O caminho pela floresta era lamacento e escorregadio. A chuva havia cessado, como se seu propósito já tivesse sido concluído, e agora sobrara apenas o frio cortante da madrugada.
Algumas nuvens ainda se mantinham no céu, por conta disso, as estrelas e a lua ficavam tampadas e a noite parecia mais escura do que nunca.
Chirai caminhava ao lado de Jaco, que segurava uma tocha improvisada por Broly, tentava se aquecer segurando os braços envolta do corpo, como se abraçasse a si mesma, e mantinha-se o mais próxima possível daquele fogo que queimava na noite escura.
- Seu nome é Chirai, não é? - Jaco sussurrou a indagação, recebendo apenas um aceno de concordância da pequena mulher.
Os olhos castanhos dela mantinham-se presos nas costas largas de Broly, que caminhava um pouco mais a frente deles ao lado de Kakarotto. Os dois não possuíam uma tocha na mão, pareciam imunes ao frio e tinham facilidade de enxergar na escuridão.
- Eu sou o Jaco! - O pajem tentou mais uma vez puxar assunto com Chirai.
- Muito prazer, Jaco - Chirai sorriu discretamente, finalmente desgrudando seus olhos de Broly e virando a cabeça em direção a Jaco.
- Eu estava aqui pensando - Jaco disparou sem pestanejar, dando sentindo do porque havia puxado assunto com aquela mulher -, não acha melhor desviarmos caminho deles e nos escondermos na igreja?
- Na igreja? - sussurrou Chirai confusa.
- Sim! - a voz de Jaco era tão baixa quanto a de Chirai. - Não percebe, eles estão indo na direção daquela morta-viva descontrolada, precisamos parar de caminhar junto deles e nos escondermos em um local seguro.
Chirai fez uma careta, ponderando a proposta daquele homem, porém, antes que pudesse responder, Chirai viu Broly virando o pescoço por cima dos ombros e olhando para ela e Jaco.
- Não adianta se esconderem na igreja - disparou o morto-vivo sem parar de caminhar. - Os mortos que caminham consegue entrar em solo sagrado, não somos como os vampiros.
- Vampiros... - Jaco gaguejou parando de caminhar, a palavra parecia ter dado um estralo em sua cabeça se dando conta de algo somente naquele momento. - Por Deus, e a Bulma? O que o Conde fez com ela?
Broly também parou de caminhar ao ouvir o nome da caçadora, virando-se para Jaco que estava petrificado ao lado de Chirai.
Foram tantos acontecimentos naquele baile, que ele simplesmente havia se esquecido de Bulma. Ela poderia estar presa em algum lugar daquele castelo, ou pior, poderia estar morta.
- Não precisam se preocupar - Kakarotto tranquiliza ambos virando-se para eles. - O Conde não tinha a intenção de mata-la.
- Como pode ter tanta certeza? - Indagou Broly desconfiado.
- Se ele quisesse a caçadora morta, teria feito na frente de todos no baile. Vegeta gosta de exibições. - Kakarotto respondeu com uma sobrancelha arqueada. - Pelo que entendi, ele tinha outros planos para ela.
- O que quer dizer com isso? - Jaco perguntou confuso, parecia um tanto assustado pelo tom de sua voz.
Como resposta, Kakarotto apenas deu um sorriso discreto.
- Vamos! Essa conversa está nos fazendo perder muito tempo. - Kakarotto virou-se, voltando a caminhar. - Temos que encontrar a minha Chichi.
O silêncio voltou a rondar entre os quatro. Seguiram a trilha na floresta, sendo eles guiados por Kakarotto que parecia conhecer cada galho de cada árvore na mata. Por alguns minutos ninguém falou uma palavra, mas a curiosidade feminina tomou conta de Chirai, e fora tão forte, que ela ignorou o frio e o medo indo ao lado de Broly, deixando Jaco sozinho atrás.
Por um momento, Broly estranhou a mulher ficar próxima dele, afinal, agora ela conhecia sua verdade, era comum manter-se distante de alguém como ele.
- Você gosta dela? - Chirai perguntou tão baixo que Broly quase que não ouviu o que sua indagação.
- Dela quem, senhorita? - Broly franziu a testa diante da pergunta, mas estava mais espantando por aquela mulher ter puxado assunto com ele.
- Da mulher que dançou com o Conde - respondeu Chirai, sua voz saindo um pouco mais alta agora.
- Da Bulma?
- Sim, acho que é esse o nome que o Jaco falou. - Chirai abaixou a cabeça por um instante. - Você parece gostar dela.
- Sim, eu gosto! - A resposta de Broly saiu com naturalidade.
A concordância rápida fez Chirai abaixar o olhar de maneira melancólica.
Mais alguns minutos se passaram e o silêncio tomou conta do ambiente novamente, apenas os barulhos dos animais da floresta se era ouvido. A mata parecia não ter fim, árvores e mais árvores davam a impressão que eles estavam andando em círculos.
Chirai continuava ao lado de Broly, e Jaco havia se juntado a Kakarotto mais a frente. O olhar da mulher mantinha-se baixo, era como se encarar o morto-vivo fosse sua última vontade na Terra.
O clima entre eles estava tão pesado que Broly resolveu puxar assunto com ela, sentia que precisava deixa-la confortável.
- Por que me perguntou aquilo?
- Perguntei o que? - Chirai indagou tão atômica que parecia estar perdida demais em seus pensamentos antes de Broly confronta-la.
- Sobre eu gostar da Bulma.
- Ah, nada - suspirou ela. - Só estava curiosa. Você pareceu bastante preocupado com ela, e agora pouco disse gostar dela, imagino que sejam bastante próximos.
- Com toda certeza não somos próximos - Broly sorriu de maneira despojada. - Nos conhecemos a pouco tempo na verdade.
Chirai surpreendeu-se, finalmente tirando o olhar do chão e o dirigindo a Broly.
- Eu pensei que fossem...
- Íntimos? - Broly completou quando viu que Chirai parou de falar por sentir-se constrangida.
Ela assentiu, sentindo seu rosto arder pela vergonha, agradeceu por estar escuro e Broly não ver o rubor em suas bochechas.
- Eu mal a conheço, na verdade - Broly continuou. - Mas ela foi a primeira pessoa que tive contato desde... Bom, já fazia muito tempo que não conversava com ninguém. E quando ela me pediu ajuda, para salvar Jaco, acreditei ter ganhado uma amiga.
- A quanto tempo você não conversava com ninguém? - Chirai mostrou-se curiosa.
- A mais anos do que você poderia viver, senhorita - a voz de Broly saiu extremamente melancólica.
- Meu Deus - murmurou ela triste. - Você está sozinho há anos então?
- Melhor isso do que ser desprezado por ser o que eu sou.
Chirai abaixou os olhos sentindo-os queimar pela umidade das lágrimas que provavelmente desceriam se ela não se controlasse.
- Sinto muito, Broly, deve ter sido triste viver assim. Deveria tentar encontrar mais amigos, ninguém precisa viver sozinho.
- E por quê eu faria isso, Chirai? - Broly parecia amargurado. - Se eu conseguir conviver na sociedade, verei uma por uma das pessoas que eu me afeiçoar morrer, enquanto eu, tenho a eternidade para suportar. Um monstro como eu deve se manter isolado, sozinho, evitando mais dor na minha miserável vida.
- Mas a solidão não te machuca? Por que não se permitir um pouco de alegria? Não deveria se isolar, você não é um monstro, ao menos não me parece um.
- Não me conhece, senhorita, tenho controle sobre minha natureza maldita, mas já pôde contemplar o que um morto-vivo pode fazer quando o controle se esvair dele.
Chirai mordeu o lábio inferior nervosamente, as mãos apertando uma na outra freneticamente. As lembranças do que acontecera a pouco no baile tomaram conta de sua memória. A morta-viva realmente fizera um grande estrago naquele castelo. Ainda podia ver os olhos obscuros de Chichi enquanto desmembrava aquelas pobres pessoas no salão.
Olhando discretamente para Broly, ela indagou-se interiormente se aquele homem tão doce, tão gentil, seria capaz de fazer tamanha maldade. Ela não podia acreditar naquilo. Broly era um homem bom, mesmo sendo quem era, ela podia sentir de alguma forma em seu coração.
- Não acredito que possa fazer aquilo, Broly - disse Chirai com coragem. - Você é um bom homem, sei que é. Mesmo sendo um morto-vivo, deve haver bondade em seu coração, talvez possa haver até mesmo amor.
Broly abaixou os olhos evitando olhar para Chirai. O clima parecia ter ficado mais pesado que antes.
- Não permitiria que houvesse amor novamente em meu coração.
- Novamente? - Indagou Chirai com o tom de voz tão alto que Kakarotto e Jaco olharam para trás.
Disfarçando, Chirai desculpou-se e os dois voltaram a caminhar.
- Então já amou, digo, amou uma mulher? - Chirai sussurrava agora.
- Isso foi a muito tempo - Broly estava visivelmente incomodado com aquela conversa. - Além do mais, foi em outra época, quando eu ainda não era assim.
- Mas...
- Eu nem ousaria sonhar com amor - Broly a cortou -, afinal, quem quer um defunto como marido?
- Kakarotto não parece se importar - Chirai apontou com a cabeça em direção ao lobisomem. - Ele parece amar bastante a mort... a Chichi.
- Ele é um maluco obcecado por ela - murmurou Broly um tanto raivoso. - Igual Dr. Gero era por vencer a morte. Além do mais, eu já sofro o suficiente, não criaria ilusões de amor.
Chirai fez uma careta, ela não sabia o porque, mas estava terrivelmente incomodada com a forma como Broly falava, ela parecia poder sentir o sofrimento dele, e uma certa trava com aquele assunto. Sua mente dizia para ela encerrar aquela conversa por aquilo mesmo, mas sua boca simplesmente estava incontrolável.
- Acho que está errado, Broly, aposto que deve haver alguma mulher nesse mundo que iria querê-lo. É um homem bonito, afinal.
Suspirando pesadamente, Broly para de caminhar e se vira para Chirai, que também havia parado. Ele a vira com delicadeza, para ficarem um de frente para o outro, enquanto Broly a segura em seus pequenos ombros.
- Por que está insistindo tanto nesse assunto, senhorita?- A pergunta saiu num sussurro sofrido.
Chirai não respondeu, os dois estavam próximos agora, e ela parecia hipnotizada pelo olhar dele. Seus olhos brilhavam na escuridão, a boca estava levemente aberta e o ar parecia sair e entrar com mais velocidade.
Por um instinto desconhecido, Chirai ergueu uma das mãos e a espalmou no peitoral dele, ela pôde sentir o coração dele batendo acelerado. O corpo dele era rígido e quente.
Broly fechou os olhos sentindo a mão terna dela acariciando seu tórax, um arrepio passou pelo corpo dele, assim como uma dor tomou conta do seu coração.
Ele sabia o significado daquela sensação, daquela aproximidade, daquele toque. Broly já fora um homem comum um dia, e conhecia os sinais. Mas não poderia ceder, mesmo sabendo que assim que abrisse os olhos sentiria vontade de beija-la, precisava se controlar, ele não era mais um homem comum que podia ceder a aquele tipo de desejo mundanos.
Por isso, assim que abriu os olhos e contemplou o desejo naqueles olhos brilhantes, Broly simplesmente pegou a mão que o acariciava, levou a palma aos próprios lábios e a beijou, um beijo carinhoso e repleto de ternura.
- Não deveria me olhar assim, Chirai - Broly pediu largando a mão dela e afastando-se.
- Por quê não? - murmura ela num choramingo.
- Não sou um homem, pareço um, mas não sou. Eu sou um monstro.
- Não! - Chirai se aproximou pegando na mão dele. - Você não é, eu posso sentir isso.
Broly olhou para a mulher à sua frente, ele não entendia os próprios sentimentos. Ao ouvir as palavras dela era como se algo tivesse se aquecido dentro dele, como uma chama, da qual ele acreditava ter se apagado para sempre. Não sabia mais como agir, como fazer para manter-se neutro. Somente sabia que estava a ponto de abraçar aquela mulher e beija-la. Mas a voz de Jaco cortou o clima, destruindo aquela áurea de paixão que o envolveu.
- Ei, vocês - gritou o pajem aproximando-se. - Vamos logo, não quero ficar sozinho com o lobisomem na floresta.
- Claro! - Broly desviou o olhar de Chirai indo em direção de Jaco. - Vou deixa-los em um local seguro, para Kakarotto e eu procurarmos Chichi mais tranquilamente.
Chirai correu para acompanhar os dois.
- Aonde pretende nos deixar, senhor?
- Na minha casa.
*****
Sem saber quem era, ou o que era, Chichi caminhou pela floresta, sendo guiada por aquele instinto. Os gritos das almas amaldiçoadas e a procura de vingança era a única coisa que a guiava, sua mente mantinha-se esquecida dos pensamentos de sua vida. Somente tinha espaço para os gritos dos mortos, perturbantes e assombrosos.
Com isso, ao som daquelas vozes, Chichi chegou ao cemitério, sua vontade de matar a todos ainda se mantinha em seu ser, mas o chamado dos mortos a perturbava, trazendo-naquele lugar, aonde os defuntos se mantinham presos em suas lápides.
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A Caçadora de Monstros
FanfictionEssa história se passou em 1830. Bulma era apaixonada por um Vampiro, mas ele partiu seu coração e ela se fechou para o amor. Jurando nunca mais se entregar a ninguém, e após acabar com o vampiro que a usou, Bulma foi embora de sua terra natal e dec...