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 De modo atónito levantei um pouco a cabeça colocando a mão sob o lábio observando o sangue em meus dedos, os fones escaparam de meu ouvido durante a queda, mas eu podia escutá-los mesmo distante da orelha: in a day or two.... (Em um dia ou dois). Senti a mão do estranho virar meu rosto para cima onde vi sua face com mais clareza.

 Os sulcos de sua bochecha eram chupados para dentro e o rosto magro, assim como o homem em si. Tão magro que era possível ver a profundidade de seu pescoço sem muita carne e seu pomo de Adão grande e saltado, os lábios eram murchos e olhos castanhos profundos com um longo nariz aquilino. Abriu a boca fina sem mostrar os dentes como se fosse falar algo exibindo um fio de saliva entre o céu de sua boca e sua língua, mas eu pronunciei primeiramente furioso:

 — Me solta, merda. Que ódio, vocês não me deixam em paz eu só quero a merda da minha vida de volta! — falei e minha voz saiu num tom choroso com os olhos marejando-se.

 O homem em cima de mim apertou ainda mais minhas bochechas contra o chão e respirou fundo se aproximando seu rosto do meu, ele estava me cheirando.

 — Interessante garoto... Você é quase invisível.

 — Eu não aguento mais! — tentei o empurrar.

 O homem riu com um sorriso amarelo, se aproximou mais ainda, passou sua língua fina feito um animal asqueroso e gosmento no canto sangrento de meus lábios e seguiu até minha bochecha o que me fez estremecer. Senti meu corpo se revirar e contorcer do avesso. Um sentimento de incapacidade me invadiu, e também congelei de modo com que não consegui ter nenhum reflexo corporal, minha expressão enojada tornou ainda mais visível, senti meu rosto enrugar, enquanto sua língua úmida percorria a pele do meu rosto.

 — Que gosto incrível! — Ele falou num sussurro assustador

 — Sam, solta o garoto — ecoou uma voz que vinha de trás.

 O homem estranho, se levantou e também me ergueu com ele como um boneco de pano, segurou com o colarinho de minha camisa, eu particularmente estava tão assustado que as lagrimas estavam paralisadas nas bordas dos olhos. O homem deu um riso me olhando com os olhos mais apavorante que sua atitude, agora eu o reconhecia de alguns panfletos, no qual ele aparecia ao lado de Aurélio. Eu apenas fiquei imóvel horrorizado de mais com a atual situação.

 — Benji! — riu com ar de surpresa— Então é isso que estão escondendo? Pilar é uma filha da puta!

 — Solta o garoto. — Falou prosaicamente

 — Fiquei sabendo que ele tem poderes, vim eu mesmo conferir... Parece que realmente o menino é especial — Sam passou um dos dedos no canto de sua boca e estalou a língua — O sabor é incrível, quando Aurélio souber disso... Ah, ele vai adorar!

 — Ele é meu! — esbravejou Benji com os punhos cerrados — Larga ele.

 Sam aproximou seu nariz de mim e me cheirou novamente, dessa vez puxando o ar com força.

 — Não está marcado. Não sinto seu cheiro nele. Então acho que ele pode ser nosso.

 — Porra! Não sou de ninguém. Me larga! — falei em protesto me agitando

 A gola de minha camisa estava enforcando-me.

 — Como descobriu sobre ele? — perguntou Benji num tom odioso.

 — Sabe como é, Coiotes não são muito confiáveis, uma garrafa de cerveja e um dinheiro e eles abrem o bico... As notícias circulam por aí Benji.

 Em um momento rápido de me livrar toquei o braço de Sam que me apertava fortemente a gola da camisa nas costas. Vi um homem nos relampejos, cabeludo, barbudo e rechonchudo, os dois conversavam em um beco sem saída perto de uma caçamba de entulhos velha e suja. Tomei um susto empurrei o esquisitão, ele também se assustou, o que me tornou livre para desatar a correr, eu não sabia se devia correr em direção a Benji, mas por via das dúvidas desatei a correr em direção oposta aos dois.

 A viela estreita e longa, havia também alguns degraus na qual eu pulava sem nenhuma cautela. Escutei atrás de mim sons como de um monstro, e ao olhar para trás haviam dois monstros. Tive um lapso de pânico, e um tropeço em um dos últimos degraus. Eram dois cães monstruosos e gigantescos como se tivessem saído de um poço radioativo, quase nus de pelagem, eriçados, focinho chato, olhos ferozes, os dentes longos e afiados, orelhas curtas, sem caldas, tinham patas traseiras grandes e articuladas para saltar com facilidade. O animal bestial mais robusto que estava atrás alavancou-se em cima daquela besta mais magra que estava ainda mais próxima de mim, ambos se embolaram em mordidas e latidos com ganidos, se separaram e rodearam-se antes de travar uma outra luta feroz. Mal podia acreditar em que meus olhos estavam vendo, eram ágeis e voraz, as pancadas que davam contra a parede arrancavam poeiras e fragmentos de pedras, rosnavam alto, arfavam ar de suas ventas, babavam, latiam, ganiam, grunhiam. Fiquei observando por um momento, assustado com a cena, mas logo me dei conta que devia sair daquele local quer aquilo seja real ou não.

Crônicas da Noite - A Ordem da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora