Questão de tempo

Capítulo trinta e três

- Blake, Ethan.

Harvey combinou de todos nós nos encontrarmos às sete em frente ao restaurante. Eva viria direto da faculdade e Aubrey e Grace já avisaram que estavam chegando de Uber. Alguns amigos de Harvey já estavam na entrada também esperando por ele e pelas meninas, já que só podíamos entrar todos juntos. Eva chega e em seguida, Harvey.
- Não podemos entrar? - Eva resmunga para Harvey.
- Precisamos entrar todos juntos, rabugenta. Nossa  mesa é conjunta e tudo precisa começar ao mesmo tempo. - Eva estica sua jaqueta na calçada e se senta, segurando a barra da sua saia rodada azul.
- Estou exausta.- ela murmura. Um Ford Fiesta para logo em frente às pernas longas e finas da minha irmã e vejo que Aubrey conseguiu um vestido que " servisse nas suas tetas de vaca" como diz ela. Aubrey era muito bonita, com uma beleza que chamava a atenção principalmente por não ser comum. Ela tinha traços bem marcados no rosto e nada delicados, e todo o conjunto a deixava muito bonita. Vejo Grace ainda no carro, ao que parece,  acertando o valor com o motorista então me adianto até elas e seguro a porta no lugar de Aubrey que sai e vai até Harvey para abraçá-lo. Não queria que o acontecido de ontem mudasse nada no que eu e Grace estávamos construindo de volta. Se era pra esquecer ontem, por mim tudo bem. Eu simplesmente não quero ter que me acostumar de novo a viver sem a presença dela. Espero ela descer e quando  ela o faz, me sinto um garotinho de dezessete anos no baile do colégio, quando Alysson aceitou ser meu par e  fui buscá-la pensando  que fosse um sonho aquela menina tão linda ter aceitado sair comigo. É assim que eu me senti quando ela desceu do carro, não estamos saindo, nem sequer ela se vestiu para um baile, mas Grace... não precisa de muito. E é por isso que estou tão ferrado. Seu cabelo preto está caindo em ondas de apenas um lado do ombro, seu vestido preto é rente ao corpo até a altura do joelhos, ficando rodado depois. Parece que ele desenhou suas curvas, e apesar dela usar saltos enormes e continuar menor do que eu, me sinto minúsculo perto da mulher que Grace é.
- Você não tá nada mal, Ethan. - sua boca vermelha assopra e eu sorrio em resposta. Ótimo. Estamos agindo como se nada tivesse acontecido ontem.
- Você também não está de se jogar fora.
Esperamos mais dois amigos de Harvey chegarem e finalmente entramos. Incialmente se parece um restaurante comum, com recepção e paredes neutras com quadros decorativos. Assim que ele dá nossos nomes, uma mulher com roupa social nós encaminha pelo corredor com uma prancheta. Ela confirma às dez pessoas na lista, nos faz perguntas sobre termos alergia a  algum alimento, pede que deixemos os sapatos do lado de fora e entramos numa sala escura com iluminação fraca, onde há uma enorme mesa de mármore branca, com cerca de cinco cadeiras de cada lado. O restaurante se dividia em antessalas que imagino terem em cada uma um número diferente de mesas e cadeiras para cada grupo. Grace se senta à minha frente, Aubrey e Eva ao meu lado, uma de frente pra outra. Harvey se junta com seus outros amigos no restante das cadeiras e assim que estamos todos alinhados, nos entregam vendas e nos pedem para colocar.  A voz de uma mulher nos avisa que serão servidos três pratos e sobremesa, e que seremos guiados até os talheres quando o prato enfim chegar. Tudo o que se passava na minha cabeça era: Harvey gastou quanto dinheiro reservando esse lugar? Ele perdeu o juízo? Assim que os pratos vão chegando, somos instruídos para onde pegar o talher na mesa e provamos um por um. Confesso que era algo diferente e não necessariamente tão esquisito quanto achei que fosse. Os pratos eram deliciosos e apesar de não estarmos vendo nada, conversávamos uns com os outros enquanto aguardávamos os outros pratos chegarem.
- Grace? - a mesa cessa o burburinho quando Harvey a chama.
- Sim?
- Apesar de você não estar vendo, meu amigo Miles à minha frente está querendo saber se você está disponível. - escuto risadas pela mesa e a risada de Grace à minha frente me faz pensar se realmente está acontecendo: ela pode mesmo sair disso aqui com alguém? A ideia me causava náuseas.
- Miles? Posso ao menos ter ideia de quem você seja?- ela pergunta.
- Passei por você assim que você saiu do corredor. Estou de camisa cinza e provavelmente tenho o corpo mais sexy que você já viu. - todos voltam a rir. Me lembro vagamente de ter esbarrado por alguém com essa descrição no corredor, mas tenho quase certeza de quem é.
- Ah, Miles, não sei não...você conhece aquele ditado, cão que late não morde? - escuto risadas e silvos depois que ela fala diretamente para Miles.
- Terei o maior prazer de mostrar a você que não só não estou exagerando, como também posso morder se quiser. Eu só preciso saber se posso investir nisso depois que sairmos daqui.- meu estômago revira.
- Ela tá solteira sim! - Aubrey grita.
- Porque ninguém dá em cima de mim no meio de um jantar esquisito heim? - Eva resmunga.
- Eu já dei em cima de você querida, mas você parece não gostar de flashback.- Harvey declara e as risadas continuam.
- Miles, agradeço o bom gosto mas vou deixar passar. - as risadas e o burburinho continuam e cessam assim que o último prato chega. Escuto a movimentação na mesa, provavelmente de troca de talheres, já que agora seria a sobremesa. A voz feminina e familiar anuncia que podemos começar a comer, para facilitar a situação, eles posicionam os talheres sempre no mesmo lugar para podermos pegar  sem dificuldade. Assim que ergo a mão para pegar meu talher, sinto a mão de Grace esbarrar na minha, e ficar imóvel. Ela tinha colocado a sua mão provavelmente à frente do seu prato e eu não precisava ver pra ter certeza que a mão pequena e sempre absurdamente aquecida era a dela. Quando faço menção de tirar a mão, a sua mão me segura e a coloca no mesmo lugar. Ela não se move, apenas fica de mão dada à minha e mesmo ouvindo as pessoas ao nosso redor provando a sobremesa servida, não tinha a menor intenção de me mover dali.É idiota pensar que existem pessoas que deixam nosso corpo em chamas só pelo contato da pele e  mesmo tão pequeno, aquele contato me fez ficar em brasa. O que estamos fazendo? O que ela está fazendo? Nossa conversa ontem foi bem esclarecedora. Meu corpo inteiro está reagindo ao seu toque da mesma forma que ontem, porém a sensação é ainda mais gostosa. Puxo a mão. Pego o talher e me sirvo, completamente confuso.

Chegando no bar mausoléu da cidade, constato o quanto as pessoas de Álamo Square tem mal gosto. Está lotado, entupido, cuspindo gente, mesmo sendo uma porcaria. Alguns amigos de Harvey vão pra sinuca, Eva se senta em uma mesa redonda ao lado e procuro quase que instintivamente Grace. Ela meio que sumiu com Aubrey quando chegamos e apesar de achar que elas foram ao banheiro, me pego olhando pra todos os lados para ver se a vejo.
- Você é meio que patético. - minha irmã declara.
- Oi?
- Vai atrás dela e fala logo, Blake. Tô cansada disso já. - antes que eu fale qualquer coisa, minha irmã enfia o dedo indicador na entrada da minha boca.- shhhhhh. Não quero ouvir a mesma ladainha de sempre. Só estou dizendo que você precisa aceitar o fato.
- Fato?
- Sim. O fato de que você já está tão na dela que nem sabe mais qual é a sua. - ela pisca e sai andando em direção ao bar.