Capítulo 3: A Parada de Caminhões

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Interior da Bahia


Já era tarde da noite quando Marlon alcançou enfim a parada de caminhões. Viu as luzes bem antes de ver o lugar, com todas as sinalizações e placas espalhadas pela estrada, assim como diversos caminhões, carros de família, motos e outros veículos que faziam ali um ponto para esticar as pernas, comer algo gorduroso ou ir ao banheiro.

Fez a curva para entrar no estacionamento, passando pelo posto de gasolina onde um único atendente montava uma solitária vigília, estacionando seu chevette preto próximo à saída dos banheiros. Antes de sair, notou dois casais engajados em um beijo coletivo adentrarem uma das cabines masculinas. Deu de ombros, trancando o carro e guardando a chave no bolso da calça jeans preta. Os tempos podiam até mudar, mas os mortais permaneciam os mesmos.

Passou pela catraca do lugar sem maiores complicações, sendo imediatamente atingido pelo odor de cerveja barata, óleo velho e urina. O ar ali estava abafado e relativamente mais cheio do que esperava, mas isso não o intimidou. Talvez fosse algum jogo importante do campeonato de futebol que estivesse passando e os viajantes tivessem optado por pararem ali para assistir. Não importava. Tinha assuntos mais importantes no momento. Vasculhou o lugar com o olhar, não encontrando a princípio a pessoa que viera ver.

Foi até o balcão para pedir algo para comer e beber enquanto esperava quando foi barrado por três sujeitos bastante grandes e mal encarados.

–Posso ajudar? –Perguntou, não demonstrando medo da tentativa de intimidação.

O da direita, de barga longa e ruiva e rosto redondo e rosado curvou-se, cheirando o ar próximo de Marlon.

–Você fede a asgardiano!

–É uma acusação bem pesada, amigo.

–Esse é território da Tribo da Montanha. –Disse o outro, com longas tranças louras embaraçadas. –Pessoinhas do seu tipo não são bem-vindas aqui.

Marlon lançou seus olhares para o terceio e mais alto do trio, mas esse nada fez mensão de dizer. Apenas ficou ali, de braços cruzados, o encarando com cara de poucos amigos.

Quando estava prestes a lançar uma provocação, uma voz aguda veio de detrás deles, que logo viraram para ver quem falava.

–Ele está comigo, idiotas. –Disse uma figura bem mais baixa que Marlon e os três, mas com uma presença gigantesca em cada palavra. –Vão perturbar algum mortal por aí e nos deixem em paz. Ou vai haver consequências.

O grupinho se entreolhou, chegando a conclusão que não valia a pena manter a postura agressiva. O ruivo ainda cuspiu no chão antes de se afastar, encarando Marlon com olhos carregados de uma fúria primitiva.

–Não ligue para aqueles neanderthais. São bons para a guerra, porém péssimos com a educação. –Desculpou-se a figura diminuta, aproximando-se de Marlon com um sorriso. –Bom te ver de novo, grandão.

Marlon devolveu o sorriso, dando um abraço na garota.

–O prazer é meu, Valen.

–Tá bom, sem enrolações. Vem, te pago uma gelada.

A menina puxou o banco alto para trás a fim de se sentar. Tinha pouco mais que a altura do próprio assento e teve dificuldades para subir, mas não se fez de rogada, ficando então com os cotovelos apoiados no balcão ensebado. Pediu uma cerveja para Marlon e um achocolatado para si. A garçonete anotou na comanda com uma caneta os itens "Lata de Cerveja S" e "Chocolate T", devolvendo o papel para em seguida desaparecer para buscar os pedidos. A lata chegou acompanhada de um copo pequeno, do tipo que se vê em qualquer bar, no qual Marlon despejou a bebida gelada, e um outro copo grande e quase transbordando de leite com chocolate. A cerveja era leve e refrescante, diferente das que costumava beber antigamente. Ou os mortais haviam desaprendido a arte de produzir cerveja ou ele perdera o paladar após tanto tempo.

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