Capítulo 60:

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Daven

— Isso não é justo papai. - reclama Abby pela décima vez desde que nós levantamos pela manhã, e eu avisei que as levaria de volta para escola.

— Nossas férias já acabou Abby. - lembra Alisson.

Não consigo pegar nenhum tipo de ressentimento ou tristeza em sua voz. Dois dias atrás quando chegamos ela não falou nada sobre, e depois que foi dormir também não. Esta é a primeira vez que ela fala alguma coisa que me faz lembrar o porquê que voltamos para casa muito rápido.

Essa noite foi difícil novamente, eu custei para dormir. Tudo que aconteceu ficou matutando em minha cabeça. Eu queria entender como foi que ela não acreditou em mim. Ela disse várias vezes que estava apaixonada. Agora eu fico com dúvidas se realmente ela estava.
Como ela teve coragem?

— Eu quero ter mais tempo com você papai. - choraminga Abby, e eu sei que esta é uma arma que ela utiliza apenas para fazer minha consciência pesar.
Mas já está feito.
Nós estamos de volta, e elas precisam encontrar o caminho para sua rotina. Os dias de passeios acabaram. A vida voltou ao normal.

— Você terá quando estiver em casa de volta.

Ela cruza os braços, e logo uma carranca se forma em seu rosto.
— Eu não quero ir pra escola.

— Você vai ser burra. - comenta Alisson.

— É você que vai. - retruca Abby olhando-a com raiva.

— Ei meninas! - intervenho usando um tom de voz bravo o suficiente para fazê-las se calarem. —Cooperem por favor.

Alisson encolhe seus ombros, e volta a colocar seus materiais dentro da sua mochila. Abby baixa a cabeça e permanece emburrada no canto do quarto.
Eu vou até ela, e me agacho na sua frente.
— Ei. - chamo levantando seu rosto com minha mão. Meu coração parte em dois quando vejo fúria e tristeza dançar em seus olhos. É quando eu sei que essa sua birra é muito mais do que simplesmente "não querer ir para escola."

Puxo seu corpo, e a envolvo com meus braços. Todo meu mundo incha com sua aproximação. Eu amo o cheiro da sua pele quando ela desperta pela manhã. Amo quando sinto seus bracinhos envolta do meu pescoço. Amo quando ela é teimosa comigo porque não consegue expressar o que está lhe incomodando em palavras.
Ela é apenas uma criança. E eu sei que às vezes é muito difícil para eles.

— Escute uma coisa. - digo em seu ouvido. — O papai precisa resolver um monte de problemas, e você é muito pequena para estar entorno deles. Mas eu prometo que levo você para escritório outro dia, pode ser?

Sua cabeça assente balançando em meu ombro. E eu a aperto mais com meus braços.
— Você está tão cheia de novidades para contar para seus colegas, e professora. A escola vai ser muito divertida hoje.

Ela não responde, mas continua enterrada em meu peito. Pelas batidas calmas do seu coração eu sei que a grande tempestade não está mais presente.
— E eu prometo que vou pegar você e sua irmã mais cedo. Ok?

Ela inclina a cabeça para trás, e pisca com seus olhos esverdeados.
— Eu queria que você pudesse ficar lá comigo. - murmura, apoiando suas mãos em meus ombros.

Sorrio.
— Eu fiz isso quando você entrou pela primeira vez. Mas agora você já está adaptada naquela escola. Não é? O que eu posso fazer é levá-la até a porta, e me despedir com muitos beijos e abraços apertados.

Seus lábios tremem, e eu sei que um sorriso medonho está querendo sair. Pego seu rosto entre minhas mãos e planto um beijo demorado em sua testa.

— Agora vamos nos aprontar antes que cheguemos atrasados na escola.

                    ~*~*~*~

— Ok, o que é que você tem para mim? - pergunto para Duck quando atendo sua chamada.

Descanso minhas costas contra a cadeira, e batuco na mesa com uma caneta. Faz apenas vinte minutos que eu cheguei no escritório, e apesar da saudade que estou sentindo das minhas filhas, eu estou forçando minha mente a se distrair com o todo o trabalho acumulado que tenho.

— Preciso encontrar com você o mais breve. - diz ele, e eu não consigo pegar qualquer emoção em sua voz.

Meu peito aperta.
— Notícias ruins?

Um chiado surge do outro lado.
— Quando podemos nos encontrar?

Merda.
Isso não parece bom.
Não gosto quando mudam de assunto.
Olho para a agenda onde Ness marca nossas reuniões, e verifico se eu terei algum tempo disponível nas próximas horas.
Folheio as páginas.
— Olha se você conseguir chegar aqui em quinze minutos, podemos falar. Caso contrário, só vou poder encaixá-lo no horário do meu intervalo amanhã.

Duck tosse antes de responde.
— Amanhã serve para mim, meio dia?

Droga.
Eu queria que ele pudesse vir hoje. Não sei se vou aguentar esperar até amanhã. Mas nem tudo eu posso decidir, não é?
— Meio dia. - digo, e confirmo: — Vou estar esperando você.

— Perfeito. Até mais.

— Até. - minha voz não sai com muita emoção.
Desligo a chamada.
Porra.
Estou com medo. Não sei o que ele tem para me dizer. Tudo está em suas mãos agora.
Meu futuro.
E a vida das minhas filhas.

Aproveito que estou com meu celular, e faço uma chamada para Ness. Talvez ele saiba de alguma coisa. Talvez ele possa me adiantar.

— Aqui é Ness quem fala... deixe seu recado após o sinal.

Droga.
Jogo o celular em cima da mesa, e empurro minha cadeira para trás. Dou a volta na mesa, e saio do escritório. Eu tenho sorte que meu amigo trabalha comigo. Assim se ele não atende o telefone, eu posso encontrá-lo em sua sala.

Atravesso o pequeno corredor, e chego na sua porta. Bato, e aguardo. De repente uma lembrança vem para minha cabeça. Eu lembro das tantas vezes em que eu batia na porta de Valley no meio da noite.
Porra.
Apesar de tudo, eu sinto falta.

Assim que a porta não abre, eu bato de novo. Será que Ness não venho hoje? Eu não tive tempo de vê-lo depois que cheguei no prédio. Tive um tempo demorado com as meninas na escola, me atrasei no meu primeiro dia de volta ao trabalho. Mas foi por uma boa causa. Minhas filhas precisavam de apoio para voltar à suas rotinas.

Dou outra batida na porta, e quando não tenho resposta, eu volto para minha sala. Desabo em minha cadeira, e pego meu celular outra novamente. Mas dessa vez eu não ligo para Ness, eu ligo para escola. Preciso checar se está tudo bem com Abby e Alisson.

Depois que descubro que minhas meninas estão se divertindo como se não tivessem perdido muito tempo de aula, eu fico olhando para tela do meu celular e começo a lembrar de Valley. Se eu não tivesse esquecido esse aparelho no seu quarto, eu acho que nós provavelmente ainda estaríamos juntos.

Não sei porquê mas sinto vontade de saber como ela está, saber o que ela está fazendo agora. Queria tanto ter coragem pra ligar pra ela. Mas sei que não posso. Sei que ela não vai me atender de qualquer forma. Solto meu celular em cima da mesa, e enterro meu rosto entre minhas mãos. 

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