08:05 - Extremos opostos

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[Madrugada de sábado, 04 de março.]

Muito depois da partida de Irene, Seulgi ainda se encontrava elétrica e ansiosa.

Tinha se fechado em seu quarto e apagado as luzes, exceto a do banheiro. Pela porta aberta, uma cascata de luz branca derramava-se para fora. À exceção dos sapatos e do casaco, que jazia embolado sobre sua cama, desde o momento em que abrira a porta, mais cedo, ainda não tinha retirado nenhuma peça de roupa. E tampouco achou que o faria, durante algum tempo.

Era um tipo bom de ansiedade, esse que percorria seu corpo. Seulgi nem sabia que uma coisa assim existia, mas ali estava: braços eriçados, interior inquieto, uma vontade crescente de calçar seus tênis mais confortáveis e perambular pela cidade inteira, sem destino.

Ela já estava fazendo isso, dentro daquelas paredes. Indo e voltando, em círculos ao redor do tapete, estudando cada centímetro do piso com suas solas nuas. Seu cabelo estava solto, mas a agonia que normalmente sentia, do contato dos fios contra sua pele úmida de suor, não estava presente. Aquela frestinha da janela estava aberta, e o fio de vento que corria pelo interior lhe parecia, curiosamente, mais forte que um vendaval. Ou quem sabe era só a bebida começando a fazer efeito.

Trocou os pés, pelo tapete. Jogou-se de costas sobre a cama, afundando na bagunça que era seu colchão, sob a camuflagem de uma coberta maior, esticada sobre os travesseiros. Foi como aterrissar numa nuvem. Moveu-se para lá e pra cá.

Seus pensamentos fervilhavam.

Inconscientemente, levou as mãos aos lábios.

Que loucura ela tinha feito? Que outras coisas insanas ela teria feito, se Irene não a tivesse afastado? A lacuna estava ali, para ser preenchida. Não conseguia responder, não conseguia... As alternativas tinham ido embora, juntamente com o momento.

Ela tinha novas ideias, agora. Um mundo delas, nascendo e morrendo, e se renovando, e formando planos completos, e fragmentos de possibilidades que se estendiam diante de seus olhos. Seulgi ainda tocava os lábios. Pensou que podia sentir a carne formigar, num resquício da eletricidade que perpassou todo o seu corpo naquele momento.

Pensou no brilho um tanto triste nos olhos de Irene, quando ela se despediu.

Tinha, de modo infantil e esperançoso... esperançoso demais para os seus padrões... esperado um desfecho diferente para aquela noite. Não sabia exatamente o que esperava, mas não conseguiu evitar ficar chateada por ela ter que ir tão cedo. A realidade, colocada lado a lado com seus novos sonhos, tendia a ser decepcionante.

Por outro ângulo, contradizendo totalmente o primeiro sentimento, estava aliviada. É melhor que ela vá, antes que eu faça alguma besteira e estrague tudo. Se é que já não estraguei, mais cedo...

Quando Irene passou pela porta, a ficha começou a cair. Seulgi ficou ali, com a imagem dela dentro do seu quarto — aquelas quatro paredes, teto e piso que ousava considerar seus, sua ilha de segurança em um mar revolto. Nunca tinha imaginado uma cena meramente parecida, e surpreendeu-se em descobrir que ambos... Irene e o quarto... pareciam combinar.

Quem sabe, porque Seulgi também se sentia segura perto de Irene. O álcool deve estar se espalhando mais rapidamente, agora.

Acompanhou seus passos, até perdê-la, em algum ponto do corredor. Fechou os olhos, fazendo de conta que podia vê-la descer as escadas, contornar o pilar na base dos degraus, cruzar a diminuta sala. Seu irmão ainda devia estar por ali. Ela só podia torcer a todos os deuses para que Jin tivesse ao menos o bom senso de calar a boca, agora que ela não estava por perto, para ser seu alvo.

Angels - SeulreneOnde histórias criam vida. Descubra agora