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Ele pegou a adaga, e dei alguns passos para rumo a saída do galpão em um andar cabisbaixo. Acho que no fundo ele ainda estava morrendo de medo de minha atitude, afinal eu podia fazer como dito: fugir, estragar a vida política de sua mãe, dar trabalho a ele.

— Ei — chamou ele — Segure isso.

Falou ele e em seguida me entregou a adaga. Balançou a cabeça como se houvesse molas em seu pescoço e fez uma cara de conformismo se afastando.

— Me ataque.

— O quê?!! Não, não vou atacar você. — Relutei

— Vamos garoto. Faça. Me ataque — falou prosaicamente.

Segurei a adaga o observando sem entender. De início tentei relutar a ideia, mas pensei que ele sabe de certo como se proteger, então fui para cima dele de qualquer maneira, deixando expressivo minha raiva interna, Benji se esquivou, segurou meu braço, rodou em meu próprio corpo e logo eu estava com o rosto colado na parede imobilizado com o braço torcido nas costas.

Podia sentir seu hálito em minha orelha, sua respiração não estava nada afoita, e sim tranquila, como se não tivesse se gastado energia para me imobilizar. Eu havia gostado daquilo, foi um bom reflexo de esquiva, queria aprender a fazer aquela técnica, queria ser igual a ele.

— Não se segura uma adaga como se fosse cortar um pão Adriel. Tem de segurar como se fosse atacar o pão — ele apertou meu pulso de modo grotesco e adaga caiu no chão.

Naquele dia aprendi a empunhar uma adaga da maneira correta, aprendi a socar sem torcer o pulso, a chutar sem fazer a perna doer, me defender de murros e ataque mão a mão. Aprendi que embora eu não tenha um cheiro pra ser farejado por lobisomens, eles têm uma boa audição, conseguem ouvir os batimentos cardíacos, ouvir sua respiração caso entre em pânico. Mas embora eu tenha aprendido as técnicas é difícil educar o cérebro a não se esquecer, é preciso treinos constantes e técnicas aprimoradas dizia Benji, o que era de fato verdade, volta e meia eu errava os golpes, errava o modo como me portar com equilíbrio sem cair, Benji não era nenhum expert com formação em lutas, tudo que ele sabia era de aprendizado pessoal, um aprendizado muito intrigante e minucioso, ele era um bom professor, rígido, mas bom. Passamos a tarde toda juntos, e no final depois de um treino exaustivo sentamos no chão. Eu estava sedento. Benji prendeu seus cabelos que não eram grandes o suficiente fazendo com que apenas os fios mais longos ficassem presos no elástico e o restante soltos entorno de sua cabeça. Ele, era um homem muito bonito, e atraente. Puxou sua camisa que estava totalmente ensopada de suor, tentei não observar, mas sutilmente olhei para seu corpo com mais precisão do que outrora, a pele levemente morena do sol, os pelos que percorriam o seu tronco torneado, o suor que lhe escorria devagar pelo pescoço, a veia pulsante da artéria em seu pescoço, seu ombro largo estava bem melhor, a cicatriz estava mais fina.

Algo ainda, além de sua aparência me impressionava nele, suas mãos grandes, era bonitas, mas diferentes, embora não parecesse aveludadas, era possível ver as veias saltadas e salientes abaixo do tecido da pele, e também a musculatura de sua mão era extremamente curiosa, como se a mesma tivesse camada extra de pele, Benji deslizava a adaga em seus dedos com uma certa agilidade.

— Suas mãos... — Falei pensando tocar, mas não fiz.

— Adaptação genética — sussurrou ele. — Eu antecipei minha transformação. Não aceitava as condições de ser o que sou e me perdi de minha mãe quando criança. Passei quase quinze anos em mata fechada, vivendo com outros animais.

— Sua mãe nunca foi atrás?

— Tentou. Mas ela perdeu meu faro quando decidi cruzar um rio em busca dela, eu devia ter uns cinco anos. Embora eu tivesse minha primeira transformação aos sete anos vivia mais na forma humana do que na forma animal. Não entendia nada sobre as transformações.

Benji apoiou uma de suas mãos no chão, e esticou os dedos tocando-o com a apalma o solo, todos os músculos se estenderam. Era estranhamente curioso, as veias saltaram assim como os músculos, era como como tivesse mais ossos, ele conseguia dobrar cada um dos nós dos dedos para dentro de uma maneira impressionante, semelhante a anatomia dos primatas, o polegar levemente menor, unhas levemente mais curtas, quadradas e róseas, a palma de sua mão parecia ter um aspecto de aspereza e havia uma pequena cicatriz como um risco nas costas de uma de suas mãos. Tive um anseio em tocar novamente, dessa vez fiz, segui de modo sutil com os dedos até sua pele, segurei sua mão observando as estruturas, era uma mão humana, com diferenciais únicos, os dedos não eram finos e esguios, eram roliços, chatos e grossos assim como sua mão em um todo, era uma mão muito maior que a minha, mais quadrada com menos formatos curvos, as a ponta dos dedos eram levemente planas como se tivesse sido usada para apoio, passei o dedo sob as linhas que eram mais expressivas como se pudesse lê-las e depois sob a cicatriz pequena que parecia ter sido feita com uma adaga.

— Viveu quanto tempo na mata?

— Faz cinco anos que reencontrei minha família, então fiquei muito tempo eu diria.

Alisei a cicatriz em risco.

— O que houve aqui?

Crônicas da Noite - A Ordem da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora