Capítulo 61:

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Valley

Antes mesmo que eu consiga detê-la, a porta do quarto se abre e minha mãe acaba me vendo. De repente me sinto como se eu tivesse sido pega no flagra. Mas sei que não estou fazendo nada de errado.

— O que você faz aqui? - pergunta ela, entrando no quarto e fechando a porta logo atrás.

Eu me sento na cama, e balanço o papel que está em minhas mãos já faz algumas horas. É um desenho. E eu não consegui tirar meus olhos dele desde que o vi. 

— O que é isso? - indaga ela vindo para perto, e mantendo seus olhos no papel.

Expiro fundo, e enxugo meus olhos antes de mostrar para ela.
— Acho que foi Abby quem o fez. - digo, olhando para o desenho que ela fez de nós.
Como é que eu nunca soube disso? 

— Oh. - murmura minha mãe tão afetada quanto eu estou. Como não poderia, não é? Abby desenhou o que parece ser uma família. E eu estou nela. Isso é tão grande.

— Talvez tenha sido Allison quem escreveu nossos nomes. - observo o traçado mais firme. Não pode ter sido Abby. Embora seu desenho seja mais perfeito dos que eu propriamente faço.
Sorrio.

— Ela é muito boa. - comenta minha mãe. Seus olhos atentos nos detalhes. — Ela fez até a marquinha que você tem no canto do olho direito.

Meu coração contorce.
— É verdade. - sorrio ainda mais apaixonada.
Será que eles se esqueceram do desenho? Bem. Se ele está aqui provavelmente sim. Não quero pensar que Daven tenha o deixado porque ele não quer nada que o lembre de mim. Do que nós tivemos aqui.

— Onde você o achou?

Aponto para o chão embaixo da bancada.
— Estava caído dobrado ali no canto.

Minha mãe acompanha meu olhar, e assente. Ficamos em silêncio por um tempo, mas ela acaba trazendo sua voz novamente.
— Porque é que você está aqui afinal?

Parece que eu estou me torturando não é? Mas não. Eu só vim até esse quarto para matar um pouco da saudade. Não sei. Eu pensei que o cheiro dele estaria pelo ar. Pensei que se eu abrisse a porta talvez tudo aconteceu tivesse sido um pesadelo, e eu os encontraria aqui. Mas às vezes a realidade é uma merda.
Principalmente esta.

— Eu só estava passando pelo corredor, e a vontade de entrar aqui acabou sendo mais forte para resistir. - confesso, e olho para o desenho.

Eu fiquei me perguntando, durante todo tempo que estive aqui dentro, onde é que eles estão agora, e o que estão fazendo. Nesse desenho estamos todos felizes, sorrindo e de mãos dadas. Queria tanto que isso fosse verdade. Queria tanto que pudéssemos voltar atrás.

— Valley... - murmura minha mãe, e eu me encolho com seu tom de advertência.

Na última noite nós conversamos bastante sobre minha situação com Daven. E mesmo ela me pedindo para que eu deixe de pensar nele. É difícil, sabe? É como se tudo em minha volta me fizesse lembrar dele. Mas tem sido o dobro agora que eu sei que estou carregando uma parte dele dentro de mim. E o pior de tudo é que ele nem sabe disso.

— Eu sei. - me apresso em dizer. Eu não quero que ela comece com o sermão novamente. — Só preciso de um pouco mais de tempo.

Ela balança a cabeça negando, e puxa meu rosto com suas mãos. É impossível que eu não olhe para ela agora.
— Escute, eu sinto muito pelo que eu disse ontem certo? Você não tem que se calar quando quiser falar sobre ele. Você não tem que se policiar quando estiver pensando nele. Eu quero mudar tudo que eu disse. Eu quero que você junte toda a coragem possível e ligue. Procure. Insiste. Mas nunca, nem por um segundo, desiste. Certo?

Oh.
Meus olhos se enchem de lágrimas, e de repente eu começo a sentir minha garganta apertada. Assim como meu coração está desde que eu descobri que Daven foi embora.

— Mãe... - choramingo, e me jogo em seus braços. Era tudo que eu precisava ouvir. Eu sempre soube que podia contar com ela. Ontem nós só tivemos um pequeno impasse. Aquela velha coisa de momento, sabe? No fundo todos nós sabemos que o que tem que ser feito é para ser feito.
Não importa o que.

— Não vou desistir. Nunca. - sussurro em seu ouvido. Ela me aperta com seus braços.

— É bom ouvir isso. Mas agora trate de se recuperar, ok? Você tem um bebê crescendo aí dentro. E precisa descansar antes de procurar o pai dele.

Meu coração incha ao mesmo tempo que eu estremeço.
— Eu não sei como Daven vai levar essa notícia. Não quero que ele me odeie.

— Ele não vai odiar você. Eu sei que não.

Enxugo meus olhos, e me inclino para trás.
— Não há como saber. - ergo meus ombros. — Ele saiu daqui muito chateado.

Minha mãe leva suas mãos para meu rosto, e me ajuda a limpar o molhado.
— Ei, não chore. - pede ela, me olhando com carinho e atenção. — Vamos apenas dar à ele um tempo, certo?

— Mas... - seguro minha barriga, e sinto uma vibração diferente. Uma mistura de medo, e incerteza.

Ela olha para baixo, e depois para mim.
— Eu sei... - diz ela, parecendo entender minha preocupação. — Sua barriga vai começar a crescer muito rápido. E você quer falar para ele antes que seja tarde não é? Mas você tem tempo Valley. Só relaxe um pouco.

Eu respiro fundo, e aceito. Talvez ela esteja certa. Talvez eu só precise me recuperar um pouco. Levanto da cama, e ela me acompanha.
Seus olhos caem para minhas mãos.
— Você vai levá-lo?

Olho para o desenho e assinto. Agora que eu sei da existência dele, não vou conseguir deixá-lo.
— Vou guardá-lo comigo. - aviso, e meus olhos piscam esperançosos. Sei lá.
Ninguém sabe o que o futuro reserva para nós, não é?

Minha mãe me acompanha pelo corredor, mas eu sigo na direção do meu quarto. E ela vai para as escadas.
— Quer que eu traga algum lanche para você? - pergunta ela, e eu só reviro meus olhos.

— Eu não estou doente mãe, eu sou capaz de descer e preparar alguma coisa para mim. Mas de qualquer forma, obrigada. Eu só quero descansar agora.

Ela assente, e se vira para os degraus. Eu espero ela sumir entre as paredes amarelas, e depois viro para continuar indo para meu quarto. De repente eu começo a me lembrar dos momentos em que compartilhei esse ambiente com Daven.

Caramba.
Encontrei com ele tantas vezes por aqui. Nas primeiras vezes nós nem imaginávamos o que aconteceria com a gente. Sorrio quando a imagem do seu peito nu saindo do elevador aparece na minha frente.
Céus.
Eu sinto tanta saudade.
Será que ele realmente é um homem mal?

Alguma coisa lá no fundo me diz que não. E eu quero muito acreditar nisso. Mas eu não sei o que pensar. Às vezes quero fechar meus olhos, e fingir que não sei nada sobre sua história. Fingir que não acusei sem saber a real verdade. E correr para seus braços em Austin.
Mas ele precisa de tempo. Ele tem muito agora. Tudo ainda está fresco. E eu preciso de muita calma antes de virar seu mundo do avesso.
Mais uma vez.

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