Capítulo 36:

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Daven

— Porque você nunca realmente me falou sobre Valley? - pergunto para Ness, depois de ter passado a noite inteira pensando sobre a conversa que tive com Valley ontem no jardim.

— Não achei que fosse importante. Mas ouvindo seu tom de voz agora presumo que eu deveria ter feito?

Esfrego meu rosto, e encaro o amanhecer. Eu não consegui pregar meu olho hoje, e isso tem se tornado um hábito difícil de quebrar ultimamente. Então eu deixei as meninas descansando no quarto e sai para varanda. Eu não lembro do tempo que estive aqui fora, mas é possível que tenha sido bastante. Eu consegui ver os pássaros se perderem na escuridão.

— Ela lembra de você como um amigo, e isso é um sinal de que vocês conversaram bastante. Só pensei que esse fato poderia aparecer em uma de nossas conversas. Você sempre foi aberto comigo.

— O que está havendo Daven? Qual é a razão pra você estar tão chateado com isso?

— Eu não estou chateado.

— Imagina. - discorda ele, e eu posso sentir um sorriso irônico se formando em seu rosto mesmo ele estando há quilômetros de distância. — A questão é que eu conheço Valley desde que meus pais se hospedavam aí. Eu praticamente cresci com ela. Mas nós nunca realmente falávamos tanto um com outro. Mudou um pouco na adolescência, e alguns meses atrás quando fiz uma viagem para Lewiston. Nunca passou pela minha cabeça comentar isso com você porque eu não via motivos para isso.

— Você tem razão, me desculpe.

— Será que ela falou alguma coisa ruim de mim para você estar assim?

— Eu estou apaixonado, cara. - declaro, ignorando sua pergunta, e ignorando as consequências dessa revelação.

A linha parece muda por um longo segundo, e depois há um barulho de gritos e comemorações.
— O que está acontecendo? É quatro de julho e eu não sei? - pergunto fazendo referencia ao dia da independência do nosso país. Porque eles parecem felizes do outro lado como se o feriado fosse amanhã. 

— Poxa cara você foi rápido. - diz Ness voltando para linha. — Mas nós estamos torcendo por você. O pessoal do escritório está mandando você casar com essa moça agora.

Não posso deixar de rir com a ideia.
— Você e essa sua boca que não consegue guardar nada.

— Como isto aconteceu? - quer saber ele. E eu paro um momento, olho para o sol nascendo e relembro como foi que me apaixonei por Valley.

— Essa não é uma conversa para se ter pelo telefone.

— Wow isso é um convite para ir até Lewiston? Porque eu posso largar tudo aqui e estar aí com você amanhã.

— Você será bem vindo, você sabe disso.

— Aliás. Eu estou em dívida com você. Esqueci de lhe enviar saudações de aniversário. Mas nunca é tarde não é? Parabéns irmão. Sucesso pra você.

— Obrigado. – sorrio mais uma vez, e troco de assunto: — Como é que está tudo por aí?

Há um silêncio, depois barulho de pés se movendo. E eu já sei que Ness provavelmente está indo para um lugar onde ninguém pode ouvi-lo. Eu o agradeço mentalmente por isso.

— Olha eu não queria falar isso por telefone, mas Duck me chamou ontem pra informar que os pais de Alda estão entrando com um novo processo contra você.

Meu coração para de bater.
— Merda! E o que é que eles querem agora?

Há um suspiro do outro lado.
— A custódia das meninas.

Meu corpo queima.
Eu perco o foco.
— Não. Porra. Isso não. Eu não vou deixar. - grito, e começo a andar de um lado para o outro. Eles não podem fazer isso. — Eu não posso perdê-las, Ness.

— Ei, fique calmo ok? o Duck já está recorrendo isso. Você não vai perder suas filhas. Eu prometo.

Minhas pernas balançam enquanto piso firme pelo chão. Meu mundo se quebrando a cada passo que dou.
— Eu ferrei tudo, Ness. Mas minhas filhas não podem pagar pelo que eu fiz.

— Pare de dizer que você fez alguma coisa. Deus que me perdoe, mas foi Alda quem provocou tudo isso. E nós vamos provar isso nem que seja a última coisa que nós faremos em vida.

Deus queira que ele esteja certo. Porque neste momento... Eu não posso confiar em mais nada.
— Eu... Eu preciso desligar agora. Isso é demais para mim.

Não espero ele responder, e encerro a chamada. Leva tudo de mim para não arremessar o celular nas montanhas. Mas eu não faço. Eu volto para o quarto, e desabo na cama ao lado de Abby. Eu não posso perdê-las.
Eles não podem me tirar a vida.

                      ~*~*~*~

— Está tudo bem? - pergunta Valley soprando suas palavras em meu ouvido. — Você parece... aéreo.

Agito minha cabeça concordando, e olho para longe dela. Minhas filhas estão caminhando entorno da mesa do café da manhã na medida em que escolhem o que vão comer hoje.
Valley aproveitou que me viu sentado sozinho, e rapidamente se aproximou. Se eu não tivesse ligado para Ness antes, e ter ouvido tudo que ele me disse... Eu até poderia sorrir e puxar Valley para mim.
Mas não me sinto animado o suficiente para isso. Minhas filhas sentiram a mudança do meu humor quando levantaram e me encheram de perguntas e eu só respondia como se eu só soubesse duas palavras: sim e não.
Se eu pudesse eu apagaria esse dia.

Sua mão pousa em meu ombro, e ela insiste: — Você me contaria se alguma coisa ruim estivesse acontecendo sim?

Balanço minha cabeça concordando, mas estou mentindo. Porque há muitas coisas ruins acontecendo, e eu não posso dizer para ela.

— É sobre a gente? - sua mão treme em cima do meu ombro. — Quer dizer. Não é sobre alguma coisa que eu fiz sem ter percebido?

Porra.
Ela está achando que estou assim por causa dela.
— Você não fez nada de errado, Valley. E está tudo bem entre nós. Tudo.

Seus olhos semicerram em desconfiança, e ela me encara de um jeito que faz meus olhos piscarem rápido. É como se ela tivesse tentando descobrir o que eu não estou falando. O que eu estou escondendo de todos.
— Ok. - suspira ela, tirando a mão do meu ombro. — Eu não sei se é o momento para isso, mas eu tenho algo para contar pra você.

Levanto uma sobrancelha.
— O que é?

Ela pressiona os lábios, e aperta os dedos.
— Parker está vindo, e... - suas palavras param quando ela vê uma expressão feia se formar em meu rosto.

— Eu não quero saber sobre ele. - respondo, e minhas palavras acabam saindo de um jeito duro, e seco.

Ela inspira fundo.
— Mas isso tem haver com nós.

— Em que sentindo? - retruco começando a sentir-me irritado. Mas não é por ela. Não é pelo que ela está querendo me dizer. É por tudo. Pela vida. Pela Alda. E pelos seus pais que querem me afastar das minhas filhas.

Ela pisca, e olha pra baixo.
— Eu... Eu não deveria ter contado isso. Você não está em um bom momento. Sinto muito.

Ela começa a se afastar, mas antes que esteja totalmente longe da minha mesa, eu pego o braço dela quando levanto. Meu corpo rapidamente liga na tomada quando meus dedos encontram sua pele brilhosa.
— Desculpe. - peço, e acaricio sua pele.

Ela olha para os lados no intuito de ver se alguém está olhando para gente.
— Está tudo bem. Eu preciso voltar para cozinha.

— O que você estava falando antes? Parker está vindo e...?

Ela agita a cabeça fazendo seus cabelos voarem por cima dos ombros.
— Deixa pra lá... Não era nada importante.

Ela vai embora, e eu desabo em minha cadeira.
Porra.
Eu não deveria ter descontado nela.

— Papai olha o que eu escolhi. - diz Abby voltando com dois pratos em suas mãos. Mais atrás está Alisson e ela está carregando quase todo bolo que estava na mesa. Mesmo irritado para o dia eu acabo sorrindo para elas. Não posso perdê-las.

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