Dia 16 de agosto de 2016.
Fiquei o dia todo em casa querendo fazer algo que não seja lavar a louça e arrumar a casa toda por ordens da minha mãe. E ainda também ter que lavar o banheiro. Eu odiava lavar o banheiro. Era pior que a louça. Bianca pensava ao contrario, para ela lavar a louça era pior. Ela dizia que odiava quando a comida molhada tocava em suas mãos. Eu dava risadas quando ouvia isto, mas pelo menos a companhia dela era melhor do que o colégio e todas aquelas pessoas que com certeza iriam dar risadas constantes de mim por tudo o que tinha ocorrido. Eu pensava em Romeu dando gargalhas quando aconteceu. Pensava nele me batendo e me jogando no chão mais de uma vez. Eu sentia raiva dele. Minha raiva era grande, mas também havia aquele sentimento maldito que não ia embora. Como poderia gostar de alguém que não gosta de mim? Eu ainda pensava no que iria fazer em relação a isso.
Minha festa de aniversário já estava se aproximando. Faltavam uma semana e meia, mas eu sentia que Romeu Iria aparecer com sua turma e tentaria acabar com tudo como ele sempre faz.
Depois que acabei de arrumar a casa toda, — e minhas mãos estão eternamente cansadas — minha mãe chegou em casa pela tarde. Colocou sua bolsa verde sobre o sofá e se sentou, bufando de cansaço. Eu me sentei ao lado dela a olhando, ela retribuiu o olhar e mexeu nos cabelos.
— Falei com seu diretor e a mãe desse tal Romeu.
Engoli em seco.
— E aí?
— Ele disse que você está na lista da nova professora de Educação Física. Sexta feira você e ele retornam.
— Sexta? — murmurei. — Porque sexta? Não seria melhor se voltássemos logo na segunda? Ir pra escola em apenas um dia na semana?
— Você vai voltar sim, senhor! Depois de tudo que passamos e eu quase agarrei aquela mulher horrível pelos cabelos. — ela estava nervosa, poderia derrubar um búfalo. — Mas tudo vai ficar bem. — ela pausou a conversa por alguns segundos. — Já vez o almoço?
— Sim, senhora! — não a olhei.
— Ótimo. Eu vou comer algo e deitar um pouco. Mas antes vou tomar um banho. Não me acorde até as oito, ok? Bianca disse que iria vir aqui para assistir um filme com você. Espero que não faça bagunças.
Ela se levantou e pegou a bolsa do sofá. Foi em direção as escadas lentamente.
— Sim, mãe. — murmurei.
Dia 17 de agosto de 2016.
Na quarta-feira, quando minha mãe voltou do trabalho, acabei de fazer a janta e a companhia tocou umas três ou quatro vezes. Fui abrir a porta e vi a senhora Pires, a organizadora do festival. Olhara-me com um sorriso largo e espontâneo. Seus grandes cabelos brancos estavam presos. Usava uma calça jeans larga e uma camisa preta apertada. Tênis baixos azuis e uma bolsa laranja grande no ombro. Ela perguntou se poderia entrar, assenti com um sorriso e chamei minha mãe. Sentou-se com a Senhora Pires e ela cumprimentou Bianca, que estava sentada a sala também, na poltrona vermelha de minha mãe. As duas conversavam ao sofá sobre receitas. Oferecia-lhe os pratos de doces e salgados que havia em seu livro de receitas. Minha mãe poderia escolher dois ou até três daqueles para fazer para o festival. Minha mãe trocava sorrisos com ela e se decidia no que iria fazer.
Bianca continuava a mexer ao celular e me contara o que estava acontecendo na escola nesses dois dias que eu fiquei fora. Bianca me dizia que o colégio estava melhor desde que Romeu não apareceu, ontem e hoje. Mas amanhã, as coisas poderiam ficar piores.
— O que achou da travessa crocante de chocolate? — perguntou à senhora Pires.
— Parece gostosa, mas também muito gordurosa. — minha mãe dava risadas baixas. — E o que acha desse pudim de doce de leite?
— É gostoso, mas a maioria dos vizinhos traz pudim. Deveria trazer algo diferente, senhora Pereira.
Minha mãe a olhou.
— Senhorita! — a corrigiu. — Estou cuidando do meu divórcio.
Eu olhei para minha mãe.
— Ah, sim. Me desculpe, eu não sabia.
Minha mãe sorriu forçada.
— Bem, vamos às receitas? Eu queria saber sobre os salgados.
— Oh, sim. Têm ótimos aqui.
Minha mãe folheou algumas das páginas que a senhora Pires disse.
— Eu gostei desse. — ela mostrava um prato que parecia ser bom. Um macarrão cremoso gratinado. — O que acha?
— Parece delicioso. Eu nunca tinha provado esse.
As duas aprovaram o prato.
— Acho que vou fazer. — confirmou minha mãe.
— Que ótimo, — a mulher sorriu. — Os outros vizinhos também vão adorar.
Minha mãe pensou em algo. Olhou para mim depois de alguns segundos e devolveu seus olhares para a senhora Pires.
— Senhora, quantos vizinhos irão vir?
— São os da nossa rua e a da rua de trás.
Romeu morava na rua de trás.
— E os pais daquele jovem... Romeu. Os pais dele iram vir também?
A senhora Pires ficou calada por alguns segundos.
— Acho que sim. Ela nunca perdeu um festival.
— E o filho dela? Vem também?
— Eu queria que não, mas infelizmente...
Ela me olhou novamente. Eu engoli em seco e voltei a conversar com Bianca, escapando meus olhares dos dela.
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Romeu e Júlio
RomanceJulio é um jovem de 17 anos que depois de uma discussão com seus pais se mudou de São Paulo para o Rio de Janeiro. Nunca foi fácil fazer amizades, ainda mais se sentindo sozinho e com o medo das outras pessoas saberem sobre seu verdadeiro eu. Na nov...