Eu fui feita pra você

Capítulo 71

Passado a surpresa inicial, Alison estava bastante entusiasmada com a viagem, tinha começado a fazer mil e um planos e já queria arrumar as malas."Para onde vamos?" Ela perguntou pela milésima vez, eu estava sentada no sofá com Max deitado em meu colo, assistindo ao seu desenho preferido."Já disse que é surpresa" Repeti tal como as outras vezes que ela tinha perguntado, a verdade é que eu não fazia a mínima ideia para onde iriamos. Afinal de onde mesmo eu tinha tirado aquela ideia? Eu definitivamente tinha que parar de falar algumas coisas por impulso."Eu preciso saber se vamos a um lugar quente ou frio, se será rural ou urbano, se é praia ou montanha..." Certamente aquilo nunca teria fim, então optei por interromper sua divagação."Leve um pouco de tudo, assim vai estar preparada" Falei sem desviar o olhar da televisão e fazendo carinho nos cabelos de Max."Emily" A voz de Alison soou brava, olhei para ela sem entender aquela variação de humor "Eu não acredito que você me convida para viajar e não tem a mínima ideia de onde vai me levar" Eu tive vontade de ri, mas Alison parecia realmente ofendida, de modo que se eu fosse ri, aquilo acabaria em uma briga."Claro que não, Alison. Eu sei exatamente onde vamos, apenas quero fazer uma surpresa" menti descaradamente, até mesmo eu tinha me convencido disso."Então anda, diz logo, frio ou calor?" Sua voz era enérgica."Calor" Alison estava tão irritada que resolvi responder, pois realmente eu sentia que ela podia me bater e, por experiencia própria, suas mãos eram pequenas, mas pesadas, eu não queria receber um novo tapa dela."Rural ou urbano?""Rural""Praia ou montanha?""Montanha""Ótimo!" Ela disse eufórica, veio até mim e me deu um selinho, em seguida saiu falando que farias as malas."Ótimo!" Repeti sua exclamação assim que ela saiu da sala. Parabéns Emily Fields, agora você não precisa mais apenas escolher um lugar, agora esse lugar tem que ser quente, rural e montanhoso, realmente você facilitou muito sua vida agora.O subconsciente é realmente atroz, eu sabia exatamente um lugar similar ao que eu descrevi para irmos passar o fim de semana, eu só não sabia se teria coragem de voltar lá.Max adormeceu no sofá assistindo ao desenho, ele já estava de pijama e pronto para ir para a cama, o peguei no colo e ele como sempre não acordou, Max as vezes era difícil de dormir, mas quando dormia, era difícil de ser acordado. O depositei na cama e o deixei de modo confortável e quente, quando cheguei ao quarto de Alison a cama estava repleta de roupas espalhadas juntamente de uma mala aberta."Eu planejei que essa era uma boa hora de dormir" Ironizei, Alison ignorou-me."Estou arrumando nossas malas, separando o que vamos precisar, você deveria me agradecer"Ela estava tão empolgada por algo tão simples, nossas vidas realmente estavam uma bagunça, a dela então, mais ainda ... eu simplesmente não podia pensar em como sua vida estava conturbada por agora, ela era muito forte em está lidando com tudo. Sua família era tão afastada dela, seu ex-marido tinha virado um louco, seu filho quase morreu, seus melhores amigos moram em outro país, tudo estava tão fora de lugar para Alison e, ainda assim, ela conseguia sorrir dia após dia, eu admirava a força dela, tinha orgulho dela ser quem é."Hei, Emily?" Alison me chamou, senti minha cabeça latejar, por um tempo eu tinha deixado minha mente flutuar fora de meu corpo e só quando ela me chamou eu tinha voltado a mim "Por que estava aí parada me olhando com essa cara de idiota?" Não respondi sua perguntar, apenas sorri para ela.Andei e em poucos passos cheguei junto dela, tirei de sua mão a blusa que ela dobrava meticulosamente e a joguei de forma descuidada dentro da mala."Você tá louca? O que pensa que estava fazendo?" Ela tentou protestar em vão. A agarrei pela cintura, ela soltou um leve riso, ela sempre ria quando eu a pegava assim, desprevenida."Aprenda a ter prioridades, amanhã você arruma a mala, hoje arrumamos outra coisa" Em um giro deixei Alison de costas para cama e em uma brusca empurrada a joguei na cama, fazendo ela cair por cima daquela confusão de roupas."Não seja louca, vamos amassar tudo" Outro protesto em vão, apenas sorri para ela e me ajoelhei na cama, de forma que o corpo dela ficou preso entre minhas pernas."Prioridades, Alison ... prioridades" Me inclinei e a beijei. Ela não tentou me empurrar ou rejeitar meus carinhos, ao contrário, se tornou solicita a todos eles, em poucos minutos nossa roupa que até então estavam em nossos corpos, se misturaram com as roupas que estavam sobre a cama.

Alison insistiu muito para que eu não fosse para o trabalho e reclamou o dobro por eu ter amassado todas as roupas que estavam sobre a cama na noite anterior. Eu a ignorei em ambas situações e fui para a ONG, até mesmo porque eu precisava sair do apartamento para organizar tudo para a viagem.

Enfim eu tinha me rendido ao local aonde a anos eu fugia de voltar, eu não sabia o que sentiria voltando lá, entretanto com Alison e Max talvez amenizaria meus sentimentos em retornar ali, quiçá aquele lugar que tanto fui feliz e agora tinha medo de voltar e sentir-me triste, em verdade, eu voltaria e seria tão feliz quanto.

Assim que cheguei na ONG a primeira coisa que fiz foi ligar para minha mãe e dizer que iriamos Alison, Max e eu, passar o fim de semana fora de São Paulo, quando lhe disse para onde iriamos, ela ficou surpresa e em seguida feliz por mim, enfim eu estava sendo forte o suficiente e fecharia de vez aquela página em minha vida.

Depois de falar com minha mãe, liguei para aquela velha casa, e como sempre, ninguém ali atendia, algumas coisas realmente não mudam, e era isso que eu tanto tinha medo voltar e ver que nada tinha mudado, tive de insisti inúmeras vezes até atenderem.

"Alo" Uma voz envelhecida e calejada atendeu.

"Oi" Foi tudo que precisei falar, a pessoa ao outro lado logo reconheceu que era eu.

"Emily, como você está sumida. Meu Deus. Eu me preocupei tanto com você, minha filha, não tem uma noite que não durmo e rezo por ti, você não pode sumir assim" eu realmente tinha ficado um tempo sem ligar para ela, desde que fui para a Inglaterra, não tinha ligado mais.

"Desculpe, vó, é que muitas coisas aconteceram" Minha vó era uma pessoa tão adorável, ela é realmente aquele tipo de vovozinha fofa e delicada, que está sempre tentando cuidar de todos e rezando para tudo.

"Tudo bem minha filha, eu entendo, adultos na cidade grande nunca tem tempo de nada"

"Vó, o que você vai fazer esse fim de semana?"

"O de sempre minha filha, ficar em casa cuidando de tudo"

"Eu pensei em ir aí esse fim de semana"

Um silêncio se fez presente, desde a morte do meu pai eu não voltava a fazenda, lá era um lugar que eu ia apenas com meu pai, desde a infância ia para lá com ele, era nosso momento pai e filha. Não importava o quanto tudo estava confuso na relação dele com minha mãe, ou o quanto eu tinha visto ele fazendo coisas erradas na favela aonde morávamos, a fazenda era o lugar aonde tudo era esquecido, lá eramos apenas pai e filha, nada mais. Depois que ele morreu, eu não tive mais coragem de voltar lá, já se passavam quase dez anos de sua morte, porém eu não sabia como lidar com os sentimentos de saudades voltando ali.

"Você pode repetir, filha?" Minha vó pediu ingenuamente, meu peito se preencheu de saudades dela, a última vez que eu tinha a visto foi no enterro de meu pai, minha vó hoje beira os oitenta anos, na época os setenta, já era velha demais para longas viagens, com isso nossa relação de avó e neta se mantinha apenas pelas ligações semanas ou quinzenais que eu lhe fazia.

"Eu pensei em ir aí, não vou incomodar né?"

"Incomodar? Eu estou feliz demais com isso, a anos espero sua visita à minha casa, da última vez que te vi você era ainda uma menina, agora já é uma mulher, eu pensei que morreria e não te veria novamente" Eu podia ouvir minha vó chorando ao outro lado, aquilo formou um nó em minha garganta.

"Desculpa" Pedi humildemente.

"Não se preocupe, eu te entendo, mas agora eu estou feliz que você vai vir"

Avisei minha vó que eu iria com uma amiga e seu filho, eu não sabia como explicar a presença dos seguranças, então os coloquei como nossos namorados, seria simples e justificável eles irem conosco e ela não ficaria preocupada comigo.