A tua vara e o teu cajado me consolam.

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Irene imaginou que a saída ao shopping seria tranquila quando o horário disponível para Jennie e Yeri era relativamente cedo, de modo que a sessão do filme acabara pouco depois das seis. Um excelente horário, já que não havia muitas crianças chorando e atrapalhando a sessão, nem muitos adolescentes e jovens como elas que também não sabiam parar quietos durante o filme. Este que fora bom, também. Irene não costumava ser muito fã de filmes de super-heróis e tudo mais, mas aquele fora interessante, também por não ter tido visto muitos filmes de super-heroínas por aí desde que assistira Mulher Maravilha com a mãe.

E bem, Irene Bae podia ser conservadora demais para a sua idade em aspectos demais, mas ver uma mulher descendo a porrada em todo mundo na telona era muito satisfatório. Irene não necessariamente precisava concordar com cem porcento da doutrinação, não? Bem, havia discussões até mesmo entre os estudiosos dos escritos, certo? Irene ainda tinha uma consciência de classe, ainda mais presenciando as situações e fofocas pelas quais sua mãe tinha que passar.

O shopping não estava muito cheio quando chegaram, ao contrário da hora em que saíram do cinema e se depararam com a praça de alimentação borbulhando com o falatório da multidão, e barulho incomodava Irene Bae, de modo que ela não conseguiu conter a careta de desagrado, também causada pela diferença de iluminação entre sala escura e o brilho de tantos letreiros de lanchonetes diferentes.

- E então, o que acharam? – Jennie perguntou enquanto caminhavam tranquilamente pela praça de alimentação, naquela sensação de letargia pós-filme e banquete de pipocas extremamente amanteigadas.

- Muito que bom. Eu vi as reviews e confesso que estava até com as expectativas baixas, mas nada me surpreende o povo da internet ser chato. – Yeri iniciou com o seu review. – Mas, oh, eu fui a única ou vocês também sentiram a tensão sexual entre Carol Danvers e a Maria Rambeau?

- Ah, que bom que eu não fui a única. Ou foi de propósito, ou eu quero saber que tipo de amizade os roteiristas têm com os seus amigos, porque, olha... – Jennie concordou com Yeri na mesma hora e Irene ergueu uma sobrancelha para Yeri, como se a questionasse por saber e falar em voz altas daquelas coisas. Imagina, um bebê daquele!

- É, eu também achei meio suspeito. – Irene também deu sua opinião, de nariz torcido. – Mas, ai, por que tudo é sobre isso hoje em dia? Tudo tem que ter gay, mesmo? Eu vou assistir algo na Netflix, tem gay. Vou assistir algo no cinema, tem gay. Vou assistir novela, tem gay. Até em comercial de margarina tem gay!

- Ué, normal. Até na escola é cheio de gay. – Yeri deu de ombros e Jennie riu ao concordar. – Só está mais realístico, mas eu entendo seu ponto.

- Mas é ficção, não precisa ser igual a vida real. – Irene respondeu como se fosse óbvio. – Imagina a menininha que vai ver o filme no cinema, se identifica com a Capitã Marvel... Você sabe como é criança, eles saem do filme querendo ser super-heróis.

- Crianças? Eu estou querendo ser sequestrada por alienígenas agora mesmo. – Jennie comentou, com humor.

- Então! Imagina a criança de dez anos! Vai crescer achando que gostar de mulher vem no pacote! – A fala da Kim só pareceu fundamentar o argumento da Bae para enchê-la ainda mais de certeza.

- Então essa criança é muito fraca da cabeça. – Yeri rebateu e fez questão de se explicar ao ver a carranca de Irene direcionada a si. – Quero dizer, quando eu era pequena e via uma sapatão eu só corria mais rápido do que hoje elas correm do Gustavo Lima. – A justificativa da mais nova foi suficiente para arrancar uma risada até de Irene.

- Mas é diferente, hoje em dia parece que ser gay virou legal? – Aquilo era tão questionável para Irene que ela não conseguiu evitar que sua fala soasse como uma pergunta. – Olhem só. Ali, ali e ali... E aquela outra também! – Como evidência para sua tese, Irene apontou para quatro lanchonetes aleatórias, cada uma delas com uma representação diferente das cores do arco-íris. – Está tudo invertido, as crianças crescem com o pensamento todo errado agora!

Livrai-nos do mal, amém!Onde histórias criam vida. Descubra agora