Capítulo 49:

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Valley

— Ei. - sussurro quando encontro Daven parado na varanda olhando para o escuro. Eu só me dei conta de que ele saiu da cama quando estiquei meu braço para o lado e não senti ele lá.

Paro do seu lado, e pouso minhas mãos no cercado. Do mesmo jeito que ele está. Meus olhos passeiam pelo seu corpo, e eu fico me perguntando o que é que está acontecendo.

Ele esteve tão tenso mais cedo, e não relaxou quando chegou em meu quarto. Eu percebi na hora que seu humor tinha mudado. Então eu não fiz nada. Apenas deitei em seus braços, e permaneci calada.

Ele não disse nada também. Ficou quieto o tempo inteiro. Por mais que minha língua estivesse coçando para perguntar se ele não queria desabafar, eu me segurei. Eu não poderia forçá-lo.
Nunca pensei que na única noite que teríamos para passá-la inteirinha juntos. Ele estaria assim. Distante de mim.

— Deveríamos estar aproveitando que Ness está com as meninas. - digo, e espero por alguma resposta, ou comentário. Mas ele não diz nada.

Faço uma careta mesmo que só o céu a veja. E levanto minha mão para tocar em seu braço. Ele tá rígido.
— Daven?

Ele não responde, e eu insisto segurando-o firme com minha mão.
— Ei, fale comigo. - minha voz quase não consegue sair de tanto que meu coração está batendo rápido.

— O que você quer Valley?

Suas palavras me fazem afastar minha mão do seu braço. Por um momento eu fico sem reação. Ele nunca falou comigo assim antes. Mas não posso desistir agora. Preciso saber o que foi que aconteceu para ele estar tão irritado.
— O que há com você hoje?

Ele balança a cabeça, e continua olhando para o céu.
— Nada.

— Não parece ser nada para mim, por favor, me diga o que está acontecendo.

— Porra. Não. - ele grita batendo as mãos contra a madeira, meu corpo salta. — Você não entendeu ainda que eu não quero falar?

Ele vira para mim, e meu corpo encolhe sobre seu olhar irritado.
Oh.
Engulo em seco.
— Ok.

Dou uma última olha nele, e assim que percebo que ele não vai se desculpar por gritar comigo, ou me pedir pra ficar. Eu volto para meu quarto. No meio do caminho eu sinto um forte aperto no peito, e meus olhos rapidamente se enchem de lágrimas.
Enxugo-as antes de chegar em minha cama. Puxo meus cobertores e me afundo no colchão.

Não sei porquê mas eu ainda espio a varanda, mas acabo não vendo o que eu gostaria de ver. Daven não está vindo atrás de mim.
Meu coração dói, e lágrimas voltam a escorrer. Mas dessa vez eu não me importo. Fecho meus olhos, e me forço a dormir mesmo sabendo que isso será difícil.

                   ~*~*~*~

O sol bate contra minha sacada, e eu lentamente abro meus olhos. Diabos. Meu quarto já está todo iluminado. Minha cabeça dói quando levanto da cama. Eu vou para meu banheiro, e pego um comprimido. Faço uma careta quando vejo que algumas cápsulas estão fora do lugar. Não lembro de ter trocado-as. Será que minha mãe andou precisando de algum dos meus remédios?

Não sei.
Eu não dou muita bola para isso. Eu só pego o que preciso e volto para cama. É cedo. E eu não estou sentindo vontade de fazer nada hoje. Dou uma espiada na varanda, e vejo que Daven não está mais lá. Eu nem vi a hora que ele saiu do meu quarto. Não consigo evitar dar um sorriso triste. Eu só queria ajudá-lo ontem. Mas acho que cruzei a linha.

Talvez eu não mereça saber o que está acontecendo com ele. Talvez ele não goste o suficiente de mim, para me contar mais sobre sua vida.
Sei lá.
Eu não sei o que pensar.

Desabo em minha cama, e olho para meu teto. Meu coração continua pulsando alto. Acho que ele não sossegou desde ontem. Fecho meus olhos e tento descansar mais um pouco, mas não consigo por muito tempo. Logo já estou acordada de novo.

Dessa vez eu levanto, e decido encarar o novo dia. Separo uma muda de roupa. E vou para o banho. Deixo a água cair sobre meu corpo por um longo tempo. Apenas sentindo as gotas me aquecerem e assistindo o vapor escurecer os vidros do box. Pego uma esponja e começo a esfregar minha pele lentamente.

Depois enxáguo meu corpo, e assisto às espumas escorrem para o ralo. Lavo meus cabelos, meu rosto, todo meu corpo. Desligo o chuveiro, e puxo minha toalha do gancho. Enrolo-a sobre meu corpo, e saio para o outro cômodo. Fico de frente para pia, e aproveito para ver meu reflexo no espelho.

Logo agradeço por não ter ficado com os olhos inchados depois de ter chorado pela madrugada. Isso vai me ajudar a evitar perguntas desnecessárias. Sorrio para mim mesma, e separo meus produtos de cuidado com o a pele e corpo. Faço tudo que preciso e saio do banheiro.

Vou até minha porta apenas para me certificar de que ela está fechada. E assim que percebo que estou segura para me vestir sem pressa. Eu puxo as cortinas na varanda, e deixo minha toalha cair para meus pés. Vou até minha cama, e visto cada peça de roupa que separei. Apesar de estar chovendo lá fora, não está tão frio. Pelo menos não aqui dentro eu acredito.

Por isso vesti uma jardineira de tecido leve, e fresco. Ele é todo amarelo, e chama muita atenção. Olympia costumava me chamar de sol toda vez que me via com ele. Bem. Acho que hoje isso pode se repetir. Sorrio embora não me sinta tão animada para isso. Pego a toalha do chão, e sacudo-a antes de pendurar em minha arara.

Agito minha cabeça para fazer meus cabelos se desenrolarem, e desembaraço com meus dedos. Eu apliquei um creme no banheiro, e agora vou deixá-lo agir com meus fios livres. Gosto quando eles ficam soltos até minhas costas.
Ok.
Agora já era de encarar a realidade.

Saio do quarto, e encontro um casal de senhores passando pelo corredor.
— Olá bom dia. - aceno para eles.

Ambos sorriem para mim, mas o senhor é quem fala: — Bom dia, senhorita.

Deixo eles passarem, e depois vou para as escadas. Desço cada degrau como se eu quisesse levar muito tempo para fazê-lo. Mas acaba que em dois segundos eu já estou no saguão. Meu estômago contorce com a ideia de ver Daven no café da manhã.
Não sei se ele vai falar comigo. Também não sei se eu devo ir falar com ele. Ontem foi tão estranho e desconfortante. Não quero que isso acontecesse de novo. Eu gosto dele tanto. Acho que eu deveria fingir que nada entre nós aconteceu.

— Veja só... - diz uma voz que eu sei muito bem de que é. — Não tem sol lá fora mas tem sol aqui dentro.

Viro para trás, e vejo Olympia empurrando seu carrinho de limpeza.
— Oi. - aceno para ela.

Ela se aproxima trazendo sua bagagem de metal junto. E eu apoio minhas mãos em seus ombros, e lhe dou um beijo em cada bochecha.

— Você está cheirosa. - diz ela sorrindo genuinamente. — É amêndoas?

Agito minha cabeça concordando.
— Como estava em casa? - pergunto.
Olympia esteve de folga por alguns dias.

— Uma bagunça... - revela ela, bufando. — Eu já disse que não posso ficar muito tempo longe. Meus cachorros deixaram minha cozinha imunda.

— Oh. Só imagino a loucura que foi.

Oly tem seis cachorros. Todos são machos, e retirados da rua. Quatro deles são terríveis. Os outros dois são mais mansinhos. Ela os ama apesar de tudo.
— Trabalhei mais do que trabalho aqui limpando os quartos.

Sorrio, e ela faz o mesmo.
De repente meus olhos voam para escada, e eu vejo Ness com as meninas penduradas em seus braços. Meus olhos automaticamente semicerram quando eu não vejo Daven com eles.
O que será que aconteceu?

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