Fomos assistir aos fogos da virada do ano na Lagoa da Pampulha. Nós nunca tínhamos ido antes e erámos loucos para ver os fogos de perto. Como nossos pais não gostavam muito de multidão nós fomos o mais próximo possível da hora da virada. Quando chegamos lá, a Lagoa já estava lotada e faltavam menos de 15 minutos para os fogos.
Quando estouraram os fogos de artifício foi bem bacana. Eu sei que foi um programa meio bobo, nada muito trabalhado, mas era a nossa primeira vez ali. Dez minutos de luzes coloridas explodindo no céu.
Dizem que traz sorte beijar a pessoa que você ama no minuto da virada, então, o que eu mais vi naqueles dez minutos foram casais se beijando por todo lado. Inclusive meus pais, meus tios, a Bia e o Eduardo e, é claro, o Hugo e a Amanda. Dessa vez não teve beijo pra mim. Ou o ano seria muito ruim ou a superstição estava errada. Mas não acho que em meio a tantos casais felizes, a solteirona aqui teria a sorte de não sofrer em algum momento.
-Feliz ano novo Miranda.
-Feliz ano novo Hugo.
No caminho de volta passamos pela casa da Amanda e do Eduardo para deixá-los em casa. Chegamos na casa dos meus tios por volta de uma da manhã e os mais velhos foram direto pra cama. Nós ficamos na sala assistindo algum filme de comédia que estava passando na TV. Bia e eu fomos as últimas a deitar. E eu fui a última a acordar no outro dia. Andei pela casa inteira procurando por todo mundo. Só o Hugo estava em casa.
-O que você tá fazendo?
-Oi, Miranda. Tô separando algumas coisas pra eu levar pra república.
-Você já vai pra lá?
-Não. Mas vou começar a levar as coisas que eu não tô usando aqui e vou precisar lá, tipo os cadernos novos, uma mesa para o computador, e uma cômoda pra eu colocar as minhas roupas.
-Você já vai levar as suas roupas também?
-Não todas de uma vez. Eu preciso de algumas roupas por aqui.
-Acho que você pode ficar pelado.
-Eu prefiro não arriscar isso. Não na frente dos meus pais, meus tios ou qualquer pessoa que não seja você.
-Onde a Amanda vai estudar?
-Na UFOP também.
-E vocês vão ficar na mesma república?
-Ainda não sabemos. Mas acho que não.
-Entendi. Você quer ajuda com as coisas?
-Vou querer sim. Você pode ir me passando as minhas roupas pra eu escolher as que eu vou levar de uma vez e quais eu vou deixar?
-Claro.
Ficamos desdobrando e dobrando roupas enquanto separávamos em duas pilhas: as que ele levaria e as que ficariam aqui por enquanto.
-Ah, eu me lembro dessa camisa.
- Você me deu no meu aniversário de quatorze anos.
-Ela ainda tá novinha.
-Eu só a usava pra ocasiões especiais.
-Eu achei que você gostaria mais dela. É uma blusa com o escudo das casas do Harry Potter, e é preta. Você amava preto.
-Eu amava essa blusa. Ainda amo. Mas ela tá ficando pequena.
-Também com esses braços que você está agora comparados aos que você tinha antes.
-Vou ter que dar para alguém. Você quer? Aposto que te serve.
Eu vesti a blusa que ficou grande em mim. Rodei e andei pelo quarto como se estivesse desfilando para ele.
-Ficou melhor em você do que em mim.
-Então agora é minha.
-À vontade.
-Quando você vai levar essas coisas?
-Semana que vem.
-Então por que tá arrumando tudo agora?
-Eu sou prevenido. Você sabe. E não sei como vai ser essa semana de férias já que a Amanda quer aproveitar o máximo de BH antes de ir embora.
- Entendi. Bom proveito pra vocês dois então.
-Valeu. – Fui em direção à porta do quarto. – Aonde você vai?
-Vou dar uma volta. Acho que já separamos tudo aqui não é?
-Já sim. Obrigada, Miranda.
-De nada.
Quando eu estava saindo vi a Amanda chegando. Talvez fosse hoje, ou talvez fosse lá em Ouro Preto, mas eu não acho que demoraria pra eles transarem. Eu estive com o Hugo, sei o quanto é bom beijar aquele garoto e o quanto ele é enlouquecedor dentro do quarto. Eu sabia o quanto foi enlouquecedor ter que esperar uma oportunidade para ter aquele corpo com o meu. Amanda era a namorada dele, provavelmente o mesmo efeito que ele tem em mim, também causa nela.
-Oi. O Hugo tá em casa?
-Tá sim. Pode entrar.
-Obrigada.
Eu andei sem saber pra onde eu ia. Só observando as casas da rua. Algumas crianças brincando na calçada, e umas senhoras sentadas no portão. Fui até a padaria da esquina e comprei um pacote de suspiros. Agora eu lembro o porquê gostava tanto desse doce. Eu sempre coloquei um inteiro na boca. Colocava um por um e esperava que derretesse sozinho. Aquilo era uma terapia.
Voltei e parei em frente a minha casa. A minha mesmo, não a dos meus tios. Peguei a chave no bolso do short e entrei. Minha casa ainda era a mesma, só que sem os móveis. Estava coberta de poeira, e estava fechada à muito tempo. Subi as escadas e entrei no meu quarto. Não era muito grande, mas era o meu quarto.
Meu guarda-roupa embutido ainda estava ali, só faltava minha cama, minha mesa, minha cadeira, meu puff, minhas almofadas e as minhas fotos. Abri todas as portas do guarda-roupa, abri a janela e me sentei no beiral por um tempo. Dava pra ver a rua toda, mesmo com uma árvore bem alta na frente da minha janela.
Eu amava aquela árvore. Ela tinha quase a minha idade. Meus pais e eu a plantamos em algum dia do meio ambiente por que era um dever de escola, e ela ficou ali até hoje. Quando eu era menor ficava imaginando como seria descer por ela ao invés de usar as escadas, mas eu nunca precisei usá-la como rota de fuga.
Passei por todos os cômodos da casa abrindo todos os armários e janelas. Queria que a casa tivesse ar puro, que ela voltasse a ser como era antes de irmos embora, mas pra isso, ela precisaria de uma bela limpeza.
-Você está aqui.
-Oi mãe.
-Seu pai e eu fizemos compras pra renovar a casa.
-O que você acha de pintarmos a casa antes que as mudanças cheguem na semana que vem?
-Mas eu gosto da cor que ela tem agora.
-Nós também. Mas já tem anos que essa casa é cor pudim.
-Nós precisamos renovar o ar da nossa casa.
-E que cor vocês escolheram?
-Creme de canela. É um cinza meio bege pastel. Não vai mudar muita coisa. Nossa casa vai continuar clara , mas vai ter uma corzinha diferente.
-Tudo bem.
-Nossa cor de destaque este ano é azul oceano.
-A gente sabe que nossa filhota prefere o azul do que rosa, então vamos deixar as paredes destacadas com azul.
-Vamos fazer menos paredes destacadas desta vez. Eu prometo. Uma para cada quarto, uma na sala e uma para o corredor de entrada.
-Prontas para começar?
-Nós vamos trocar de roupa antes, Estevão. Não quero ter que ficar tirando tinta de calça jeans. Assim que nós trocarmos: mãos à obra.
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A vilã
Fiksi RemajaToda história tem uma vilã. Certo? As vilãs também têm uma história por trás delas. Talvez não sejam vilãs porque querem, mas porque as pessoas as vejam assim. Sinto muito em dizer, mas essa não é a história de uma mocinha. Pelo menos não é o que a...