CAPÍTULO 29

6.8K 846 434
                                    

Estou cutucando minha panqueca com um sorriso fácil no rosto. Os cantos da minha boca simplesmente se esticam sem a minha permissão enquanto relembro a confissão de Hardy pela milionésima vez só esta manhã. Meu rosto provavelmente está brilhando mais que um maldito farol no meio da noite. Mamãe já perguntou três vezes enquanto tomava café a razão da minha felicidade repentina, e eu tive que dar uma resposta pouco confiável sobre a aproximação das inscrições para a faculdade, fingindo que a possibilidade de ir morar em outro estado completamente sozinha não me deixa apavorada.

— Você tem algo a dizer que eu deva saber? — questiona vovô, e eu me torno consciente de sua presença na outra ponta da mesa. — Especialmente sobre um certo garoto. Você sabe: alto, olhos marcantes, bonito, cheio de zeros na conta bancária.

Engato meu olhar mais indiferente e respondo entre uma garfada e outra:

— Não sei sobre o que você está falando.

Ele arqueia as sobrancelhas ralas, buscando nos meus olhos o rastro da mentira.

— Que engraçado. Ela não sabe.

Ele vem até mim e se senta na cadeira ao meu lado, olhando em direção à sala para checar se meus pais não estão próximos o bastante para ouvir nossa conversa secreta. Eles estão ocupados discutindo sobre as recentes notas ruins de Miles. Não quero nem imaginar quando chegar a minha vez de entrar na berlinda.

— Ofereço vinte dólares pela informação privilegiada. Agora me diga: o que está rolando entre vocês? É passional? Comercial? Amizade sincera? Você tem arritmia cardíaca? Se sim, com que frequência?

— Vinte? Nunca pensei que você seria tão mesquinho com uma exclusiva. — Tento mudar o foco do assunto, mas ele sabe o que estou fazendo.

— E eu não achei que você seria capaz de extorquir seu avô.

Solto meu garfo, que tilinta contra o prato.

— Ora, vamos lá. Não se faça de vítima quando foi você quem me ensinou a não ter misericórdia numa negociação.

Vovô suspira em contrapartida.

— Esse é o problema. Você aprendeu bem demais.

Ele enfia a mão no bolso da calça e vasculha por um tempo, depois coloca a palma fechada na minha frente. Quando eu era criança, este era meu jogo da sorte favorito: descobrir o que vovô guardava em seu bolso mágico. Havia dias em que eu podia lucrar muito dinheiro e algumas balas de caramelo, e dias em que ele só pescava um mísero centavo de lá.

— Aqui está. — Vovô abre a palma da mão e começa a listar o que encontrou: — Trinta dólares, dez centavos…

Nós dois fazemos careta para o próximo item: um bilhete expirado para um show de valsa em companhia da terceira idade. Ele o amassa e guarda novamente.

— E, por último, uma deliciosa bala de hortelã.

Eu torço o nariz para a guloseima com aspecto envelhecido.

— Há quanto tempo esta bala está aí?

— Querida, acredite quando digo, você não vai querer descobrir.

Meu celular vibra no bolso da calça. Eu o puxo e desbloqueio a tela, arregalando os olhos para a mensagem de Hardy que brilha na barra de notificações:

Estou esperando. Saia se estiver pronta.

Oh, merda. Ele não me avisou que viria.

Imediatamente agarro a mão do vovô.

Contando Até DezOnde histórias criam vida. Descubra agora