XXIV - A decisão necessária

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Chester levou as mãos à cabeça e gritou em desespero:

- O Rob está infetado!

A Clara chamou:

- Doutor!

Mike pediu, igualmente aflito:

- Dave, afasta-te deles! Afasta-te do Joe e do Rob! Vem para junto de nós. O que tem o Brad?

- Está com febre.

- Não, fica aí! – contrariou o Doutor, braço estendido, a avançar resoluto para a TARDIS. – Eu vou entrar na minha nave e nada, nem ninguém, me vai impedir de o fazer. Muito menos um simples fungo. Clara!

- Estou contigo. Estou mesmo atrás de ti.

O Doutor passou pelo meio do Joe e do Rob que tinham, entretanto, parado, imitando dois pilares de um portão imaginário. Mike arfava como um asmático, impressionado com o estado deplorável dos amigos. Chester gemia e mordia os nós dos dedos, com medo e com raiva.

Clara também passou entre o Joe e o Rob, saltitando, mas nem um, nem outro, tentaram atacá-la.

- Doutor?

- Regresso à TARDIS... tenho novos dados que preciso de analisar.

Ela olhou apoquentada para Dave que carregava nos braços um Brad suado e desmaiado. Olhou para as costas do DJ e do baterista, olhou também para Chester e Mike, ao fundo, lívidos e trémulos.

- E eles?

- Eles... eles, quem? – perguntou o Doutor confuso, agarrado à porta da nave, com o corpo já a entrar para o interior desta.

Clara exasperou-se.

- Eles, Doutor!!! Mike, Chester, Brad, Dave, Joe e Rob! Os Linkin Park! Dois estão infetados com o fungo, um está cheio de febre e os outros três estão esgotados.

- Ah! Daqui a pouco trago a solução para o nosso problema com esse maravilhoso fungo ladrão de som. Já sei como se chama! – exclamou, impante. – Os daleks cometeram um erro ao revelarem o nome do fungo e irei aproveitar-me disso para resolver esta trapalhada. Temos um espetáculo de música e um jogo de futebol para ver. E o universo para salvar.

Clara entrou na cabina telefónica, furiosa e desiludida, qual furacão exigente. Bufou e rangeu os dentes.

- Não os vais abandonar – ordenou, crispada. – Não os podemos deixar no meio da crise. Tu podes já ter encontrado uma solução, Doutor, mas quanto a mim, a situação é ainda mais desesperada e perigosa. O Mike parece que vai perder as estribeiras e ele é o mais sensato do grupo.

O Doutor lançava os óculos escuros para uma portinhola que abrira na consola da TARDIS. Acionou uma alavanca e voltou-se para ela, um punho na cintura.

- E também é o mais inteligente. Ele vai saber aguentar a crise.

- Aguentar... a... crise... Estamos a ir embora?! Estamos... vais abandoná-los? Pela segunda vez, Doutor! Vais deixá-los numa nave louca nas profundezas do espaço?

- Neste momento estou a tratar da minha ferramenta fundamental...

- O quê?

Uma plataforma ergueu-se por meio de um elevador hidráulico que ciciava à medida que subia, a partir da portinhola. Sobre esta estavam os óculos escuros. O Doutor colocou-os na cara e abriu um sorriso largo.

- Ah! Perfeito! – O sorriso torceu-se numa careta. – Oh, bolas... o meu histórico ficou todo gravado aqui. Hum, poderá ser um contratempo. Mas desde que não acedam ao histórico, creio que estará tudo bem...

- Doutor? O que estás a fazer? – perguntou Clara, desorientada.

O Doutor anunciou.

- A minha nova chave de fendas sónica que já não é uma chave de fendas. Estilo, minha querida Clara. Estilo! – E ajeitou os óculos sobre o nariz com os dedos indicadores.

- A tua chave de fendas sónica... é agora... são uns óculos escuros?

- Não os irei abandonar. Aos teus miúdos revoltados.

O Doutor rodeou a consola, agarrou-se às manivelas que comandavam a navegação da nave. Ligou interruptores, puxou um monitor para si, empurrou uma alavanca. A geringonça do teto girou e a nave começou a mover-se com o seu habitual som que indicava uma nova viagem.

Clara gritou:

- O quê? Não vais abandoná-los? É o que estás a fazer neste preciso instante, Doutor!!! Estamos em movimento. A TARDIS está em movimento!

Ele espreitou-a para além do monitor.

- Irei regressar.

- Poderás... poderás regressar? – Ela urrou. Apontou-lhe um dedo. – Para imediatamente a TARDIS e regressa agora mesmo. É uma ordem, Doutor! Eu quero ir para junto deles. Não vou ficar contigo, seu... seu... velho tonto e egoísta!

- Para quê o dramatismo? – desvalorizou ele com um encolher de ombros que foi bastante ofensivo. E prosseguiu, ignorando o desvario dela: – O fungo chama-se avaza. Agora compreendo por que razão a TARDIS não o conseguiu identificar numa primeira análise. A criatura avaza era um mito do povo Azkura, a primeira civilização que inventou a música no universo, há incontáveis milénios. Conta a lenda que os Azkura começaram a dividir-se em clãs, separados pelos sons que cada um criava e que em breve se tornaram incompatíveis. A música de um clã não podia ser escutada por outro clã. Como os Azkura desconheciam o significado da guerra, os clãs não entraram em conflito direto para se destruírem. Então... geraram os fungos avaza que se alimentavam do som inimigo. Cresciam e multiplicavam-se com a música que lhes era estranha, devoravam o clã adversário e depois passavam ao clã seguinte.

A respiração da Clara continuava alterada. O Doutor baixou uma segunda alavanca. As bandeiras vermelhas e amarelas penduradas no teto adejaram com o solavanco.

- Era apenas uma lenda, nunca se provou a existência do avaza. Compreendes, Clara? Era uma história que se contava às criancinhas, com a lição final de que não podemos criar algo que nos vai eventualmente destruir. O fim da lenda não é agradável. O fungo acabou por devorar o povo inteiro dos Azkura, terminando com os magníficos criadores da primeira música do universo.

- Doutor... e como é que eles vão ficar?... Os rapazes? Eles estão sozinhos, numa nave que está a ser comandada por daleks – choramingou ela. Teve de se agarrar ao gradeamento para não cair de joelhos, de tão fraca, triste e zangada se sentia. – Podemos chegar... tarde demais. Eu ajudei a matar... a destruir... os Linkin Park.

- Confio no Mike.

- Confias no Mike?!

- Ele é o líder do grupo.

- São daleks! O que pode o Mike fazer contra daleks? E contra esse fungo que se alimenta de som?

- Ele tem uma guitarra e vai usá-la. Já eu... destruí a minha para ir salvar-te.

- Isso significa o quê?!

Mais um solavanco e a nave parou.

- Chegámos! Esta é a última peça do quebra-cabeças e depois... a Terra será salva.

- Vais sacrificar os Linkin Park para isso?

O Doutor não respondeu. Colocou os óculos escuros, passou por ela, puxou-a pela mão. Abriu a porta da TARDIS e saíram para a rua. Clara não queria acreditar no que os seus olhos viam. Teve de abrir e fechar as pálpebras várias vezes para se certificar de que não estava a sonhar, ou a ter uma alucinação. Apoiou-se no Doutor para não cair.

- Voltámos... a Milton Keynes?

- E vamos assistir ao espetáculo dos Linkin Park. Acho que é por ali que temos de apanhar o autocarro para o anfiteatro. Vamos, Clara!

O Mágico e Os Ladrões de SomOnde histórias criam vida. Descubra agora