04:04 - Checagem

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[Manhã de sábado, 18 de fevereiro]

- Irene?

Ele a chamou uns bons dez minutos depois. Ela demorou a atender, seus olhos e sua concentração ainda absolutamente voltados para a lâmina em suas mãos. A espada estava afiada, como ela havia suposto antes mesmo de empunhar a bainha, mas em sua cabeça não fazia mal algum um cuidado a mais. E o mesmo valia para todas as outras armas naquele cofre.

Nos minutos seguintes, enquanto Wooyoung percorria a casa verificando todos os aparatos de segurança disponíveis e dava seus pequenos ajustes àquilo que julgava necessitar de algum reparo, dedicou-se a afiar e polir o arsenal recém descoberto. Retirou as caixas com cuidado, ajeitando-as no carpete e sobre a mesinha de centro, sentando-se no chão e relaxando a postura enquanto se dedicava ao trabalho. Encontrara uma pedra de amolar na cozinha e lixas de metal no mesmo armário onde ficavam os utensílios de limpeza, e concluiu que seriam suficientes para o que iria fazer. Começou com as estrelas e adagas, menores e mais delicadas, elevando o tamanho e o nível de periculosidade dos itens conforme progredia. Naquele momento, afiando sua espada, estava consciente do deus a alguns poucos metros dela, verificando o último canto da casa: seu quarto. Deixara-o ir sem nem mesmo pensar a respeito, convencida de que não havia nada naquelas gavetas e armários que pudessem impedir sua vistoria, ocupada demais com seu mais recente entretenimento para oferecer mais do que alguns poucos resmungos quando perguntou se ela tinha certeza de que ele poderia verificar cada ínfimo objeto.

De tão absorta, mal notou a presença de Yuta em seus pensamentos, e não teria despertado para esse fato tão cedo, não fosse o chamado repentino e a seu ver incômodo. Estava quase terminando com o penúltimo gládio...

- Estou aqui. - respondeu, utilizando a voz de sua consciência. Wooyoung estava cômodos adiante. Ela tinha certeza de que ouviria mesmo a mais breve das palavras ditas em voz alta. Por outro lado, não era como se utilizar a ponte fosse garantir total sigilo de sua conversa, graças à habilidade especial dele. Convenceu-se de que era apenas fruto do hábito que inconscientemente criara, uma fração de segundo antes de Yuta tomar a fala mais uma vez.

- Quero aproveitar esse incomum momento de calmaria ao seu redor para testar uma coisa. - começou, tão tranquilamente como sempre se pronunciava. Quase podia visualizar a si mesma utilizando o mesmo tom para convidar um dos outros legionários para uma disputa na Arena, sem nenhum outro objetivo além de fazer passar o tempo em uma escaldante tarde de sábado. - É um recurso para o qual não tive a oportunidade de fazer uma análise presencial. Contudo, dada a situação em que estamos, não será nenhum problema que o primeiro uso seja em planos diferentes. Ao contrário, penso que ajudaria a determinar com maior precisão eventuais ajustes que necessitem ser feitos. - tagarelou, metade de suas palavras se perdendo na mente de Irene antes que pudesse compreender a coisa como um todo.

- O que preciso fazer? - questionou, pousando a espada com polimento incompleto sobre a mesa, recostando-se melhor na base do estofado.

- Quero que feche os olhos, e então imagine um túnel longo e escuro. - ditou, sem a menor das alterações na voz.  - Estou falando sério. - acrescentou, quando percebeu que ela não falava ou se movia, e muito menos seguia as instruções. A desconfiança martelava sua nuca, mas ela decidiu agarrar-se a um tímido fragmento de confiança que nascera em um canto afastado de si com relação aos pedidos sempre incompreensíveis e audaciosos de Yuta. Fechou os olhos, vestígios da claridade que invadia o cômodo penetrando suas pálpebras até que ela se concentrasse apenas no mais profundo breu. Pensou nas sombras como matéria maleável, moldando-as até assumirem a forma de um túnel, conforme pedido. - Agora, imagine a si mesma percorrendo esse túnel. Pode tocar uma das paredes para se guiar, se quiser.

Angels - SeulreneOnde histórias criam vida. Descubra agora