- Hayes, Grace.
- Grace. -a voz de Aubrey me chama, de forma quase inaudível.- Grace? - o tom de voz aumenta e sinto um cutucão do lado esquerdo do braço.- Graaace! Acorda.- abro os olhos e meu cabelo está no meu rosto, e também acho que babei um pouco. Tento recuperar a nitidez enquanto forço meus olhos a ficarem abertos. Ainda tá de noite Aubrey.
- Hmmmpfsjs.
- Acorda.- ela me chacoalha.- Anda. A gente precisa ir.
- Ir? - limpo os olhos e vejo seu rosto pairando em cima do meu, alguns cachos fazendo cócegas no meu nariz.- ir aonde?
- Hospital. Acho que deve tá quase, minha bolsa estourou tem umas duas horas, e as contrações estão vindo com mais frequência depois que tomei um banho.- me sento na cama desorientada e ela repete. Olho o relógio.
- Você tá com a bolsa estourada e foi tomar banho? E só me chamou agora?!
- É sério, Grace? Vamos discutir agora? Isso é absolutamente normal, até parece que você não sabe.
- Eu? Eu sei disso? Auby, eu marquei meu parto e meu único trabalho era apenas chegar lá na hora que o médico marcou.- ainda estou processando os acontecimentos -Vem, vou te ajudar a vestir.
- Ei! - ela estala os dedos na minha cara-terra pra Grace! Já me arrumei e a bolsa pra levar já estava pronta, só falta você. - minha cabeça ainda estava meio grogue.
- Não acredito que você está tão tranquila.
- Por que não? É algo natural, e o bebê não sai assim que a bolsa rompe.
- Claro. Naturalmente insano, é o que é. - quando eu soube que estava grávida tive duas reações: surtar porque eu não planejava ser mãe e surtar porque eu morria de medo de ficar grávida pela gestação em si. Tinha pavor de imaginar uma pessoa dentro de mim mexendo e tudo o mais, e por nove meses tive medo de dar à luz. Na verdade, perguntei à minha médica se não havia a possibilidade de Maddie morar aqui dentro pra sempre e eu não ter que passar por todo aquele processo tortuoso de parir. É claro que nem todo mundo reage da mesma forma, e eu não posso reclamar, já que fiz cesárea e não senti um pingo das dores que muitas mulheres já relataram pra mim.
- Obrigada pelo apoio moral, Grace. Você é a melhor amiga de todas. - Ela diz, sarcástica.
- Desculpe. Vou me comportar. PARTO NORMAL É INCRÍVEEEEEL E VOCÊ MAL VAI SENTIR DOR! onde está a bolsa? - ela aponta pro próprio quarto.- Vou pegar e por no carro, senta aqui que eu já venho te ajudar a ir até a garagem. Visto a primeira coisa que vejo, que por sinal é uma calça de moletom e uma blusa cinza de malha. Enquanto ajeitava minha própria bolsa às pressas para passar a noite no hospital, ouvia Aubrey arfando enquanto outra contração vinha. Entramos no carro e eu começo a me dar conta do que estávamos fazendo: estamos indo as duas pro hospital e vamos voltar em três. Já fiz isso antes e certamente não é meu momento de entrar em pânico, esse é o momento de Aubrey. É claro que quando eu a chamei pra vir morar comigo, tinha ciência de que teria novamente uma criança em casa e acho que hoje em dia consigo lidar com isso, ou pelo menos, achava. Agora estou tensa, isso é como se fosse um flashback da noite em que voltei com Maddie enrolada em uma manta macia pra casa. Eu sorrio com a lembrança e mexo no colar de Maddie que agora é meu, e o uso com certa frequência.
- Ok. Agora estou começando a ficar com medo, Grace. - ela diz a caminho do hospital. Apoio a mão em sua coxa, e faço sinal pra que ela coloque a dela junto à minha.
- Eu sei que te assusto às vezes, mas juro que nada disso vai importar na hora, prometo.
- Tem certeza? Porque dói muito e a gente não tá nem na metade. - Aubrey está controlando a respiração e seu rosto de pânico é certamente apavorador.
- Tenho. Ah...Auby, vai ser uma droga agora, tá legal? Mas depois fica tudo bem. Prometo. - Aubrey começa a rir mas logo vem outra.
- Tá diminuindo o tempo entre uma e outra.
- A gente já tá chegando.
- Conversa comigo pra eu distrair.
- Já pensou nos nomes?
- Eu acho que sou péssima nisso, quero ver o rosto e escolher. Acho que todo mundo deveria ter o nome que combina com o rosto.
- O que combina com a cara amassada e cheia de placenta de um bebê? - ela me dá um tapa na coxa.
- Não sei. Por que você não me ajuda? Quando você ver o rosto, me diz qual nome tem mais a ver. Você é madrinha mesmo, pode me ajudar a escolher. Assim, se esse bebê crescer revoltado com o nome, eu digo que você me ajudou e aí ele ou ela irá detestar nós duas na adolescência.
- Posso lidar com isso. - chegamos no no hospital e logo na entrada me forneceram uma cadeira de rodas para ela sair do carro, preenchemos um formulário e pronto. Estávamos começando aquilo. Aubrey tinha razão, ela já estava bem perto do nascimento. Enquanto eles a preparavam, me vesti com as roupas próprias para poder entrar no bloco com ela, e fomos juntas pelo corredor até a sala de parto. Aubrey começou a chorar num misto de emoção e tensão, mas parou quando seu médico apareceu e começou a fazer graça, tentando distraí-la. Comecei a chorar também, aquilo era sempre intenso demais pra mim, pra qualquer pessoa. Segurei a mão dela por um bom tempo, até que ele me alertou que ela provavelmente não teria passagem pois não saíamos dos 5 centímetros de dilatação, mesmo depois de horas aguardando. Aubrey já estava exausta, e quando chegamos a dez horas intensas de espera, Aubrey já não aguentava mais e os médicos decidiram optar pela cesárea, e eu tenho quase certeza de que ela não se importou, porque nos momentos finais já estava gritando " NÃO LIGO MAIS PRA COMO VAI NASCER, SÓ FAZ NASCER LOGO!"
Antes de iniciarem a cirurgia, ela me puxou pra perto e falou baixinho no meu ouvido a maior responsabilidade da minha vida.
- Talvez eu fique grogue, e talvez eu até durma depois que nascer. Você vai ver tudo e quero que escolha o nome.
- O que? Você não estava falando sério. A gente aqui - aponto pra barriga fazendo um círculo até mim- pode certamente esperar você acordar, mamãe.
- Ninguém merece chegar ao mundo sem um nome ok? E... ele iria fazer isso. Combinamos que ele iria escolher o nome e bem... isso não está mesmo acontecendo. Confio em você, escolha algo que faça sentido pra o bebê e pra você.
- Isso é muita responsabilidade.
- Acredito em você.
Fui afastada quando começaram os procedimentos. Fiquei segurando a mão de Aubrey enquanto eu esperava atrás da cortina que fizeram da sua cintura pra baixo e pouco tempo depois, finalmente ouvi o choro, Aubrey falou algo mas apagou logo em seguida. Ela dormiu num sono profundo, e me deixou sozinha com o bebê.
- É uma menina.- disse o médico, que pra mim, era novo demais pra trazer pessoas pro mundo. Levaram a bebê para outra sala, e após algum tempo de mais espera, a enfermeira me chamou avisando que ela já estava pronta e que eu poderia ir até ela. Fui até o lugar onde eu adorava ir, silencioso e cheio de bebês recém chegados no mundo. Ela me aponta de trás do vidro o minúsculo ser humano no qual devo focar. Ela dormia serena numa manta que trouxemos e a mão direita acima da dobradura da manta, como se estivesse em paz com o mundo aqui fora.
- Você é a companheira de Aubrey? - me assusto quando vejo o médico jovem de Aubrey novamente.
- Sim, sou. - continuo olhando pra bebê, ainda sem nome.
- Não sabia que Aubrey estava com alguém. Faz tempo?- começo a rir. Sorrio porque me lembro de termos brincado sobre essa situação.
- Ah não, somos só amigas. - ele fica em silêncio e se inclina sobre o vidro.
- Então você é solteira? - olho da bebê sem nome para o cara que não sei o nome.
- Oi?- esse cara realmente está flertando durante o meu momento mágico?
- Sou Harvey, médico da Aubrey. E você é?
- Grace. - estico a mão um pouco sem graça e sem vontade também - Grace Hayes. Sou melhor amiga dela.
- Como nunca a vi?
- Bom.. - é da sua conta? Imagino que não. Mas respondo, porque ele trouxe ela ao mundo e não preciso ser rude só por não estar afim do cara. - Eu estava em Londres por um tempo, acabei de voltar. - viro-me novamente para a bebê. Qual nome seria o ideal?
- Você tem filhos? - o médico está realmente querendo me conhecer na entrada da maternidade. Não posso acreditar.
- Já tive. E se você está tentando flertar, é melhor desistir.
- Você é lésbica?- eu o encaro, visivelmente irritada.
- Não. Esse é o único motivo pelo qual uma mulher não se interessaria por você?
- Talvez. Sou bem requisitado. - ele diz, visivelmente brincando- você é celibatária?
- Não, só estou curtindo a minha solteirice e apreciaria se você entendesse.
- Entendi. Mesmo que esse homem aqui seja incrivelmente diferente dos outros?
- Duvido.
- Você teria que ver pra crer, não acha? - isso está mesmo acontecendo?
- Vou pensar.
- Isso já é o suficiente.
- Olha, sem querer ser rude, estou num impasse aqui sobre nomes para escolher para um bebê, então se me permite..- volto a ignorá-lo e me foco na bebê.
- Ok. Entendo, tenha um bom dia, Grace.
- Ponto positivo sobre você: não insiste. Fico grata por isso, tenha um bom dia também Doutor, e obrigada por ter trazido ela ao mundo. - assim que me viro novamente para ignorar tudo que não seja a bebê sem nome, ele ri e volta dois passos pra trás.
- Na verdade, estou indo até a recepção pegar seus dados de forma ilegal e perseguir você, mas achei melhor não contar. - ele pisca.
- O que? - digo horrorizada e ele começa a rir - você é doido?
- Talvez. Você pode me passar seu número por bem ou por mal. - seu tom é de brincadeira mas sua sobrancelha me desafia como se fosse verdade.
- Você tá me coagindo então a sair com você?
- Não. Que isso, seria bizarro eu te obrigar a fazer isso. Só quero seu número.- coloco a mão na cintura exasperada. - o resto é com você.
- Inacreditável.
- E então?
- E então o que?
- O que vai ser? Seu número ou posso bancar o stalker e ir procurar seus dados na recepção?
- Você é pirado. Boa sorte em conseguir. - eu me viro e ele começar a rir.
- Se eu conseguir, posso usufruir disso? digo, mandar uma mensagem para marcar nosso encontro?
- Ah, você agora pergunta o que eu quero? - ele acena
- Claro. Meu plano maquiavélico é te convencer de que sou um bom cara. E então?
- Tecnicamente não posso te impedir de mandar mensagens antes de ter seu número para bloquear.
- Então isso é um sim.- ele acena e volta a continuar seu trajeto pelo corredor que dava acesso às salas de internação.
- Talvez eu vá mesmo te bloquear. Você é meio maluco.-ele interrompe os passos e me olha por cima do ombro.
- Você não iria perder uma oportunidade dessa.
- Você é muito convencido.
- Minha mãe sempre disse que eu era o melhor.
- E seu erro foi ter acreditado nela. Se não se importa, eu preciso mesmo escolher o nome dela.
- Boa sorte. Te vejo em breve.- assim que ele some no corredor, começo a rir sozinha negando com a cabeça os últimos acontecimentos. Quando olho novamente pra ela, me fixo nos seus traços em busca de uma resposta, e enquanto eu a observava, pensava em vários momentos da minha gestação, onde procurava nomes que tivessem algum sentido pra mim. Maddison era o nome de um irmã que tive mas que mal chegou nos seus três meses de vida. Ela nasceu quando eu tinha dez anos, e me lembro que perguntava todos os dias pra minha mãe o porque dela não vir pra casa. Ela nasceu com sérias complicações e eu só a vi duas vezes, dentro da incubadora. Jake não queria pôr o nome por achar que isso traria má sorte pra nossa filha, mas não acredito nisso. O pouco tempo que minha irmã existiu trouxe vida e esperança pra todos nós. O segundo nome que eu cogitei, era Zoe, pelo seu significado. Uma enfermeira atrás do vidro acena pra mim para que eu entre e ela possa me passar ela. Assim que a pego no colo, ela grunhe, provavelmente por tudo isso ser novo. Tentei não pensar na minha primeira vez segurando um bebê que acabara de nascer, afinal, esse é o momento dela, e enquanto a segurava e tamborilava os pés em animação, tive a certeza de que Zoe era o nome perfeito, Zoe significa vida em seu sentido puro. Ok. Vai ser esse nome. Combina com você. Penso olhando para ela.
- Zoe. - digo reflexiva - tomara que você goste do nome quando for adolescente. - nino seu corpo suavemente no meu colo enquanto balanço de um lado pro outro. É engraçado pra mim pensar que em meio a tantas perdas, finalmente estou cheia de vida ao meu redor outra vez.
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Questão de tempo
Romanzi rosa / ChickLit" É preciso acreditar que depois das coisas ruins sempre vêm as coisas boas...ou pelo menos, deveria ser assim" Grace Hayes, 26 anos, uma perda, uma mente brilhante , noiva de Evan Jenkins e dona de um ego totalmente inabalável. Ethan Blake, 27 ano...