor não respondeu minha pergunta. - Afirmei impaciente e ainda curiosa. Ele então colocou ambas as mãos em meus ombros e disse:

        - Há além de mim, uma pessoa em minha casa que te estima muito. Ambos de nós temos uma afeição muito grande por você (SeuNome), e por mais que quiséssemos explicar,
não poderíamos, porque sentimentos afetivos não se explicam só se sentem. - Sorriu mais uma vez em minha direção e me deixou sozinha.

      Fiquei me perguntando o resto da tarde quem era esta pessoa, porém a resposta não veio. Pensei em interrogar o senhor Cabello mas julguei não ser uma boa ideia. No fim da tarde retornei para casa ao lado de minha mãe carregando esta dúvida comigo, dúvida que só seria arrancada de meu coração quatro anos mais tarde. 
           
        Creio que me perdi entre as lembranças, uma vez que este capítulo deveria ser sobre Camila, pois bem, falemos dela.

         Camila era a filha mais velha de Alejandro, eu a vi pela primeira vez  logo assim que me mudei para Nova York. Minha mãe havia ido resolver questões sobre o seu novo emprego com Alejandro, e eu a acompanhei. Ele nos conduziu à sala de estar, onde nós três nos sentamos. Não demorou muito para que Sinuhe aparecesse acompanhada de Sofia, a caçula, e também Camila.

      Com toda a minha educação eu cumprimentei todas as três, mas senti o pejo tomar conta de mim quando tive de cumprimentar Camila. Ela era bonita. Me chamou atenção logo de cara, mas não se engane Albert, meu coração não palpitou mais rápido, minhas mãos não começaram a suar, eu não estava nervosa, apenas estava tímida e acanhada.

      Suportei a longa conversa apenas abrindo a boca para falar quando se dirigiam a mim, embora a mãe de Camila a empurrasse para falar comigo e minha mãe fazia o mesmo em relação a mim, me empurrava para iniciar uma conversa com ela.      Porém, nenhuma de nós parecia disposta a isso. Não sei dizer se ela estava tão acanhada quanto eu, mas sei que algo a impedia de dirigir a palavra a mim. Naquele dia, não trocamos uma palavra, saímos mudas. Contudo, no momento de partir ela sorriu para mim. Não respondi com um sorriso, apenas acenei com a cabeça e segui para casa com minha mãe.

        Ela me veio ao pensamento algumas vezes naquele mesmo dia, porém, eram imagens desconexas, lembranças borradas que não me pareciam valer a pena aos 19 anos. Hoje, aos 25, as lembranças me vêm tão vivas e coloridas à memória que sinto como se as tivesse vivido ainda ontem.

     Enfim, eram raras as vezes que eu via Camila. Nos esbarrávamos vez ou outra em sua casa, às vezes a via acompanhada do pai ou outras pessoas que julgava serem seus amigos pelas ruas, ainda a via na faculdade algumas vezes, mas até então, a única palavra que havíamos trocado era um 'oi' murcho porém inquieto.

      Entretanto, esta realidade iria mudar.

      Camila era estudante de medicina, enquanto eu, como já sabe fazia enfermagem. Vez ou outra acontecia de usarmos o mesmo laboratório, e no quarto ano da faculdade pegamos várias aulas juntas, e foi aí que começamos a nos conhecer melhor. E tudo isso se deu graças a uma pessoa que teve influência direta para que Camila e eu tornássemos amigas: Dinah Jane, estudante de enfermagem assim como eu .

       Dinah foi minha primeira amiga na faculdade embora eu tivesse tentado a todo custo não criar vínculo  com nenhum colega
.
       O senhor deve estar se perguntando como Dinah se tornou cúmplice da amizade entre Camila e eu. A resposta é um tanto simples e óbvia: Dinah e Camila tinham uma amizade de longa data. Foi através de Dinah que a amizade entre nós (Camila e eu) começou a nascer, germinou em cada coração, cresceu e se tornou analogamente dizendo, uma árvore dentro de cada uma, porém duas espécies diferentes de planta. A árvore que nasceu dentro de mim simbolizando nossa amizade era retorcida, de galhos secos quase sem folhas, e com uma relativa quantidade de espinhos. Isso deveria significar que eu não tinha uma amizade verdadeira com ela? Não, não era isso. Isso significava que eu tinha uma amizade enraizada porém que logo no início já machucava.

       É preciso entender como esta amizade me feria. Primeiro, quero dizer como era a árvore de Camila.

      A planta de nossa amizade que ela trazia dentro de si, assim como a minha germinou, cresceu, porém frondosa, viva, cheia de folhas. Esta árvore floresceu e deu frutos. Camila... Ela... Eu daria esta confissão agora, mas deixemos as coisas fluírem ao seu tempo.

      Passamos a ser boas amigas, passávamos bom tempo juntas, eu gostava da presença dela e ela da minha. Porém, me feria vê - la triste, às vezes ela parecia querer me dizer algo, parecia remoer algo dentro de si... Já nos conhecíamos a quatro anos, porém só percebi essa tristeza que ela carregava quando nos aproximamos. Várias foram as vezes que a interroguei sobre a melancolia que muitas vezes a vi carregar nos olhos, porém ela desconversava, dizia estar bem e forçava um sorriso. Outras vezes, quando eu ainda insistia para que me desse alguma explicação, ela me repelia de perto de si, me ignorava e passava dias sem falar comigo, sem me dar um oi ou me dirigir um sorriso, e então era eu quem ficava carrancuda e reclusa em meus pensamentos, mas ela, assim que notava minha mudança de humor, voltava, pedia desculpas, vinha até mim tão inocente e doce que eu sempre repetia o mesmo gesto quando isso acontecia: pegava - lhe nas mãos, punha - lhe uma mecha de cabelo atrás da orelha e lhe perguntava se estava melhor. Ela sorria e dizia que sim com a cabeça sem nunca me olhar. Eu lhe devolvia o sorriso, e ela vinha ainda mais doce me pedindo um abraço, pedido ao qual eu nunca recusava. Para mim era apenas mais um abraço de tantos que eu lhe dera, mas que para ela parecia ser eterno, seu abrigo. E foi ela mesma quem o disse na primeira vez em que me pediu um abraço com as seguintes palavras:" Abraços não são eternos, mas o seu será eterno para mim, porque será o meu abrigo." Eu apenas soltei um riso abafado. Por que eu não dei pela mudança? Que mudança? Logo irei dizer.

Lauren (Camren/You)Onde histórias criam vida. Descubra agora