Capítulo 9

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Cheguei na escola já analisando as pessoas. A partir de agora eu só escolheria "meus amigos" se eles tivessem alguma vantagem a me oferecer. Eu disse que não ia me apegar a ninguém em São Paulo, e agora eu levaria essa determinação a sério.

Eu não tive muita sorte para analisar os alunos nas duas primeiras semanas, mas quando começaram os trabalhos e atividades em grupo ou dupla eu comecei a perceber quem eu queria por perto. Eu sempre tirei boas notas e um dos meus focos aqui em São Paulo era não deixar as minhas notas abaixarem.

-Pessoal, quero duplas para os exercícios que vamos fazer agora. Escolham ou escolherei por vocês.

Olhei para todos da sala. A maioria já tinha sua dupla definida.

-Oi Miranda, a gente pode fazer junto? Eu meio que estou sem dupla.

-Claro. Eu não tenho dupla também.

-Legal.

-Seu nome é Leo né?

-Isso. Legal saber que você sabe meu nome.

-Você também sabe o meu.

-Mas é fácil reparar em você e querer descobrir o seu nome.

O professor entregou a folha com a atividade.

-Pra saber o meu nome é só prestar atenção na chamada.

-Não estou falando só aqui na sala. Se eu fosse de outra turma eu tentaria descobrir seu nome mesmo assim.

-Por quê?

-Você parece ser uma garota legal. E inteligente. Por isso te escolhi para ser a minha dupla.

-Você acertou em uma coisa: eu sou mesmo muito inteligente.

-Prove.

-Provarei com os exercícios, mas não vou fazer sozinha.

Começamos os exercícios e estávamos desenvolvendo bem. Eu reparei que toda hora ele olhava direto pra minha boca ou sorria por qualquer coisa, sem contar que ele encostou o braço "sem querer" em mim duas vezes.

Como eu estava sendo observada por ele, comecei a reparar nele também. Ele era um moreno forte, uns bons centímetros mais alto do que eu, olhos escuros e profundos, com cabelo cacheadinho e uma boca grande. Se eu quisesse me apegar a alguém, ele seria uma ótima opção. Considerei a ideia de me aproximar dele. Ele tinha uma coisa que me interessava, ele era realmente inteligente, além de ser bonito.

-Posso entregar o exercício?

-Acho que sim. Terminamos tudo?

-Terminamos.

-Então só entregar mesmo.

Ele se levantou e foi entregar o exercício para o professor.

-Eu não sei você, mas eu não tenho uma dupla de intervalo.

-Isso foi um convite?

-Acho que sim.

-Tudo bem, dupla.

As outras aulas passaram mais rápido do que eu esperava.

-O que você trouxe? Só pra eu saber se eu vou querer dividir.

-Trouxe maçã e biscoito. Aceita?

-Não. Valeu. Vou ficar com meu biscoito recheado.

-Não é um lanche muito saudável, vai acumular gordura.

-Não vou não. Eu pratico karatê. Perco gordura e ganho massa fácil.

-Então você é esportista?

-Um pouco. Que eu saiba você também é. Faz parte da turma de vôlei.

-Eu não acho que um mês praticando por duas ou três horas me faz esportista.

-É um bom caminho.

-Como você sabe que eu sou do time feminino de vôlei?

-Eu já vi você lá. E eu ouvi por aí.

-Ouviu o que?

-Você meio que tem uma fama ruim. Você tentou destruir o relacionamento do casalzinho do ano. Do ano passado na verdade, mas ainda assim é o casalzinho.

-Eu não tentei destruir o relacionamento de ninguém. Eu cheguei aqui e não conhecia ninguém, depois dei o azar de a primeira pessoa que conheci ser um canalha que não respeita a namorada.

-Vai ser difícil as pessoas acreditarem em você. O Otávio é o cara "certinho" da escola.

-Eu não tenho que provar nada pra ninguém nessa escola. A minha consciência está limpa.

-Eu sei. Quer dizer, conversando com você dá pra ver que não teria porque você fazer isso. Desculpa ter falado sobre isso.

-Tudo bem. Só não acredita em tudo o que esse cara diz.

-Eu não acredito em nada. Sempre achei ele bonzinho demais. A Pilar merecia bem mais.

Ele disse isso com raiva, e eu entendi o que estava acontecendo.

-Você gosta dela?

-O que? Não. A Pilar nem sabe quem eu sou, não sabe o meu nome.

-Você gosta dela sim. – Eu sorri – Talvez você não soubesse, ou só ela não soubesse, mas você gosta.

-Mesmo que gostasse ela está com o Otávio, e não vai terminar tão cedo. O que eu posso fazer é tentar esquecer.

-Por isso você veio atrás de mim?

-Não. Eu só queria te conhecer mesmo. Entender que você não é o que eu estou ouvindo sobre você.

-Não sou.

-Mas não posso negar que você é linda, e não seria nenhum sacrifício ficar com você.

-Você é um cara lindo e inteligente, então tenho certeza que vai entender quando eu disser que não quero me apegar a ninguém daqui. Eu não vou ficar muito tempo e não quero ter que me despedir ou fazer alguém sofrer quando eu for embora.

-Você já fez isso antes?

-O que?

-Alguém sofrer quando teve que ir embora.

-Já sim. Eu me fiz sofrer, e não quero sentir isso de novo. Desculpe.

-Eu não tô te pedindo em namoro, nem pra você ficar pra sempre. Eu só acho que poderia ser legal você aproveitar o momento e viver uma experiência. Melhor se arrepender depois por ter feito do que por ter deixado de fazer. Não acha?

-Talvez você esteja meio certo.

-Só preciso dessa metade.

Ele largou o biscoito na mesa, tirou a minha maçã da minha mão e me beijou. O beijo dele era doce, talvez por causa do biscoito, a boca dele era grande e macia e além de bonito e inteligente, ele sabia usar a língua.

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