Betrayal

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"Desapaixonar é difícil
Se apaixonar por traição é pior
Confiança partida e corações partidos, eu sei, eu sei
Pensando que tudo o que você precisa está lá
Construindo fé sobre o amor e palavras
Promessas vazias serão desgastadas, eu sei, eu sei"

(James Arthur - Impossible)

- Quer um café? – Anthony perguntou quando chegamos em casa. Ajudou-me a sentar no sofá e podia ver pela sua expressão que não estava satisfeito em ter que fazer o serviço que eu sempre fazia para ele.

Fiz que não com a cabeça e, depois de alguns minutos me encarando, suspirou e subiu as escadas para seu quarto, deixando-me sozinha. Talvez fosse o sentimento de culpa que estava fazendo com que Anthony agisse daquele jeito, afinal, se não fosse a sua ideia de bater-me justamente na reta final da gravidez eu não teria escorregado. A queda não teria feito o parto ser adiantado e nem teria colocado minha vida e a do bebê em risco. Se ele não tivesse dito que preferia que salvassem minha vida, talvez meu bebê estivesse aqui e não eu. Se Anthony não... A verdade é que se nada teria acontecido se eu não fosse abandonada por minha mãe na porta dele. Nada disso teria acontecido se ele não fosse meu pai.

Tudo se resumia a Anthony. Meus medos e inseguranças, minhas crises de ansiedade... Tudo. Jesse não teria feito aquilo diante de todos por eu ser esquisitona. Quem sabe ele até sentiria tudo aquilo de verdade, talvez eu tivesse uma vida boa, amigos para confiar e pessoas que tirassem o melhor de mim.

Mas sabia que era tarde demais para desejar não ser assim. Anthony já havia mudado tudo em mim, transformei-me em alguém igual a ele, alguém que ninguém ousaria amar. A verdade é que depois de tudo que aconteceu, olhando agora para minha barriga ainda inchada e não sentindo meu bebê ali, não estar com ele em meus braços como tanto sonhei, não queria mais sentir. Não queria que aquela dor, aquele buraco oco em meu peito aumentasse cada dia mais. Não queria lembrar de tudo que perdi e nem me arrepender por ser desse jeito.

De onde estava sentada podia ver meu reflexo na televisão, as grandes olheiras e o rosto inchado. Não tinha orgulho de ser a pessoa que Anthony tanto tentava me transformar, mas eu não podia fazer nada para evitar isso. Nem conseguiria, na verdade. Queria uma nova vida, mas ir atrás dela estava fora do meu alcance. Anthony nunca me deixaria em paz, não tinha outra alternativa exceto deixar que ele me transformasse por fim em alguém como ele. Não podia lutar contra isso, não tinha forças para tanto.

Me permiti chorar naquela noite, lamentar, sofrer o luto. Deixei que a dor tomasse conta, fiz com que a dor física também fosse sentida. O sangue se misturou com minhas lágrimas, lembrei do meu bebê sendo tirado de mim, sem respirar, minha menina nascendo morta. Pensei em como seria se ela estivesse aqui, nossa primeira noite juntas. Perguntei-me se choraria muito ou dormiria a noite inteira, se iria gostar de músicas de ninar e se iria me amar tanto como eu a amo.

Meus seios estavam inchados, tinha leite para dar a ela. Saber disso só fez com que a dor fosse maior. Eu queria tanto aquele bebê, desejei tanto ser boa o suficiente para ele, sonhei com nossos momentos juntos e tê-lo perdido, não ter sido forte o suficiente para ele era a prova de que eu realmente não era boa. Não o suficiente. Nunca seria.

Adormeci sem perceber e quando acordei o sol parecia tímido, mal aparecia por trás das nuvens. Fiquei algum tempo o observando antes de tomar um banho, debaixo d'água estava deixando tudo aquilo para trás, não me lembraria mais de todos os erros e de todas as vezes que tentei ser feliz. Esse sentimento não era para mim.

A água caia por meu rosto e lavava as lágrimas, o sentimento de perda. Minha menina era uma parte de mim ainda pura e esperançosa que eu deixaria ir embora e faria isso porque a dor era demais para ser suportada, porque se não fizesse isso iria sucumbir, desaparecer em total tormenta.

Good Enough - 1ª TemporadaWhere stories live. Discover now