A Proposta

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No final do beijo eu rocei meu rosto no dela e beijei cada centímetro de pele que ia da testa até sua boca.

Senti o gosto salgado das lágrimas dela e a abracei de novo. Tinha medo de abrir os olhos e está abraçado com meu livro e tudo aquilo não ter passado de um sonho.

- Eu não vou permitir que nada de mal aconteça a você - disse limpando uma de suas lágrimas.

- Eu queria poder ficar com você, mas nesse momento eu não posso - disse com os olhos vermelhos e húmidos.

- Ainda está magoada comigo? - perguntei sem querer entender o porque ela me queria longe.

- Você não percebe? - disse dando as costas para mim. - Todos pensam que estou envolvida nesse caso e ontem quando fui interrogada eles pareciam saber tudo da minha vida, mas você não está no radar deles e eu não quero, eu não posso permitir que a única coisa boa que eu tive em anos entre nesse inferno comigo.

Enquanto a ouvia falar, eu quis vira-la de frente para mim e dizer que eu não me importava, mas eu não era um homem livre. Se eu entrasse no radar do FBI logo descobririam tudo que tinha acontecido no Brasil e eu a perderia sem chance de um retorno.

- Eu queria que fosse diferente - disse mais para mim mesmo do que para ela.

- Eu também queria - e quando olhou de volta para mim estava com o rosto todo vermelho por tentar conter o choro.

A abracei novamente e a aninhei em meu peito, sentindo a dor de não poder me colocar como seu protetor. Eu seria tão inútil, quanto fui quando Lucy adoeceu.

- Temos que encontrar um jeito - disse erguendo seu queixo com a mão livre.

- Eu gostaria de poder ser outra pessoa - respondeu mordendo os lábios ainda mais vermelhos.

- Eu tambem gostaria - respondi em pensamento.

- Mas eu posso ser outra pessoa - e seus olhos vermelhos se iluminaram. - Eu tenho conseguido sair disfarçada e ainda ninguém me reconheceu.

- Um disfarce? - perguntei curioso.

- Sim... Sim... - respondeu intercalando o sim com beijos rápidos e sorridentes. - Você estaria disposto a ter uma namorada nova toda semana?

- Hum... - E a beijei de novo. - Se a essência dela for sempre a mesma, eu vou amar.

Toda tristeza que nos cercava evaporou com aquela proposta. Nós poderíamos ficar juntos sem riscos para ambos os lados.

Eu poderia estar com ela. Fazer parte da sua vida. Protegê-la. E logo não precisaria esconder nada.

- Eu preciso ir embora para que o seu plano dê certo - disse indo em direção a porta.

- Deixe seu endereço anotado aqui - disse me entregando uma pequena agenda.

Eu a peguei e anotei o endereço do apartamento do meu pai. Esperava não ter errado. A puxei pela cintura por uma última vez e ainda com a testa colada a dela, nós sorrimos juntos. Beijei seu rosto e em seguida selei sua boca com um beijo lento e apaixonado.

Eu nao queria ir embora, eu não queria deixá-la, mas não tinha opção. Aquele momento já podia ser considerado um milagre. Um momento roubado que nunca teria a chance de acontecer se não fosse uma sequencia cruel de momentos a que fomos acometidos.

Sorri, assim que ela fechou a porta e entrei no elevador dividido entre a paz de estarmos juntos e o medo do que tudo aquilo poderia envolver.

Eu não era mais um garoto, não era do tipo inconsequente, mas não tinha forças para me afastar.

Como eu poderia seguir em frente, livre, quando meu coração estava amarrado a ela?
Como eu poderia seguir minha vida sabendo de todo perigo que ela estava correndo?
Mas pensar na reação dela quando descobrisse a verdade, me deixava em pânico.

A garota que vomitou em mim, mas que me fez sentir vivo como nunca antes.
A garota que disse que me amava em baixo de uma cachoeira e que acreditava em mim, quando muitos apenas veriam interrogações.

Como não amá-la de volta?

Impossível de admitir, mas ainda mais impossível de não sentir.

Passei pelo saguão do prédio e saí pela porta da frente tentando ser o mais discreto possível.

Caminhei até o carro e me deparei com uma borboleta azul. Uma linda Phengaris Alcon estava no parabrisas.
A induzi a ir para minha mão direita e a levei para dentro do carro comigo.

Eis uma companhia em que estava acostumado. Ela ficou lá, pousada de frente para mim como se me acusasse de ser um mentiroso.

- Logo direi a ela amiguinha - disse ligando o carro. - Logo direi...

Pelo menos esperava que esse 'logo' não demorasse a chegar.

O Colecionador de BorboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora