Capítulo 31.

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O dia amanheceu como se só estivesse amanhecendo para mim. O sol começava a irradiar os primeiros raios de uma manhã que, apesar de iluminada, era consideravelmente fria. Podia jurar que a natureza estava imitando o meu estado de espírito, reluzente, porém com uma frieza absurda dentro de mim.



Sentado na varanda do meu quarto, eu, os primeiros raios solares, uma calça de moletom, uma carteira de cigarros e milhares de pensamentos. Existia uma logística a ser pensada. Uma estratégia precisa ser montada e colocada em prática o mais rápido possível. Preciso reaver o poder e o controle da organização, depois, anunciar o noivado, agilizar o casamento e informar, para quem interessar possa, que duas Famiglias iriam se juntar em apenas uma. Como acontecia nos tempos do meu avô.



Até que a morte nos separe não é uma promessa vã, como acontece na sociedade comum. Um pacto a ser quebrado no segundo que os desejos carnais ou falta de caráter entrassem no caminho. Depois de um casamento, nas regras da máfia, não importa a quão avançada esteja a sociedade, não existem saídas dessa união. Utilizamos as mesmas palavras de iniciação, dos nossos votos de juramento para definir um laço firmado através do matrimônio: entro com vida e só saio na morte.



Há quem quebre as regras, afinal, estamos no século vinte e um. E famílias já foram arrancadas, devastadas, extintas do mapa da terra em nome da honra daquele que havia sido deixado. Não que exista alguém no mundo capaz de fazer isso, no nosso caso. Quem defenderia a minha honra ou a de Frank se somos os últimos de nossa família com algum poder bélico?



Não é com os laços do casamento que estou preocupado, nunca amara ninguém de tal maneira em minha finita experiencia. O que me preocupa são as reações que um anúncio de noivado pode causar nos Estados Unidos. Não que exista muita coisa a se fazer, as duas maiores Famiglias estariam se juntando e formando uma única instituição. Não existem muitas maneiras de impedir ou derrubar uma fundação firme como essa.



Isso significaria o fim de uma guerra que começara há algumas gerações. O fim, o ponto final, o arco definitivo dessa história que você acompanha até aqui. De geração em geração, o ódio foi reproduzido, cultivado como grama verde em plena primavera, que cercava e aquecia. Uma certeza em comum: lutariam até a morte. E por isso, morreriam tentando. O fim da guerra era há muito conhecido: a derrota de uma Famiglia sobre outra. A ascensão. O domínio de um país inteiro na palma de mão de um único homem. Ninguém imaginou que, a guerra pudesse acabar por amor. E nada mais.



O único seria feito. Todas as Famiglias, os associados, interessados, envolvidos diretamente ou não, seriam convocados para a festa de anúncio, também conhecida como festa de noivado e ali, a aliança firmada jamais seria quebrada. Não interessa quantas intervenções externas sejam feitas. O voto de uma promessa de casamento não seria quebrado. Todos os homens, de ambas as casas, quando o anúncio fosse feito, estariam prontos para morrer defendendo aquela aliança. A morte é sempre a única maneira.



Ri com a ideia. Meu avô enfiaria um garfo nos próprios olhos para não ver tamanha profanidade. "Sodomia é um pecado", ele diria. Como se, matar, esquartejar, prostituir, drogar, escravizar, traficar, roubar e todos os outros crimes que puder imaginar, não fossem o suficiente para mantê-lo longe do descanso eterno ao lado do pai infernal.



- Você não dormiu. - Disse uma voz rouca, um tanto adormecida que surgiu atrás de mim. Sua mão foi até o meu ombro, sua boca beijou o topo de minha cabeça. Me virei para ele. Estava lindo, como sempre. Suas tatuagens parecem ainda mais vívidas sob o olhar das primeiras horas da manhã.



- Não, não estou com sono. - Lhe dei um sorriso, enquanto minha mão percorreu um caminho quase que autônomo até a sua mão, natural como respirar. Entrelacei os nossos dedos. - Você dormiu pouco...

Prison BlindersOnde histórias criam vida. Descubra agora