Capítulo 23.

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Gerard Way.

Frank não estava em minha cama quando acordei. Sequer estava em minha casa - não que eu estivesse esperando algo, mas não custava dar uma avisada. Fui me arrastando até o banheiro, e ao me olhar no espelho, tive a árdua tarefa de enfrentar a realidade. Tinha cortes em meu rosto que me lembravam de tudo que havia dado errado na noite passada. Mais uma vez eu estou de frente a minha imagem, frente a frente com o diabo que existe dentro de mim e a única vontade que tinha era de acabar com tudo de uma vez. Quis socar o espelho, porém estaria apenas quebrando o reflexo, não o que de fato eu queria quebrar.

Cento e quinze chamadas perdidas no meu celular. O mundo realmente está pronto para cair sob minha cabeça e não é como se eu não mereça. O gerenciamento de crises da Way Enterprises havia ligado mais de dez vezes. DEZ VEZES. Duas coisas podem ter acontecido: ou as ações subiram para níveis estratosféricos ou estão todas dentro do meu cu depois desse escândalo. A assessoria de imprensa, idem. Será que dá, pessoal, para vocês tentarem, pelo menos por um segundo, respeitar o luto alheio?

Revirei os olhos e me sentei no chão do banheiro, desnudo, sem forças, me sentindo o adolescente de dezesseis anos que um dia fui. O mesmo que morria de medo de tudo e de todos e que só queria, pelo menos por uma vez na vida, um colo de mãe para chorar, um café quente e um cobertor confortável. Tenho: whisky quente e cobertor confortável. Deve servir para alguma coisa, não? Observava os machucados nos dedos da minha mão. Tudo doía.

Meus devaneios foram interrompidos quando uma figura alta e esguia parou na frente de meu banheiro. Vestindo um terno italiano com o corte perfeito, Mikey encostou na porta. Após um longo minuto de contemplação, suspirou profundamente. Estávamos pela primeira vez na vida com os papeis invertidos, onde eu era o vulnerável que deixava esvair por todos os poros um pedido de socorro, e Michael era o centrado que estava pronto para resolver todos os problemas que fossem.

- O enterro vai ser às 14 horas. Já organizamos tudo. Está tudo resolvido, Gee. Você só precisa aparecer. Já demos um jeito de garantir que a mãe, as irmãs e o irmão do Bert vivam tranquilamente financeiramente por um bom tempo.

- Eu não estou pronto para enterrar o Bert, Michael. - Falei apoiando minha cabeça em minhas mãos. Apoiava meus braços em meus joelhos e estava sentado quase que em uma posição fetal, infantil, vulnerável.

- Pronto ou não, você vai ter que enterrar o Bert, Gerard. Não estar presente vai ser pior...Você não precisa de mais uma coisa para se arrepender o resto da vida. Vamos. Levanta.

Balancei a cabeça negativamente, e permaneci onde estava. Michael parecia ter desistido e saiu do banheiro, me deixando ali absorto em meus pensamentos auto destrutivos. Com certeza minha mente não é um bom lugar de se viver agora. Não sei quanto tempo se passou até Mikey voltar e me puxar pelos braços para que eu levantasse, forçando-me a ficar em pé. Sua mão direita tirava os fios de cabelo do meu rosto, me olhando com um sorriso terno em seus lábios.

- Vamos. O seu terno já está na cama. Vamos lavar esse rosto, escovar os dentes e entrar na roupa. Vamos.

Me forcei a andar pois não queria que Michael tivesse que lidar comigo por muito mais tempo. Não é assim que funcionam as coisas na minha família. Na minha família só existe uma dinâmica: o mundo inteiro vira de cabeça para baixo e eu faço ele retornar à normalidade, ou faço todos se acostumarem a viver assim. Não o contrário.

Uma vida inteira praticamente dedicada a não fazer mais merda. Não preocupar os outros. Não ser mais um problema. Cuidar do Michael. Cuidar dos negócios. Cuidar da imagem. Negligenciando uma parte muito importante dessa equação: eu mesmo.

Prison BlindersOnde histórias criam vida. Descubra agora