Bᴀʀ

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❝Tudo é mais bonito porque estamos fadados ao fracasso. Você nunca será mais belo do que é agora. Jamais estaremos aqui novamente. ❞

Cᴀᴘɪ́ᴛᴜʟᴏ 12

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Nova York, 30 de março de 2018.

A fim de não levantar qualquer suspeita sobre a razão pela qual o carro de Ari Gandhi estava em frente ao edifício de Lin para aqueles que o reconheciam, ambos apenas decidiram encontrarem-se no bar. Ari tinha-lhe enviado o endereço através de uma mensagem, e o homem não podia negar que estava ainda mais desencorajado quando percebeu que era parcialmente longe de onde morava.

Sem dúvida que ele chegaria lá em cerca de vinte minutos pela sua forma apressada de andar, mas ele não tinha qualquer desejo de fazer isso. Embora já não fosse o auge do Inverno, o frio ainda se prolongava, e quanto mais tarde ficava, mais insuportável o clima se tornava.

Apesar de preferir o frio ao calor, tinha de admitir que era muito mais fácil andar por aí apenas com uma camiseta do que com inúmeros casacos e ainda sentir frio, para não mencionar tremer todo o caminho. Era desconfortável e irritante. Mas gostava das paisagens que a neve formava, eram as mais bonitas para pintar. Os lençóis brancos cobrindo tudo, desde a mais insignificante das flores até a mais grandiosa das árvores. Ninguém escapava do seu abraço gélido, muitas vezes mortal.

Se entrasse no seu ateliê e recolhesse as suas telas, pelo menos três delas teriam a neve como ponto principal. Gostava do mistério que ela trazia, do aconchego que só poderia ter-se se ficasse à frente de uma lareira. Mas também evidenciava a destruição que trazia, o quanto a sua aproximação frígida era capaz de ceifar a vida de vários seres. A neve era uma incógnita. Uma beleza mortífera.

De qualquer modo, quando acabou de tentar parecer pelo menos ligeiramente agradável aos olhos de um modelo, saiu para a sua aventura gelada em direção ao bar. Não era como se se estivesse a se arrumar especificamente para Ari, mas por vezes reconhecia como era caótico. Só tinha arrumado um pouco o cabelo, tentando reduzir o volume e controlar as pontas que por vezes saíam de órbita.

Sabia que precisava cortá-lo, mas era como se aquele cabelo bagunçado e até os ombros tivessem uma vida própria e o influenciasse a deixá-lo exatamente como estava. Não era como se ele não gostasse, pois em toda a sua vida não se lembrava de um único momento em que o seu cabelo era curto por opção. Sempre estava tocando o seu pescoço ou os seus ombros, nunca menos do que isso.

Durante algum tempo, até chegar à adolescência, ele podia admitir que as outras crianças zombavam de si pela sua forma delicada, por assim dizer, de lidar com as coisas, para não mencionar a sua natureza extremamente retraída. Os piores da sua classe tentava intimidá-lo dizendo como gostaria de parecer uma garota pelo seu cabelo comprido, mas não se importava muito com isso. Afinal, não via tais sentenças como uma ofensa. Qual o problema se quisesse ter uma aparência feminina? Não via mal algum nisso.

Enquanto caminhava pelas ruas de Nova York, estes pensamentos e memórias rodeavam a sua mente. Sem dúvida, se pudesse escolher um lugar amaldiçoado na maior parte da sua vida, seria a escola. Claro que houve bons momentos, por exemplo, quando fez uma amizade com Raihan no Ensino Médio, mas até lá podia contar com os dedos as coisas boas.

O seu irmão, Cheng, tinha estado sempre ao seu lado. Mas, por ser dois anos mais velho - mesmo que não parecesse muito -, às vezes surgiam conflitos de interesses e principalmente de amizades. Lembrava-se que os amigos do seu irmão não gostavam da sua presença porque estava sempre calado, e quando se atrevia a falar, ficava nervoso e trocava as palavras.

Quando as Luzes se ApagamOnde histórias criam vida. Descubra agora