10:03 - Mozart

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[AVISO: O texto a seguir possui cenas de intimidação que podem causar gatilho em algumas pessoas. Caso esteja desconfortável com as descrições, sinta-se livre para pular o capítulo.]
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[Madrugada de sábado, 18 de fevereiro]

Irene fez seu máximo para não deixar o pânico aflorar sob sua pele, por mais complicada que fosse a situação.

Era uma guerreira treinada, com décadas de experiência em batalha e estratégia, mas diante de um inimigo invisível e desconhecido não havia muito que seu treinamento pudesse fazer por si. Seus olhos varriam o escuro, o breu não a deixando distinguir nem mesmo os móveis que tinha por tão familiares naqueles poucos dias no apartamento. Tudo que havia diante de si era o escuro, mas sabia perfeitamente que não poderia se deixar convencer pela aparente calmaria do recinto. Seus batimentos aos poucos voltaram ao normal, suas costelas castigadas pela intensa frequência anterior emitindo um protesto registrado como uma tímida pontada de dor, que logo tratou de ignorar.

- Concentre -se, Irene. - o sussurro tinha a intenção de soar apático, mas não se sentia capaz de criticá-lo por perder um pouco do rígido controle sobre suas emoções, quando ela própria estava bem perto de ter suas rédeas roubadas pela adrenalina, mais uma vez. - Inspire mais profundamente. Solte o ar devagar. Fique o mais imóvel que puder...

As instruções de Yuta sobre não se mover bruscamente ou falar continuavam, a voz morna lhe dizendo a todo tempo que não denunciasse seu novo status. Quem quer (ou o que quer) que estivesse ali, não precisava saber que ela estava acordada. Relutou por um segundo, mas por fim fechou os olhos, convencendo-se em silêncio que sua visão não poderia fazer mais por ela do que aquilo que já estava obtendo como respostas. Ouvira o que Dami dissera sobre seus gráficos estarem fora do funcionamento adequado, imediatamente deduzindo que se assim o era então o próprio autômato deveria estar fora de controle. Pela ligação telepática, conseguia captar vestígios da movimentação do trio no Magnum, ordens sendo ditas e comandos sendo executados numa velocidade tal que mal conseguia acompanhar. Mas sabia perfeitamente o que estavam tentando fazer. E para que desse certo, precisava ganhar algum tempo.

Conservou imobilidade total, controlando sua respiração para permanecer lenta e profunda como haveria de ser se ainda estivesse envolta pelo sono. Maldisse mentalmente o cansaço do dia anterior por fazê-la tão exausta a ponto de apagar por completo; se fosse em outro momento, se estivesse com seu próprio corpo e com seus próprios reflexos não teria sido pega tão facilmente. Maldisse a andança das últimas tardes e cada uma das pessoas que entrevistou, por terem feito-a desperdiçar tempo e energia. Maldisse a si mesma por ser tão ingênua e não pensar que algo daquela magnitude poderia acontecer; não era como se dormisse todos os dias no Ginasium esperando acordar com intrusos no dormitório, no entanto isso não a impedira de ponderar sobre a possibilidade alguns pares de vezes, e sabia que deveria ter seguido a mesma linha ali, onde os números falavam mais expressivamente. Mas aquele não era momento para se lamentar ou despejar maldições sobre os fatos que a tinham levado até a Terra ou os atos que fizera desde que pusera seus pés no planeta, porque no final das contas eles tinham sido necessários em prol de um bem maior.

A Caixa de Pandora precisava ser encontrada não importava o sacrifício que tivesse de fazer, haviam dito. O desaparecimento de Jongin a levara a reconsiderar essa frase, avaliar novamente a penitência que sugeria que era precisa para que o objeto fosse reavido, e chegara à conclusão de que alguns preços eram demais. Ali, no momento em que sua própria vida poderia estar correndo risco, a depender da natureza e das intenções da criatura oculta no escuro de seu quarto, passou-lhe pela mente que os Olimpianos não deveriam ter a menor ideia de que como era essa sensação.

Angels - SeulreneOnde histórias criam vida. Descubra agora