Capítulo 19: Ratatoskr

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Muitas criaturas e seres mágicos habitam os galhos da Yggdrasill. Sejam figuras importantes, como os deuses, os Aesir e os Vanir, ou os Jötunn, até criaturas menores como os Anões, Elfos e Humanos. Porém, também existem algumas que passam desapercebidas pelos olhos mais desatentos. E esse era o caso de Ratatoskr, o Esquilo Mensageiro, cuja função primordial é causar intriga entre Hræsvelgr, a Águia dos Ventos, e Nidhogg, a Serpente Devoradora, levando fofocas e insultos de um para o outro.

–Olha só, parece que alguém fez a lição de casa. –A garota provocou o rapaz. –Devo imaginar que essa não é a primeira vez que conhece alguém como eu. Afinal, convenhamos, você é a Memória dos Deuses.

Marlon permaneceu em silêncio, estudando a prisioneira. Estavam em algum lugar no subsolo, um tipo de porão feito para criar porcos antigamente e que foi convertido em um calabouço que devia contar com duas ou três celas na melhor das hipóteses. O Corvo de Odin passara a noite inteira ali, aguardando a garota acordar, e agora começava a sentir falta do silêncio.

–Por que tanto medo? Minhas mãos estão presas e essas runas restringem o meu fogo. –Disse, contorcendo o rosto em uma expressão de dúvida irônica. –Estou totalmente indefesa aqui.

Isso era verdade. Marlon tomara precauções tanto para que ela não escapasse quanto para que ninguém mais soubesse que estava ali. Seria perigoso que alguma pessoa que perdeu um parente durante o ataque do festival decidisse fazer justiça com as próprias mãos.

–Sabemos que teve ajuda de alguém de dentro. –Foi direto ao ponto. –Se nos contar quem foi, talvez possamos negociar.

–Nossa, fico lisonjeada com sua oferta. Infelizmente, preciso recusar. Não vou expor meu informante assim. Nem poderia.

–Então está afirmando que há um infiltrado.

–Vocês sabem que há, seria tolice negar o óbvio. Agora, quanto a contar quem ou quando ele me passou a localização da Cria de Fenrir, bom, fica no ar a questão.

Marlon passou os dedos pelos cabelos, pensativo.

–Não vai me enganar com suas palavras. Sei como sua divindade funciona.

–Isso é contra as regras, sabia? Ficar bisbilhotando os segredos de uma dama é considerado falta de educação no lugar de onde venho.

–E onde seria isso?

–Deixo para a sua imaginação.

–Fala português com bastante fluência. Mas não parece ser daqui.

–A Igreja tem muitos braços por todo o mundo. –Deu de ombros. –Passei alguns anos na sede deste país. Ficaria surpreso com a multiplicidade étnica dos Jötunn que há aqui.

–Foi a Igreja quem ordenou o ataque?

–Posso contar com uma condição, corvinho: que me solte! –A garota tentou saltar sobre o rapaz, mas foi impedida pelas correntes. Então, começou a rir.

–O que é engraçado?

–Nada. Só estava pensando no quanto você parece desesperado pra arrancar algo de mim. Quase como se... –Seu olhar mudou para um de admiração. –Ah, claro. Agora entendi. Você perdeu alguém, não foi?

Dessa vez, foi Marlon quem perdeu o controle, agarrando a garota pelo colarinho.

–Você não sabe do que fala, Jötunn. Não sabe o que ela significava para mim.

–Então era uma garota? –Sussurrou ela em seu ouvido. –Interessante. –Marlon arregalou os olhos, recuperando a razão e afastando-se dela aos tropeços. Havia caído na armadilha. –Como agradecimento por me contar, vou lhe dizer o meu nome. Pode me chamar de Noor al-Saqqaf, Segunda Sacerdotisa da Chama.

A Última CriaOnde histórias criam vida. Descubra agora