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 Harry Van Vitsky

  Ao sair eu fico pensando e nem mesmo presto atenção no jornal, deixando o de lado. Eu sei o real motivo dela estar aqui, mas acho que ela não entenderia, no entanto eu a trouxe numa hora errada, do mesmo modo que sei que não é sua culpa, eu demorei muito para encontrá-la, não deixaria ela sair das minhas mãos como grãos de areia escorrega entre dedos. Quando sai fico pensando em como está bem, não se prendeu no quarto, nem mesmo chorou, comeu, agiu, e está super bem. Nem parece que a tirei da sua casa, que a trouxe para o outro lado do país. Olho por mais um tempo o jornal e depois o deixo de lado depois de ver que tudo o que planejei não foi pego pelos jornalistas, ações muito bem pensadas. Vou a caminho da janela à procura da menina e o que vejo me desagrada a tal ponto de fazer meus dedos fecharem em punhos.
  — Annastácia! — Pude ver que se virou para mim, me olha como se não fizesse nada de errado e é ai que está! — Venha cá — ela falou algo para o garoto que me olhou e começou a andar para longe dos portões, a mesma se abaixou para pegar o livro que estava na grama e olhei os seguranças, mas nenhum mantinha contato, vendo que não tinha nenhum short por baixo daquele vestido. Logo ela caminha a meu caminho e dou espaço para que ela passasse e a mesma parou me olhando — o que eu te disse sobre falar com alguém? Não quero você falando com esses garotos.
   — Mas e...
   — Não me interrompa! — a mesma se sobre salta — olhe para mim Annastácia — não move se quer um dedo — olhe para mim! — seguro seu braço e a levo comigo para o andar de cima.
   — Harry, está me machucando — sua voz soa chorosa.
   — Se não estivesse me desobedecido não estaria — a parei de frente a porta que eu temia por mim mesmo e não a abria a mais de um ano. Respirei fundo, eu disse que deveria afastar esse Harry para longe de mim, deveria ser diferente com ela, mas acho que não vai dar certo, não sei lidar com uma pessoa que não obedece, aprendi que isso é um grande portal para acordos, obediência e ela não colaborou. Em fúria ainda desconto toda a minha raiva em um soco à parede bem ao lado do seu rosto e tenho a visão de uma lágrima descer do seu olho esquerdo. Isso me machuca tanto quanto meus dedos estão machucados agora, a primeira lágrima desde que chegou aqui, a nem uma semana, e eu já a fiz chorar.

  Me afasto a vendo abaixar seu olhar, fecho minhas mãos em punhos para ter que controlar a raiva, então suspiro e conto até dez, nesse pequeno período ela observa a porta.
  — O que tem lá? — sua voz sai firme, mas baixa.
  — O meu maior pesadelo — olha para mim e engulo em seco.
  — Me mostra — incrédulo olho em seus olhos, dou passos para trás como se estivesse apontando uma arma para mim.
  — Como? — continua me olhando e então suspira.
   — Se teme tanto o que está ali atrás, por que não jogou fora? — olho para os seus pés, sinto uma queimação pelo meu corpo, então seguro o molho de chaves. Não digo uma só palavra, vou até ela, me dá espaço para colocar a chave na fechadura e quando abro deixo-a entrar sozinha. Fico na porta de costas, isso foi o que evitei por um ano depois da morte de Emma, isso trouxe tanto dor a ela, esse quarto, só prova o que minha mãe me diz sempre, sou um doente, viciado. Tentar não me culpar é a fase difícil da terapia, pois, só de ela estar aqui é como se todo o meu arrependimento se transforme em desejo, e abrir esse quarto é uma desgraça.
Então eu me viro para ele, a vendo observar todas as paredes, todos as barras, todas as roupas e a cama, com cordas penduradas no teto, correntes nos dorsais, e uma luz inspirada no inferno que é tudo isso. Nem percebi quando ela olhou para mim, um olhar horrorizado, a abraçar seu corpo querendo se proteger da obscenidade que é.
   — Irá me bater? — dizer que não é mentira, pois, a primeira coisa que pensei sobre seu ato de desobediência, foi puni-la como meu pai fazia.
   — Iria — engulo em seco apertando minhas unhas na carne da mão — mas não vou. — Caminha em minha direção, me olha ainda abraçando seus braços, franze suas sobrancelhas e passa por mim. A observo ir até sumir virando o corredor, e então eu olho para o meu pesadelo, algumas cenas passam na minha mente conforme observo o quarto e entro ainda mais nele, Emma em um lado, pendurada pelas cordas, do outro presa na parede, no outro chorando perto das algemas, nua, chicoteada, sangrando, com dor, tudo para me agradar, agradar a um doente. Dou meia volta e tranco a porta caminhando para seu quarto.

Um Último Gemido - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora