– Eu já disse que nessa receita não tem tomates! – Sasuke escutou o resmungo alheio quando fechou a porta da geladeira e voltou para o balcão com dois tomates na mão. Ainda assim, ele posicionou os frutos na tábua de vidro e segurou a faca pelo cabo para cortá-los precisamente, em pequenos cubos, a lâmina afiada o ajudando a realizar a tarefa rapidamente.
– Toda receita pode ter tomates, Sakura. Não faz diferença. – Argumentou simplório, prosseguindo com o que estava fazendo, concentrado em manter um padrão para o tamanho dos cubos dos tomates.
– Se não faz diferença, é só não colocar, então! – Rebateu num tom firme e irritado, os braços se cruzando frente ao seu corpo, enquanto ela se posicionava frente a Sasuke, do outro lado da mesa, e o encarava com as sobrancelhas franzidas e os dentes trincados. Não precisava ter muito tempo de convivência com Sakura para perceber que os delicados cabelos rosas, os serenos olhos verdes e a estatura pequena de seu corpo falavam muito pouco sobre sua personalidade. A mulher era decidida e incisiva, principalmente quando contrariada. E talvez fosse esses um dos motivos para a amizade com Sasuke ter se perpetuado tanto, desde quando ambos eram ainda adolescentes: ao contrário de tantos, ela não se intimidava com gênio forte do Uchiha.
Sasuke interrompeu seus movimentos, ouvindo o som característico da lâmina se chocar contra o vidro temperado da tábua. Sem mover suas mãos, o moreno apenas ergueu o rosto, desviando o olhar dos tomates para fixá-lo na figura mal humorada de Sakura, na qual os olhos negros se estreitaram da mesma forma. Os segundos que se passaram naquela troca de olhares pareciam o momento preliminar de uma luta entre dois predadores, onde nenhum dos dois parecia querer ceder e perder aquela batalha.
O contato visual só foi interrompido segundos depois, quando o próprio Sasuke abaixou novamente o rosto e voltou a cortar os frutos com habilidade, terminando o segundo tomate e finalmente passando a cortar as cebolas, com o mesmo cuidado e rapidez que antes. Ouviu Sakura bufar, mas não se importou. Havia acordado às oito da manhã de um domingo com uma ligação da rosada, pois, conforme a própria, ela tinha encontrado uma receita incrível na internet, que eles precisavam reproduzir. Encerrada a conversa por telefone, não custou nem uma hora para a outra chegar em seu apartamento, já com todos os ingredientes em mãos, para que ele não pudesse inventar alguma desculpa. E lá estava ele, ajudando-a a preparar uma massa italiana com camarões, depois de perder sua manhã de descanso para ouvir todas as atualizações que a mulher fazia questão de compartilhar consigo. Então, diante de todo o contexto, ele iria sim colocar seus tomates onde quer que fosse.
– Ok... – Sakura começou arrastada, a visível contragosto. Voltou para a pia e retomou o que estava fazendo antes de Sasuke começar a estragar sua receita, recomeçando a limpar os camarões para o preparo. – Eu prometo não implicar com os tomates, desde que você me responda algumas coisas. – Continuou, e Sasuke percebeu no mesmo instante o tom de voz mudando e tomando um timbre mais doce e pacífico, o que o fez erguer as sobrancelhas, em desconfiança.
– Hm? – Vocalizou desinteressado, e Sakura aproveitou que não estava no campo de visão do outro para sorrir livremente.
– Como estão as coisas no trabalho? Sabe, as aulas... Está se adaptando bem? – A rosada iniciou suas perguntas, compenetrada em fazer com que sua voz soasse preocupada, e prosseguiu num tom de cumplicidade. – Mesmo que muitos não pensem assim, eu sei que ser professor é complicado, eu mesma sofri muito quando comecei a dar aulas no departamento de Letras, às vezes é difícil conseguir–
– Sakura. – Sasuke interrompeu, e continuou assim que sua voz se sobressaiu a da outra. – Vá direto ao ponto. – Pediu enquanto abandonava a faca por alguns segundos, apenas para levar sua mão limpa até o rosto, arrumando com os dedos algumas mechas do cabelo negro que caíam por sua face, guiando-as para trás da orelha.
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Diké
RomanceEntre os gregos antigos, recorriam ao culto da deusa Diké aqueles que clamavam pela Justiça, sabendo que a divindade impiedosa não pouparia os corações nefastos e traiçoeiros. A musa tornou-se então o símbolo mor daqueles que em seu ofício lutam pel...