Capítulo 37

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No terceiro ano de faculdade o Leo e eu nos afastamos. Eu tive que começar a fazer os meus estágios, então, em dois dias da semana eu trabalhava duas horas a menos na loja. Eu consegui tirar a carteira nas férias do meio do ano e podia oficialmente dirigir por São Paulo. Foi corrido, com muitas pessoas indo e vindo na minha vida, mas nenhuma foi importante o suficiente pra ficar.

No outro ano o Hugo já tinha terminado a faculdade e todos vieram pra formatura dele aqui. O apartamento ficou bem cheio, mas foi bom ter todo mundo por perto, mesmo que só por um final de semana. Ele agora tinha uma vaga fixa no jornal onde ele trabalhava, mas ele estava pensando em ir para o jornalismo televisivo, pra isso ele queria fazer uma especialização em outro país.

A formatura dele foi linda e a festa foi melhor ainda. Faziam anos que eu não me divertia tanto com a Bia. Acho que a última vez que realmente curtimos juntas foi no nosso aniversário de quinze anos. Na semana em que o Hugo tinha que arrumar as coisas dele, a Amanda veio ajudar e eu fiz questão de cair fora.

-Posso ficar aqui?

-Claro, mas por quê?

-O Hugo ta empacotando as coisas dele e a Amanda tá lá ajudando.

-Fica a vontade. O apartamento é do Tadeu, mas nós duas ficamos aqui.

-Cadê ele?

-Trabalhando.

-Hum.

-Você vai ficar tristinha assim quando ele for embora também?

-Não tô triste.

-É claro que tá. Olha só pra você.

-É que é meio difícil aceitar que ele vai morar longe. De novo.

-Você tá carente ou o que?

-Não é carência. Poxa, ele foi o meu melhor amigo por anos, foi o meu primeiro e único cara. Não é fácil ver que ele tá seguindo a vida com a Amanda e que tá cada vez mais difícil fazer parte da vida dele.

-Você vai mesmo deixar ele ir embora pra outro país sem ter falado o que você sente? Ainda mais com ela?

-Eu não posso fazer nada Carol.

-Porque não?

-Eu sou a vilã, lembra? O mocinho não fica com a vilã.

-Você pode ter sido a vilã da história dos dois ou em outras histórias Mia, mas na sua história você sempre vai ser a mocinha. Não deixa ele ir embora sem saber o que você sente. Você pode não ter outra oportunidade pra contar.

-Não adianta eu falar se só eu sinto essa coisa.

-Eu moro com vocês dois à três anos. Eu já vi o jeito que vocês se olham, e eu juro que só de olhar da pra ver que vocês foram feitos um pro outro.

-Não é tão simples assim.

-Então simplifica.

-Eu não posso.

-Por que não?

-Não posso pedir pra ele abrir mão da carreira dele por mim.

-Você ficou tão boazinha de repente.

-Não é que eu fiquei boazinha, é que eu tenho certeza que eu não faria isso por ele caso ele pedisse.

-Essa é você.

-Eu sei o quanto essa viagem é importante pra carreira dele e não vou ser eu que vou segurá-lo aqui.

-Você é quem sabe.

No dia em que ele foi embora eu me despedi em casa mesmo. Ele ia embora com a Amanda e não tinha mais ninguém da família por aqui, por isso, eu não tinha nada pra fazer no aeroporto. Ele me abraçou apertado. Foi a pior despedida.

-Vou sentir saudades Miranda.

-Também vou sentir sua falta Hugo.

-Cuida do apartamento por mim, e da Carol e da minha irmã e dos meus pais.

-Pode deixar.

-Você vai estar mais perto do que eu. Não esquece de estudar muito pra ser sempre a melhor aluna e me chama pra sua formatura.

-Tudo bem.

-Eu amo você. Se cuida.

-Eu também te amo Hugo.

Mais um abraço e dessa vez as costas. Eu tive que vê-lo indo embora e eu tenho certeza que essa cena ia ficar na minha cabeça por muito tempo. Naquela noite, e em todas as outras dali pra frente, eu dormi com a blusa que ele me deu. Na primeira semana ainda tinha o cheiro dele, mas depois eu precisei lavar e ela foi perdendo o cheiro e a cor. Era uma das lembranças que eu tinha dele. Eu nunca tirava a correntinha do pescoço e sempre que eu estava em um dia ruim eu lia um dos livros de Alice. Era como eu podia matar a saudade.

Me afundei nos estudos e no trabalho. Quando eu me sentia muito entediada eu combinava de sair com a Carol e o Tadeu e algum amigo dele. Acho que não tem nenhum que eu não tenha conversado, conhecido sido apresentada e beijado. Acontece que os dias eram muito corridos e quase não tinha tempo pra nada. Eu preferi só aproveitar de vez em quando do que firmar um compromisso que eu não pudesse levar a sério.

Nos últimos dois anos de faculdade eu tive que sair da Decorate pra trabalhar em uma empresa especializada em arquitetura e paisagismo. A Celina até falou que eu podia continuar na loja que ela daria um jeito de me dar algum dia livre pra fazer os estágios, mas estava ficando complicado conciliar todas as coisas ao mesmo tempo.

A Celina acabou virando uma amiga, mesmo ela sendo mais velha. Ela me ensinou muitas coisas no ramo de gerenciamento e administração voltados pra a arquitetura, decoração e paisagismo. Ela foi quase uma mãe pra mim aqui em São Paulo, principalmente nos dois últimos anos, me deu muita força pra continuar na faculdade e me ajudou a encontrar uma boa empresa para trabalhar.

A Celina tinha três filhos, e dois eram homens. Como eu passei muito tempo do trabalho com ela, e acabamos virando amigas, de vez em quando nós saímos juntas, e como ela era uma mãe mais moderna e jovem, algumas vezes os filhos dela iam junto. Eu me enrolei com um dos filhos dela, mas ele se mostrou grudento demais e não era o que eu queria. Depois de algum tempo eu conheci o outro filho e nós ficamos juntos por quase três meses, mas logo depois disso eu tive que ir trabalhar com arquitetura e o meu leque de opções se abriu de novo.

A minha formatura foi adiantada para dezembro e meus pais vieram me ver. Os pais da Bia ficaram em Belo Horizonte porque a Bia também estava se formando. O Eduardo tinha se formado no ano anterior, mas eu não achei que a minha presença fosse importante e por isso eu não fui. Meus pais ficaram a semana toda comigo me ajudando a resolver as coisas antes da formatura.

A Carol ia morar com o Tadeu e eu não podia pagar o aluguel do apartamento sozinha. Entreguei o apartamento que o Hugo tinha alugado e eu e a Carol tínhamos pago por dois anos e me mudei para um apartamento bem menor, mais barato e perto do meu trabalho. Eu aproveitei que estava de férias no trabalho para viajar pra Itália. Era o meu sonho conhecer aquele lugar. Depois da Itália passei pela França e Espanha. Foram os melhores trinta dias da minha vida.

Assim que eu voltei pra São Paulo trabalhei muito duro na empresa e acabei virando uma das arquitetas mais requisitadas. Minha mãe me fez a proposta de me juntar a ela e ao meu pai e termos o nosso projeto familiar, como ela gostava de chamar. Eu não descartei a ideia, mas disse que precisava trabalhar um pouco mais e fazer o meu nome em São Paulo pra só assim poder servir de alguma coisa para o projeto familiar.

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