[Tarde de domingo, 12 de fevereiro. 12:00]
Irene bem que tentou agir como uma pessoa normal nos momentos que se seguiram. Para sua infelicidade, ela não poderia sequer mentir para si mesma dizendo que havia tido êxito.
Apesar de seus esforços para manter em mente a postura de alguém recém chegado e teoricamente ignorante a respeito mesmo dos aspectos mais básicos de uma nova cidade, a ansiedade de estar cada vez mais próxima de respostas se impusera e vencera a queda de braço. Desceram do ônibus sem uma única palavra, dirigindo-se ambas em silêncio para o endereço; a mente da Bae tentou manter-se focada em coordenar seus movimentos, alinhar os passos para que estabelecesse um ritmo semelhante ao ditado pela morena e conservar uma distância tida como a ideal entre duas pessoas que não mantém nenhum laço de intimidade, como era a situação em questão - mas com dois minutos de caminhada, esqueceu-se totalmente do protocolo tecido para si mesma.
Seus pensamentos, vazios de outras vozes que não a sua própria, estavam simplesmente alucinados. Cada passo dado rumo à lanchonete significava alguns centímetros a menos para respostas das questões que tanto haviam revolvido seu interior. Aquele que não se sentisse ansioso em uma situação semelhante, que lhe atirasse a primeira pedra. Mas tinha de reconhecer que talvez exagerara um pouquinho em perder as rédeas.
Não viu o momento exato da mudança, mas de um instante para o outro tomou a dianteira. Seus pés moviam-se de maneira quase inconsciente, fazendo-a deslizar com velocidade por entre os corpos que passavam por si. Passou à frente da morena, esquecendo-se completamente de que supostamente estava sendo guiada, somente percebendo o que havia feito quando a mesma correu para lhe alcançar. Desvencilhou-se com uma série de desculpas esfarrapadas, sorrindo amarelo e reduzindo seu ritmo de caminhada bruscamente. O aroma adocicado peculiar que se elevava da figura pouco mais alta do que ela própria chegou até suas narinas quando se aproximou, o sinal verde para os carros tornando-se amarelo e então vermelho. Uma centelha de curiosidade se acendeu em seu interior, mais profunda do que quando a havia mantido estática na noite anterior; o esbarrão devia ter atingido algo mais do que seu corpo, porque não havia a menor possibilidade de que houvesse deixado aquele detalhe passar, ao menos não em suas condições normais. Não conseguia descrever exatamente o que sentia... não se parecia com um perfume, uma colônia barata ou essência de qualquer espécie... mas algo em seu subconsciente dizia-lhe com firmeza que conhecia aquela sensação... conhecia aquele cheiro de algum lugar.
- É ali. - indicou, quando as primeiras pessoas ao redor se moveram, avançando para a faixa de pedestres. Desviou sua atenção da mulher ao seu lado, seus olhos seguindo até o outro lado da avenida, parando sobre o letreiro da lanchonete. As luzes estavam parcialmente acesas, tanto na fachada quanto no interior, e pelo que pode apurar havia pouca movimentação entre as mesas; deduziu que ainda faltavam alguns minutos para o início do horário de almoço, exatamente de acordo com os cálculos que havia feito previamente. Se não estivesse enganada, teria pelo menos tempo para revisar sua história e escolher uma mesa adequada para a longa conversa que precisava ter com Solar.
A morena avançou, dando três passos na faixa de pedestres antes de perceber que Irene não a seguia. Voltou-se para si, os fios escuros caindo um pouco mais sobre seus ombros, olhos castanhos escuros pousando confusos sobre os seus. Piscou, balançando suavemente a cabeça antes de segui-la em direção ao seu acerto de contas.
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A sineta soou, quando a porta foi aberta, anunciando para quem quer que estivesse ali a sua entrada. Sob seus pés, o piso encerado tinha ares de escorregadio, e Irene logo tratou de fazer uma nota mental sobre andar com cuidado; a desconsiderar isso, o restante não lhe parecia nem mesmo potencialmente perigoso. Contou quinze mesas distribuídas ao longo do salão, dois pares de cadeiras em todas elas. O ar condicionado configurado na casa dos vinte graus dava ao ambiente uma atmosfera agradável e propícia para que o cheiro de frituras vindo da cozinha se espalhasse de uma maneira que não era nem enjoativa e tampouco imperceptível; por trás do balcão, à alguns metros de si, conseguiu ver de relance uma figura deslizando por entre armários e chapas quentes, o uniforme em vermelho e amarelo um verdadeiro atentado para seus globos oculares de tão chamativo.
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Angels - Seulrene
Fanfic"Há mais coisas entre céus e terra do que os olhos humanos podem ver." Quando dois mundos ameaçam entrar num conflito sangrento e absurdamente desigual para um dos lados, o mais frágil, e a ameaça de uma tragédia em proporções absurdas surge no hori...