Aliado

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Estava com a cabeça confusa e levemente enjoada. Era como comer muito doce pela manhã ainda em jejum.

Ouvi a porta do carro abrir. Uma luz forte fez meus olhos arderem.

- Pode-se levantar agora - Ouvi o agente Clark dizer. - Não há mais ninguém aqui.

Levantei minha cabeça e olhei ao redor. Realmente apenas um silêncio reconfortante enchia o lugar.

- Onde estamos? - perguntei não reconhecendo absolutamente nada.

- Estamos na propriedade da minha família, fica há poucos quilômetros de Greenpoint.

Saí do carro ainda atordoada, mas estava feliz por não ter que falar com todas aquelas pessoas.

A propriedade era grande, um pouco descuidada, com seus jardins cobertos por uma grama alta e flores secas. Uma pequena casa, cercada por uma varanda branca e um galpão velho com o portão enferrujado que se estendia logo ao nosso lado.

- Não é um lugar muito bonito. - disse com um sorriso amistoso. - Mas achei que seria melhor que ser engolida por todos aqueles repórteres.

- Claro! Eu só tenho a agradecer tudo que tem feito por mim - disse parando de reparar a propriedade e me concentrando em demonstrar gratidão.

- Não somos seus inimigos Amanda - disse com um tom muito parecido com o do agente Drake.

- Estava escutando o tempo todo, não estava? - perguntei o imaginando atrás de um vidro na sala de interrogatório.

- Estava sim - respondeu sem perder a serenidade.

- Isso é um jogo? - perguntei tentando entender as coisas. - Você é policial bom e ele é o mal.

- Não... Não! - disse com uma disconcertante gargalhada. - Isso só existe nas séries, no mundo real somos todos bons - E riu novamente como se eu tivesse contado a piado do século.

- Tenho que discordar, não acho que o Hanniexter é o policial bom! - disse erguendo uma das sobrancelhas.

- Hanni o que? - franziu o cenho como se eu tivesse falado em outro idioma.

- Uma mistura de Hannibal com Dexter - respondi como se isso já estivesse subentendido.

Ele gargalhou ainda mais, e quase perdeu o fôlego.

- Preciso te levar para casa - disse ainda sem ar. - Tem alguma entrada alternativa?

- Tem sim! - respondi me lembrando da entrada para empregados. - Vou ligar para as meninas, levarem meu disfarce.

Ele acentiu com a cabeça enquanto eu pegava o celular. Combinei com a Carol de encontrá-la em quinze minutos. Assim que desliguei saímos juntos no carro. Fui deitada no banco de trás. Estava me sentindo de certa forma mais leve.

Aquela pequena fuga me ajudou a desvencilhar um pouco de toda aquela turbulência avassaladora.

O agente Clark me escoltou até que me encontrasse com Carol. Coloquei a peruca ruiva e um casaco dela. Caminhei de cabeça baixa enquanto via de soslaio o agente Clark entrar de volta no carro.

Carol caminhou como se tentasse fugir e logo vi uma dezena de repórteres indo atrás dela. Passei despercebida e entrei no elevador sem ser vista. Ao chegar na porta do nosso apartamento, eu entrei ainda com o coração pulsando no peito, e tranquei a porta.

Ainda não sabia como lidaria com tudo aquilo. Sabia apenas que teria que falar com algum repórter uma hora ou outra, mas com certeza seria em outra.

Meu celular tinha uma centena de mensagens da agência. Provavelmente ansiosos por me usar para promover alguma campanha com a modelo que tinha ressurgido dos mortos. Com toda certeza não estavam preocupados com meu psicológico. Apenas queriam noticias da nova mina de ouro deles.

O apartamento estava silencioso, então tirei a peruca e me deitei no sofá. Tinha tantas coisas para fazer, tantas atitudes para tomar, mas naquele momento queria me concentrar em outro detalhe. Um que não podia ser deixado de lado.

O agente Drake descreveu as mortes com uma precisão assustadora. E isso me lembrava da Dra. Dunnan. Ela era a única que tinha ouvido da minha boca como eu gostaria de findar a minha vida. Ela sabia cada detalhe e não podia ser uma mera coincidência que além de parecidas comigo as vitimas tenham seguido cada palavra que foi anotada apenas por ela.

Algo me dizia que deveria ter compartilhado essas informações com a polícia, mas minha vasta experiência em CSI e Criminal Minds me diziam que antes que tivesse certeza sobre quem realmente podia confiar eu não deveria me abrir com ninguém.

Mas após aquela tarde, eu achava que tinha encontrado um aliado. Talvez o agente Clark merecesse um voto de confiança.

Alguém capaz de rir daquela maneira tinha que ser no mínimo confiável.

O Colecionador de BorboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora