Capítulo 19

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Fomos assistir aos fogos da virada do ano na Lagoa da Pampulha. Nós nunca tínhamos ido antes e erámos loucos para ver os fogos de perto. Como nossos pais não gostavam muito de multidão nós fomos o mais próximo possível da hora da virada. Quando chegamos lá, a Lagoa já estava lotada e faltavam menos de 15 minutos para os fogos.

Quando estouraram os fogos de artifício foi bem bacana. Eu sei que foi um programa meio bobo, nada muito trabalhado, mas era a nossa primeira vez ali. Dez minutos de luzes coloridas explodindo no céu.

Dizem que traz sorte beijar a pessoa que você ama no minuto da virada, então, o que eu mais vi naqueles dez minutos foram casais se beijando por todo lado. Inclusive meus pais, meus tios, a Bia e o Eduardo e, é claro, o Hugo e a Amanda. Dessa vez não teve beijo pra mim. Ou o ano seria muito ruim ou a superstição estava errada. Mas não acho que em meio a tantos casais felizes, a solteirona aqui teria a sorte de não sofrer em algum momento.

-Feliz ano novo Miranda.

-Feliz ano novo Hugo.

No caminho de volta passamos pela casa da Amanda e do Eduardo para deixá-los em casa. Chegamos na casa dos meus tios por volta de uma da manhã e os mais velhos foram direto pra cama. Nós ficamos na sala assistindo algum filme de comédia que estava passando na TV. Bia e eu fomos as últimas a deitar. E eu fui a última a acordar no outro dia. Andei pela casa inteira procurando por todo mundo. Só o Hugo estava em casa.

-O que você tá fazendo?

-Oi, Miranda. Tô separando algumas coisas pra eu levar pra república.

-Você já vai pra lá?

-Não. Mas vou começar a levar as coisas que eu não tô usando aqui e vou precisar lá, tipo os cadernos novos, uma mesa para o computador, e uma cômoda pra eu colocar as minhas roupas.

-Você já vai levar as suas roupas também?

-Não todas de uma vez. Eu preciso de algumas roupas por aqui.

-Acho que você pode ficar pelado.

-Eu prefiro não arriscar isso. Não na frente dos meus pais, meus tios ou qualquer pessoa que não seja você.

-Onde a Amanda vai estudar?

-Na UFOP também.

-E vocês vão ficar na mesma república?

-Ainda não sabemos. Mas acho que não.

-Entendi. Você quer ajuda com as coisas?

-Vou querer sim. Você pode ir me passando as minhas roupas pra eu escolher as que eu vou levar de uma vez e quais eu vou deixar?

-Claro.

Ficamos desdobrando e dobrando roupas enquanto separávamos em duas pilhas: as que ele levaria e as que ficariam aqui por enquanto.

-Ah, eu me lembro dessa camisa.

- Você me deu no meu aniversário de quatorze anos.

-Ela ainda tá novinha.

-Eu só a usava pra ocasiões especiais.

-Eu achei que você gostaria mais dela. É uma blusa com o escudo das casas do Harry Potter, e é preta. Você amava preto.

-Eu amava essa blusa. Ainda amo. Mas ela tá ficando pequena.

-Também com esses braços que você está agora comparados aos que você tinha antes.

-Vou ter que dar para alguém. Você quer? Aposto que te serve.

Eu vesti a blusa que ficou grande em mim. Rodei e andei pelo quarto como se estivesse desfilando para ele.

-Ficou melhor em você do que em mim.

-Então agora é minha.

-À vontade.

-Quando você vai levar essas coisas?

-Semana que vem.

-Então por que tá arrumando tudo agora?

-Eu sou prevenido. Você sabe. E não sei como vai ser essa semana de férias já que a Amanda quer aproveitar o máximo de BH antes de ir embora.

- Entendi. Bom proveito pra vocês dois então.

-Valeu. – Fui em direção à porta do quarto. – Aonde você vai?

-Vou dar uma volta. Acho que já separamos tudo aqui não é?

-Já sim. Obrigada, Miranda.

-De nada.

Quando eu estava saindo vi a Amanda chegando. Talvez fosse hoje, ou talvez fosse lá em Ouro Preto, mas eu não acho que demoraria pra eles transarem. Eu estive com o Hugo, sei o quanto é bom beijar aquele garoto e o quanto ele é enlouquecedor dentro do quarto. Eu sabia o quanto foi enlouquecedor ter que esperar uma oportunidade para ter aquele corpo com o meu. Amanda era a namorada dele, provavelmente o mesmo efeito que ele tem em mim, também causa nela.

-Oi. O Hugo tá em casa?

-Tá sim. Pode entrar.

-Obrigada.

Eu andei sem saber pra onde eu ia. Só observando as casas da rua. Algumas crianças brincando na calçada, e umas senhoras sentadas no portão. Fui até a padaria da esquina e comprei um pacote de suspiros. Agora eu lembro o porquê gostava tanto desse doce. Eu sempre coloquei um inteiro na boca. Colocava um por um e esperava que derretesse sozinho. Aquilo era uma terapia.

Voltei e parei em frente a minha casa. A minha mesmo, não a dos meus tios. Peguei a chave no bolso do short e entrei. Minha casa ainda era a mesma, só que sem os móveis. Estava coberta de poeira, e estava fechada à muito tempo. Subi as escadas e entrei no meu quarto. Não era muito grande, mas era o meu quarto.

Meu guarda-roupa embutido ainda estava ali, só faltava minha cama, minha mesa, minha cadeira, meu puff, minhas almofadas e as minhas fotos. Abri todas as portas do guarda-roupa, abri a janela e me sentei no beiral por um tempo. Dava pra ver a rua toda, mesmo com uma árvore bem alta na frente da minha janela.

Eu amava aquela árvore. Ela tinha quase a minha idade. Meus pais e eu a plantamos em algum dia do meio ambiente por que era um dever de escola, e ela ficou ali até hoje. Quando eu era menor ficava imaginando como seria descer por ela ao invés de usar as escadas, mas eu nunca precisei usá-la como rota de fuga.

Passei por todos os cômodos da casa abrindo todos os armários e janelas. Queria que a casa tivesse ar puro, que ela voltasse a ser como era antes de irmos embora, mas pra isso, ela precisaria de uma bela limpeza.

-Você está aqui.

-Oi mãe.

-Seu pai e eu fizemos compras pra renovar a casa.

-O que você acha de pintarmos a casa antes que as mudanças cheguem na semana que vem?

-Mas eu gosto da cor que ela tem agora.

-Nós também. Mas já tem anos que essa casa é cor pudim.

-Nós precisamos renovar o ar da nossa casa.

-E que cor vocês escolheram?

-Creme de canela. É um cinza meio bege pastel. Não vai mudar muita coisa. Nossa casa vai continuar clara , mas vai ter uma corzinha diferente.

-Tudo bem.

-Nossa cor de destaque este ano é azul oceano.

-A gente sabe que nossa filhota prefere o azul do que rosa, então vamos deixar as paredes destacadas com azul.

-Vamos fazer menos paredes destacadas desta vez. Eu prometo. Uma para cada quarto, uma na sala e uma para o corredor de entrada.

-Prontas para começar?

-Nós vamos trocar de roupa antes, Estevão. Não quero ter que ficar tirando tinta de calça jeans. Assim que nós trocarmos: mãos à obra.

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