Capítulo oito

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- Blake, Ethan.

EVA: Tá tudo bem aí? Como ela está?
Mandei uma mensagem pra Eva explicando o motivo de não estar em casa pela manhã, explicando o motivo completamente plausível de estar acordando na casa de Grace e não na minha.
ETHAN: Está tudo bem. Ainda não vi Grace pela manhã, mas ela estava relativamente bem ontem à noite. Jake é um caos ambulante, Eva.
EVA: você fez bem em ir até a casa dela. Grace não merece passar por isso depois de tudo oque aconteceu... que cara insuportável.Vou deixar Ava na escola hoje e pegar o turno da tarde no Eddie's, você busca Ava? Bjo ;-*
ETHAN: sim, bom trabalho ;-)

- Bom dia. - Grace cantarola passando do corredor pra cozinha.
- Bom dia, você dormiu bem?- me sento no sofá para poder vê-la fuçando em algo na cozinha.
- Não consegui dormir, e você ?
- Dormi um pouco.- minto.
- Obrigada por ter vindo ontem. - ela vira um copo inteiro de água na boca- caso você precise de algo, pode contar comigo. Estou te devendo algumas.
- Tipo esconder um corpo?
- Poderia ser algo mais simples? - ela sorri.
- Você não me deve nada, sabe disso.
- Bom, eu acho que sim. Vou começar pagando com café da manhã. O que você gosta de comer?
- O que tiver. Geralmente não cozinhamos nada pela manhã porque eu e Eva odiamos fazer todo tipo de comida.
- Gosta de bacon? - ela diz abrindo a geladeira.
- Gosto.
- Queijo, ovos, calabresa?
- Gosto, mas você come tudo isso só pela manhã?
- Sim. Vai querer ou não?
- Com toda certeza eu vou querer.
- Você sabe fazer suco pelo menos?
- Bom, as meninas lá em casa tomam sem reclamar mas como não temos um padrão de qualidade para comparar, pode ser que seja uma merda que já acostumamos a tomar. - ela pega uma jarra e algumas laranjas.
- É laranjada, não tem como errar. Você faz o suco e eu faço o resto.
- Que equilíbrio. - zombo. Caminho até a cozinha e me ajeito na ilha à sua lateral, começando a espremer as laranjas. Grace liga um rádio pequeno já bem posicionado em cima da bancada da cozinha, passa as estações até parar em Escape, do Rupert Holmes. Ela adorava fazer tudo ouvindo música, e eu achava interessante como ela se desligava das coisas ao seu redor enquanto cantava junto com a letra. Ela picava o bacon e quebrava os ovos balançando de um lado pro outro.
- O que foi? - ela pergunta animada- você está com uma cara engraçada.
- Só estou achando graça de você. Você é muito animada pra uma hora dessas. Você nem sequer dormiu. - digo em indignação.
- O dia de ontem foi ruim, não significa que o de hoje  precise ser. - quando Rupert chega no refrão, ela se anima ainda mais e segura a colher que está mexendo os ovos como um microfone fazendo toda uma performance artística.- If you like Pina Coladas! and getting caught in the rain! If you're not into yoga, if you have half a brain...If you like making love at midnight, in the dunes of the cape, I'm the love that you've looked for, write to me, and escape...- ela ergue a frigideira e me oferece.
- Seu prato por gentileza, Sr. - ainda estou rindo dela e sua maluquice enquanto ela me serve o café da manhã com todo o seu entusiasmo.
- Obrigado. -agradeço. Evan tem razão. Há algo de muito especial em conviver com Grace. Me pergunto se antes de tudo acontecer com ela, seu humor era ainda melhor. Nós sentamos na bancada e comemos o café mais digno que já comi, considerando as minhas limitadas possibilidades em casa, isso parecia um manjar dos deuses.

Na segunda-feira, me senti meio mal por ela não estar no banco do carona para conversar, já que ela agora podia dirigir normalmente até o trabalho e não precisava mais de carona, voltei a vir sozinho. Quando entro na Catedral na segunda de manhã, Grace está no seu lugar habitual e novamente na mesma posição em que a conheci. Tusso de forma exagerada pra ela veja que cheguei.
- Olá, Ethan. - ela diz sem se mover.- Viro o rosto pro outro lado.
- Olá, Grace. - digo dando de costas e voltando pro lado de fora.

Geralmente ia até ela depois do meio dia para irmos no restaurante da esquina para almoçar, mas como ela já não estava mais com dificuldades para andar, decidi começar a tentar manter certa distância dela, acho que seria saudável pra nós dois. Eu estava estranhamente me acostumando com a presença dela o dia todo, e acho que isso não deveria ser normal. Alarmes soavam na minha cabeça em alguns momentos. Não porque eu tenho medo de sentir algo, mas porque ela facilmente seria meu tipo. Na verdade, Grace deve ser o tipo de qualquer um, e acho que alimentar a proximidade com alguém que é um misto de qualidades, só torna mais difícil manter uma amizade pura e simples. Era estranho. Estranho era a palavra que definia como eu estava me sentindo ultimamente. Estanho sobre como me dei conta de que me adaptei em poucas semanas à presença de Grace e estranho sobre como perder o hábito parecia difícil.
Passo a manhã toda me ocupando com qualquer coisa que não seja ir até ela para conversar. Na hora do almoço, me adianto para ir no restaurante em que costumo almoçar todos os dias e quando estou atravessando a rua, a escuto chamar meu nome.
- Você só me espera quando estou com o pé machucado? - ela diz andando em minha direção com pressa.
- Não sabia que você você ia querer comer lá ainda.- minto - já que agora você pode voltar pra almoçar em casa, como fazia antes. - ela me olha com o olhar desconfiado.
- Hum. Tá. Eu vou lá de qualquer forma. - andamos juntos em silêncio. Na minha cabeça só vinha Evan e minha irmã. Pensava em Eva me dizendo pra não me deixar levar demais, porque gostar de Grace é fácil.- Grace se adianta e para com os braços cruzados na minha frente.
- O que tá pegando, Blake? - ela diz nervosa. - estou fedendo? estou com alguma doença venérea ou algo assim?- começo a rir.
- Como assim?
- Você tá me evitando o dia todo, é isso. E agora está calado como nunca.
- Impressão sua.
- Impressão minha? Você conversa comigo o dia todo e hoje só meu deu um "oi". O que aconteceu?
- Nada. Só... estava pensativo demais hoje e não prestei atenção nisso. Foi mal. - seu olhar continua desconfiado.
- Fala o que é.
- Já disse. - ela dá mais um passo, determinada a me confrontar.
- O que tá pegando, Blake?
- Você vai me obrigar a falar? - brinco, mas ela se mostra irada de verdade.
- Vou. Se você não falar, grito no meio da rua acusando você de estar me perseguindo. Escolha sua. - ela estava falando sério, o que só me dava ainda mais vontade de rir.
- Não é nada, Grace.
- Então tá, como você quiser. - ela sai andando na frente.
- O que você tá fazendo?
- Se você não quer dizer por que está evitando minha presença, não vou almoçar com você.
- Nós estamos indo pro mesmo lugar.
- E daí? Não tem só a sua mesa.
Andamos separados porém na mesma direção, enquanto ela marcha com suas pernas pequenas até o restaurante. Ela se senta na mesma mesa que geralmente sentamos, e põe a bolsa no lugar onde eu costumo sentar. Começo a rir sozinho dela e me sento na mesa contrária à dela. Ela está com o rosto esculpido na ira, e está linda. Deus. Não posso de jeito nenhum estar pensando nisso.



Não pretendia parar de falar com Grace, mas ela tomou essa decisão por mim desde quando não a expliquei meu afastamento. É melhor assim, preciso estabelecer uma distância entre nós dois pra que eu não me machuque nessa merda, ou machuque alguém. Era terça-feira à noite quando ficamos até tarde na Catedral . Todos da parte interna já tinham ido embora, me despedi dos meus funcionários e quando estava prestes a entrar na picape, vi Grace nos fundos limpando seus pincéis e rolos, balançando conforme o ritmo da música que ela ouvia no fone de ouvido. Fico alguns minutos observando ela, leve e distraída. Quando ela se vira cachoalhando a água dos pincéis, me fita observando-a.
- Você não conversa comigo mas fica na espreita atrás da moita igual um maníaco sexual? - ela realmente consegue manter a pose de durona por muito tempo.
- Só estou me perguntando se você viu que está de noite e todos já foram embora. É perigoso ficar sozinha aqui, principalmente por você nem estar prestando atenção nas coisas a sua volta e a área do oratório ficar aberta.
- Tá. Não precisa se preocupar. Quer dizer, você não liga muito né?
- Grace.
- Pensei que a gente já estava começando a ter uma amizade. Aí você simplesmente começa a me ignorar sem o menor motivo. - ela entra no seu Audi e pragueja sozinha. Assim que ela liga o carro, xinga novamente.
- Droga. Esqueci a bolsa. - ela olha na direção da pia recém usada. Vou até lá pegar e ela me agradece quase de forma inaudível.
- Grace. - entrego a bolsa e me apoio na sua janela. - não precisamos ficar assim um com o outro, sabia?
- Boa noite,Blake.
- Grace, escuta.
- O que? Escutar o quê? Já te dei a oportunidade de me falar o que é que tá rolando e você não fala!
- Por que é meio ridículo.
- Não ligo, ok? Só fala.- Tomo coragem numa tragada de ar. Sabendo que irei me arrepender duramente no futuro de dizer a verdade.
- Estou com medo de confundir as coisas.
- Confundir as coisas?
- O que eu quero dizer, é que acho que devemos estabelecer um limite nessa amizade nossa.
- Limite?- ela bufa.
- Sim, não sei se é certo que eu passe tanto tempo com você. - dizer em voz alta aquilo era ainda mais ridículo.
- O que? - ela ri- devemos estipular horas semanais pra conversamos? Igual uma visita na cadeia?
- Não é isso, Grace.
- Então é o que? Juro que estou tentando entender. Você estabelece horário para seus amigos?
- Não é isso. Eu não sei como te explicar.
- Tente, ao menos. - Ela cruza os braços acima do volante e desliga o farol.
- Estou começando a enxergar você.- ela me olha confusa.- Estou começando a enxergar você, e ver a mulher incrível que você é, e não a mulher incrível do meu amigo. - seu olhar se constrange. Eu devia ter dito aquilo? Ela pediu sinceridade.
- Droga, Ethan. - ela bate no volante.
- Você me perguntou. Só acho que em respeito a ele devíamos nos distanciar um pouco. Você é...
- Eu sou o quê ?
- Sem eufemismo?
- Sem a porra do eufemismo. Fala logo o que você quer dizer.
- Você é... - pondero sobre o que dizer. Você é gostosa? Linda pra cacete? Tão Inteligente e perspicaz que chega a dar raiva?- atraente. - queria bater na minha cara com um taco de beisebol.
- Tá, e daí? Você também é, nem por isso estou fugindo de você como uma surtada.
- Só não quero proporcionar a mim mesmo uma dor de cabeça. Acho que nós dois ficamos muito próximos e... eu não sei se minha cabeça consegue ser inteligente a ponto de só manter isso na amizade. Bom, acho que você já entendeu.
- Droga. - Grace liga novamente o carro e me olha com pesar.- Por que você tinha que estragar tudo? - me afasto do seu carro e ela sai do estacionamento. Também quero saber como eu consegui estragar a nossa amizade, Grace.

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