Capítulo 18

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DYLAN


— Ainda não entendi o porquê de estarmos aqui, pegar um avião seria muito mais óbvio... — afirmei novamente, me desviando de uma senhorinha russa que andava rápida demais para alguém da sua idade.

Vestia uma roupa com a aparência pra lá de antiga. Cachecol em tons de bege encardido. Casaco grosso marrom escuro, luvas multicoloridas e uma touca na cabeça com fiapos que voavam pelos ares em decorrência de seus passos apressados.

Nas mãos, duas malas de rodinhas que por pouco suportavam todo o peso que carregavam. Consegui ver, mesmo com a rapidez da velhinha, que as costuras das suas bagagens queriam arrebentar.

Thomas me acompanhava. Depois de me entregar o envelope, manteve-se em silêncio, se negando a explicar a razão de tudo aquilo. A tal passagem de trem e o ingresso para o teatro em Moscou ainda me eram uma incógnita. Sem contar que eu iria sozinho. Nathan e ele ficariam alocados no apartamento no centro de São Petersburgo.

— Precisa aprender a dar mais valor para as coisas que não são do seu costume — irônico, retrucou me olhando com o canto dos olhos. — Sabia que a viagem de trem entre São Petersburgo e Moscou é uma das atrações turísticas mais tradicionais?

Reverberou mansamente.

Revirei os olhos.

— Foda-se — reclamei. — Isso aqui é uma zona. Que ideia de merda desses russos de fazerem todo um sistema de horário de partidas e chegadas baseadas no horário da capital — parei bruscamente de andar quando um pirralho loiro, quase albino, passou correndo na minha frente.

O pai – supus que fosse –, um russo gordo com uma barba acinzentada, gritou alguma porcaria, mas o garoto correu mais ainda. O moleque ainda teve a coragem de olhar para trás, sorrir de lado, e dar a língua para o cara. Mesmo sendo um capetinha, me identifiquei com o pequeno.

Bem feito, pensei na cabeça.

Crianças eram o mal encarnado. Pequenos demoniozinhos que tinham apenas uma função. Fazer você tomar no seu cú toda vez que abriam a boca. Todos os pentelhos que passaram pela minha vida serviram para comprovar minha tese.

Felizmente que não passavam de primos melequentos que não moravam comigo. Só quando alcançavam uma idade mínima onde se tornavam menos irritantes, mal educados, e influenciáveis o bastante para fazerem as coisas na surdina, que conseguia me aproximar direito. A exceção sempre foi a pequena Adrienne Wright, doce e delicada desde bem nova.

Cresceu, ou melhor, crescia, transformando-se num perfeito exemplar de pecado em forma de menina recatada – falsamente – que jogava seu charme a fim de conseguir o que queria. Seu pai era um dos poucos que tinham meu respeito, enquanto sua mãe esdrúxula e mentirosa não passava de uma serpente travestida de esposa perfeita.

Aliás, tinha convicção de que meu pai traía minha mãe com essa mulher.

Uma pena que Adri não tivesse completado seus dezoito anos ainda. Não que isso fosse um impedimento para a pequena capetinha. Tinha minhas suspeitas de que Christopher Levine, o professor de literatura detentor de um estoque infinito de narcóticos, responsável por desvirtuar jovens com suas drogas alucinógenas e seu pau com pós-doutorado, principalmente as singelas meninas castas e religiosas, com o seu par de óculos pretos, terno bem alinhado e pasta de couro na mão, seria o alvo da garota.

— Ainda irá me agradecer ao final disso tudo — caçoou, e erguendo o braço esquerdo, com o indicador em riste, apontou a direção que devíamos seguir.

— Isso é o que veremos — dobramos à esquerda na bifurcação, cruzando o portal dourado e o busto de ferro de alguém que supostamente fora importante, dando de cara com o corredor que com suas placas de LED e letreiros enormes nos direcionava para a plataforma indicada na passagem.

SEDUÇÃO FATAL [HIATO]Onde histórias criam vida. Descubra agora