Shiro levou os três até uma cabana vazia. Era uma construção de cômodo único, feita inteiramente de madeira. Havia dois beliches, um de cada lado, com uma lareira entre eles, além de uma estante meio vazia, uma mesinha de centro e um tapete de pele cobrindo o piso
–Posso deixar que fiquem aqui um tempo. Ninguém usa essa cabana há meses. –Disse o garoto, acendendo o fogo e iluminando o ambiente. A luz fraca já era o bastante para seus olhos treinados e, embora Ayla ainda não estivesse acostumada àquilo, conseguia enxergar melhor do que uma pessoa comum conseguiria.
–O que aconteceu com quem morava aqui? –Perguntou Ayla, temendo o pior.
–Dois se casaram no verão passado, e outra entrou para as patrulhas e foi viver em um dos postos de controle da estrada. –Ele dirigiu um olhar brincalhão para Marlon. –Desculpa, cara, não consegui segurar o seu apê. Você ficou tempo de mais fora.
–Eu devia ter imaginado. Não tem problema, Shiro. –Agradeceu Marlon, deitando Valen em um dos beliches. A garota rilhou os dentes de dor, mas permaneceu no sono pesado em que estava. –É só por alguns dias. Até encontrar outro lugar seguro. Mas eu gostava mesmo daquela cabana.
–Sei como é. Fiquei uma fera quando precisei me mudar. Só pra atualizar a rede de fibra ótica levou três semanas! –Reclamou o mais novo. –Sem falar em todos os monitores, HDs, e todo o cabeamento... Enfim. Depois do café da manhã vou mandar um dos curandeiros para dar uma olhada na Jötunn e então poderei realocá-los, se precisar
–Não precisa se forçar tanto.
–Tudo bem, Marlon. Devemos muito a você. Pode ficar o quanto precisar, mas já aviso que estou quebrando regras aqui. –Indicou Ayla com a cabeça. –Sabe que alguns aqui não tem muita simpatia pelo, hã, tipo dela, principalmente os mais velhos. Expulsarem ela é o menor dos problemas.
–As duas estão sob a minha proteção. Quem encostar em um só fio de cabelo delas pagará com o próprio sangue.
O garoto fechou os olhos, soltando um longo suspiro.
–Mas e aí? Vai me contar qual é o lance com ela? –Mais uma vez indicou a direção da outra cama com a cabeça. –Como encontrou uma Cria de Fenrir? E por que trouxe ela para cá? –Sussurrou. –Ficou louco? Sabe os efeitos que elas causam na gente.
–Por isso que não quero demorar. Vamos esperar a poeira abaixar e seguir viagem. Acredite, a última coisa que quero é que algo aconteça à esse lugar.
Shiro mordeu a ponta de seu dedão, um hábito que tinha quando estava nervoso ou ansioso com alguma coisa. Já estava na presença da Cria há menos de uma hora e já sentia o sangue fluir mais quente pelas veias e aguçar os sentidos lupinos. Se já não fosse experiente em lidar com a Besta, poderia já estar tendo problemas agora.
–Desculpa a intromissão. –Disse Ayla, aproximando-se dos dois. –Sou Ayla. Aquela ali é a Valen. Sentimos muito se estivermos atrapalhando.
–Não, não –Shiro sentia o rosto esquentar. –Fico de bobeira a maior parte da noite mesmo. Quem cuida da segurança é a Aka. –Disse, evitando o contato visual. –Sou Guilherme, mas todos por aqui me chamam de Shiro. Não que eu me importe muito com isso.
–Não é um apelido muito comum. –Comentou Ayla, achando graça da vergonha do garoto. Talvez fosse muito tímido.
–O Shiro é um dos mais fortes de Ulvgard. –Explicou Marlon. –Apesar de ainda cheirar a leite e ter essa carinha de bebê.
–Ei! –A pele albina de Guilherme assumia aos poucos uma tonalidade engraçada de rosa. –Não tem graça nenhuma! –Bateu o pé de raiva.
–E o que vocês são, exatamente? –Perguntou Ayla. Na mesma hora a expressão do garoto ficou séria, apesar do rubor continuar. –Tudo bem se não quiser...
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A Última Cria
FantasíaAyla é uma noviça que pouco viu além dos muros do Convento de Santa Alice. Apesar de gostar da ideia de tornar-se freira, a garota anseia por desbravar o mundo e conhecer seus mistérios. Ela só não imaginava que esses mistérios viriam atrás dela, at...