Nᴇɪʟ

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❝A dor que eu não exponho ao mundo constrói uma casa no meu interior. ❞

- Olivia Gatwood

Cᴀᴘɪ́ᴛᴜʟᴏ 10

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Nova York, 24 de julho de 2014.

Lin não conseguia conter a sua animação ao relembrar-se que havia conseguido contactar Ari Gandhi para que se fizesse presente outra vez numa das suas exposições, em razão de querer falar com o próprio. Cheng, pelo contrário, diferente do seu humor habitual, tinha um pouco de medo da ideia, avisando-o de que nem sempre o que uma pessoa expõe nos meios da mídia é o que realmente é.

Mas Lin não se importava muito com isso. Só queria falar cara a cara com ele, dizer o quanto admirava a sua forma de trabalhar e como as suas fotografias eram sempre impecáveis. Como as suas expressões entregavam sempre tudo o que a fotografia exigia. Queria apenas mostrar um pouco do seu apreço, se é que poderia dizer dessa forma.

De qualquer modo, ele já estava bem arrumado e psicologicamente preparado para falar durante horas e horas sem mostrar fadiga.

Olhou-se uma última vez no espelho. Tornava-se uma pessoa completamente diferente a partir do momento que se transformava em He. O seu jeito atrapalhado de falar se tornava elegante e formal, sem demonstrar um pingo de incerteza ou ansiedade na sua fala. A postura não era de superioridade, mas também não se comparava à forma que se portava quando era ele mesmo nas ruas de Nova York, sempre buscando mesclar-se com a multidão, sempre querendo se esconder de todos.

O seu cabelo, que era sempre uma enorme confusão, estava agora devidamente arrumado, com apenas alguns fios a cair na sua testa, que em breve seria coberta - bem como seu rosto todo - pela máscara preta. As suas olheiras não se faziam mais presente na sua face, nem mesmo a pinta reconhecível em cima da sua boca era visível. Lin sumia no mesmo instante que colocava aquela máscara.

As roupas, que normalmente eram a primeira coisa boa que via no guarda-roupa, na ocasião haviam sido escolhidas a dedo. Uma camiseta de mangas longas e um pouco justa de cor azulada entrava em harmonia com uma calça social e sapatos amarronzados, tão brilhantes quanto o sorriso que dispunha na face como se fosse um acessório.

Ajeitou as suas roupas uma última vez antes de enfim sair da sala onde estava e encontrar-se com o público. Em sua maioria, críticos de arte, que eram em grande parte homens franzinos de meia-idade que provavelmente nunca tiveram um amor para chamar de seu em toda a vida. Lin temia tornar-se um deles algum dia.

Ela saudou-os com um breve sorriso e começou a sua breve explicação e imersão para cada uma das pinturas ali expostas. Claro que, a dada altura, algumas pessoas fizeram-lhe perguntas extremamente pessoais, deixando-o ligeiramente desconfortável, mas tentava progredir da melhor maneira que encontrava, da melhor maneira que He encontrava.

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Não sabia quanto tempo tinha passado, mas quando finalmente teve um momento a sós com os seus pensamentos, afastou-se da multidão e respirou fundo, ficando perto de um bebedouro, logo pegando um copo e servindo-se de uma água gelada que lhe aliviaria um pouco da dor que sentia na garganta por falar tanto. Levantou um pouco a máscara para que a tarefa fosse mais bem sucedida e, quando terminou, jogou o copo no lixo que havia ao lado, direcionando o seu olhar para a rua.

Quando as Luzes se ApagamOnde histórias criam vida. Descubra agora