CAPÍTULO 1

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❝Eu sei. Em minha mente, entendo que a vi pela primeira vez a dez minutos, mas meu coração a conhece desde sempre. E minha alma também.❞ — Julia Quinn, Mais Lindo que a Lua.

Há verdades universais que precisam ser destacadas:

Todo mundo morre;

A terra é redonda;

Gwendolyn odeia Hardy.

Você tem energia para odiar um determinado número de coisas durante toda a vida. É quase científico. E a figura aparentemente inofensiva de um garoto foi uma das coisas que escolhi para empregar meu desprezo.

Talvez tenhamos sido inimigos na vida passada. Talvez ele tenha sido traidor do trono quando eu era o rei.

Por causa dele, embora eu não goste de lembrar do que marquei como um dos piores dias da minha vida, selecionado a dedo num ranking impressionante de desastres subsequentes, eu me lembro. Esse é o problema, eu me lembro com riqueza de detalhes deste dia dentre trezentos e sessenta e cinco diferentes possibilidades. O dia que o encontrei. O momento que passei a cultivar sentimentos vingativos e sanguinários por Hardy Riviere, dono de um sorriso debochado e olhar desafiador.

Exatamente como agora, era uma semana agradável de Setembro, início do ano letivo na nova escola. Eu estava muito nervosa. Será que faria amigos? Será que seria ao menos notada? Muitas preocupações ocupavam minha cabeça enquanto eu pedalava minha bicicleta verde abacate a caminho da aula. Era meu primeiro ano no ensino médio. Oficialmente uma adolescente até os ossos. Eu devia ter quinze anos na época. Os dentes da frente ainda eram grandes demais. Eu usava aparelho? Acho que sim. Minha pele ainda sofria os efeitos da acne e eu era tão desastrada. Minha coordenação motora era um completo desastre. Na verdade, ainda é. Acho que em parte foi por isso que derrapei naquela curva estreita. O guidão virou sem que eu tivesse controle. Me choquei aos berros contra a cerca viva de uma casa. Os arbustos amorteceram a queda, mas não tanto porque alguns galhos duros me espetaram e acabei toda arranhada. Ainda assim, fiquei aliviada quando me levantei e constatei que meu uniforme estava inteiro. Nenhuma prega da saia plissada havia rompido e o suéter poderia ser considerado intacto. Algumas manchas de terra macularam a camisa de linho branca, mas isso era tolerável.

Tentei ajeitar a cestinha da bicicleta que ficou torta devido ao impiedoso confronto com o muro de galhos, mas apenas desisti quando ela pendeu para o lado na quinta tentativa. Montei com dificuldade e voltei a pedalar mesmo que meus joelhos ralados ardessem a cada pedalada. Suportei a dor, cravei os dentes no lábio e fiz diversas caretas o trajeto todo. Pelo menos ninguém havia visto meu tombo naquela rua deserta. Pensei, tentando minimizar os danos.

Eu devia saber que nada naquele dia caminharia para o bem depois daquilo. Era um sinal do mau presságio. Fui negligente quanto às mensagens subliminares do universo. Uma tempestade estava chegando para nublar minha vida, e ela tinha nome, sobrenome e número de seguro social: Hardy Riviere.

Meu peito subia e descia violentamente quando me agachei para prender o cadeado da bicicleta no suporte de metal, no estacionamento da Benjamin Franklin. Se eu tivesse insistido para que mamãe me desse uma carona, isso não teria acontecido. Nada disso.

Lancei um último olhar triste para a cestinha torta e destruída antes de apressar o passo. Talvez eu já estivesse atrasada, porque não havia ninguém além de mim naquela parte do estacionamento.

A questão aqui é que eu não o vi se aproximando sorrateiramente. Como era possível alguém ser tão silencioso?

— Você é nova aqui. — O garoto disse, tão de repente, como se tivesse surgido de uma dimensão escondida entre o estacionamento e outra realidade, com seu ombro paralelo ao meu. Se eu não fosse tão cética quanto a universos simultâneos, acreditaria na possibilidade naquele momento.

Contando Até DezOnde histórias criam vida. Descubra agora