1 - Sasha

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Não posso apresentar-me a ninguém com o meu verdadeiro nome porque não sei qual é, mas, por aqui sou chamada de Sasha. A minha idade? Vinte sete anos, pelos cálculos dos médicos que acompanharam o meu caso. Querem saber mais? Bom começarei do princípio, pelo menos do que me recordo, pois sofro de oblivio, amnésia, esquecimento...o que lhe queiram chamar.

Acordei um dia num hospital, fazia uma semana que estava em coma e quando abri os olhos a minha mente estava em branco. Como fui ali parar? Alguém deixou-me num estado lastimável perto das urgências, dois médicos que saiam do seu turno viram-me no chão e prestaram socorro. Eu tinha muitas lesões então fui induzida em coma para me tratar e acordei assim, sem qualquer memória. Tudo isto passou-se a sete anos, eu tinha vinte anos apenas e ninguém me procurou, amigos, família, ninguém mesmo. O hospital era frequentando por muitas freiras voluntárias e visto o meu histórico, elas quiseram tomar a responsabilidade e a amabilidade de acolher-me. Eu tinha um quarto simples, pequeno e em troca da minha estadia com tudo incluído eu ajudava no que podia. Os meus dias eram rotineiros, uma boa corrida pela manhã que segundo os médicos eu tinha um corpo de atleta, então achei por bem manter a forma.  Depois eu tomava um duche, ajudava a fazer o almoço, eu era dotada em muitas coisas e cozinhar era uma delas, depois ia com outras freiras distribuir comida aos sem abrigos... enfim nada de interessante, não quero ser mal-educada, mas eu ansiava pelo vento da mudança, mas eu estava grata pela caridade de todas aquelas mulheres.

Todas as pessoas diziam que gostariam de estar no meu lugar, de começar do zero, para mim era agonia, tristeza, dor, raiva...todos os sentimentos misturados. Com o tempo eu vim a descobrir algumas coisas sobre mim e em vez de ficar feliz eu estava preocupada, eu falava cinco línguas, descobri isso porque o convento recebia visitas guiadas, fazia parte de um antigo castelo, como seria de esperar  circulavam estrangeiros nas redondezas. Em segundo lugar eu sabia um pouco de medicina, uma das freiras teve um ataque cardíaco e eu nem tive tempo de pensar, quando vi já fazia assistência respiratória, esse foi um dos episódios claro. Fazer comida também, eu era craque em informática e treino físico, de alguma forma eu era viciada em trabalhar o corpo. Por vezes tinha insónia, então ia para o jardim e fazia exercícios físicos até não aguentar mais e tudo isso me leva a questionar, que mulher eu era antes e o que mais descobrirei?

Passou sete anos desde que aqui cheguei, agora é hora de procurar respostas. Olho para a freira Olívia que corre na minha direção...

- Sasha, tenho boas notícias, querida! - Ela senta-se ao meu lado com as bochechas rosadas e respira fundo algumas vezes até ter fôlego para falar de novo.

- Diga Olívia.

- Lembraste da família que te falei? Aquela onde a minha irmã trabalha como cozinheira? - Claro que me lembrava, fazia meses que ela me falava deles.

- Sim os...Powell?

- Exato, eles precisam de uma empregada e eu pedi a minha irmã para falar de ti e sabes que mais? Eles querem conhecer-te, estão com alguma pressa porque a casa é grande e não podem ficar sem empregada.

- Isso é ótimo, vou poder ganhar dinheiro e procurar a minha família. - Sem dinheiro eu não podia fazer nada e está oportunidade iria mudar isso.

- Espero que consigas encontrá-los querida, mas vais fazer-nos falta. - Ela pousa a sua mão na minha e como sempre eu me afasto, contacto físico em forma de afeto é algo que causa mal-estar.

- Eu não vou embora e muito menos esquecer o que fizeram por mim.

- Eu sei querida, tu tens um coração de ouro, vou preparar-me para o jantar e tu lembra-te que amanhã bem cedo um táxi vem buscar-te para a entrevista, então nada de pernoitar a treinar.

Olho-lhe de lado, Olívia nunca me disse saber das minhas escapadas noturnas, a senhora baixa e gordinha afasta-se e eu vou para a cozinha ajudar a servir o jantar. Após terminar a refeição e ajudar a arrumar tudo vou para o quarto e leio um pouco, preciso de estar em forma para amanhã. Seis horas e eu já estou de banho tomado, o sol já nasceu, estamos quase no verão e o calor já aperta mesmo tão cedo. Digo adeus a Olívia após tomarmos o pequeno-almoço juntas e agora vejo o táxi aproximar-se...

- Boa sorte querida.

- Obrigado Olívia.

Sentada no banco de traz do carro constato o trânsito caótico e agitação das ruas de Orlando, de alguma forma eu não gostava da confusão, deixava-me nervosa e irritada. Olho de longe para a carta de condução no tabliê do carro, leio as informações e analiso-o de perfil, eu tinha esse defeito, avaliava tudo ao pormenor, por vezes mesmo até ficar com dor de cabeça. Aproximámo-nos da zona nobre da cidade onde grandes casas são rodeadas com muros altos e vedações que dão privacidade aos moradores, todos extremamente ricos claro. O táxi para em frente a um enorme portão, a viagem havia sido paga por Olívia, então o homem retira a minha minúscula mala com os poucos bens pessoais que possuo e vai embora. Toco na campainha e digo o meu nome e o motivo de estar ali, o portão é aberto, o caminho é longo até a casa e na porta uma senhora vestida com farda de empregada acena sorridente...

- Bom dia! Sasha, sou Betty, irmã de Olívia.

- Muito prazer.

- Vamos, o Sr Tommy espera por ti no escritório.

Ela pousa a minha mala perto da porta e conduz-me ao local onde o dono da imensa mansão espera por mim, o seu estilo luxuoso não me impressionava, aliás, nada me deixara
de boca aberta até agora e eu não sei explicar o porquê. Betty bate na porta e anuncia a minha chegada, uma voz grossa pede para entrarmos...

- Obrigado Betty pode ir, quero fazer algumas perguntas a Senhorita Sasha.

Oblívio - A EscolhidaOnde histórias criam vida. Descubra agora