Forcei meu corpo a dar os passos em direção ao corpo de Nataly. Minha boca estava seca e minha cabeça girava, mas precisava fazer alguma coisa.
Meu corpo agiu quase que sozinho. Eu apenas conseguia pensar naqueles seriados que eu e ela assistimos juntas. "Quando a pessoa ingere muitos medicamentos de uma vez, você tem que fazer ela vomitar". Coloquei o corpo inerte de lado, abri sua boca à força, sem me importar se ela iria me morder ou não, e enfiei dois dedos em sua garganta.
Eu não sabia se ela estava respirando, ou se já estava morta, apenas segui essa linha de raciocínio e fiz movimento de "vai e vem" com os dedos, encostando no fundo de sua garganta. Por um breve segundo fiquei horrorizada em pensar que estava violando seu corpo morto, mas então Nataly engasgou e logo um líquido espumoso saiu de sua boca. Tirei meus dedos da frente e a apoiei.
— Ligue para uma ambulância! Rápido! — gritei para Lucas.
— Já estão a caminho — respondeu desligando o celular.
Agradeci mentalmente por seu pensamento mais rápido que o meu, enquanto segurava o corpo de Nataly como se estivesse segurando sua alma para não ir embora.
— Tudo bem, querida — sussurrei maternalmente. — Vai ficar tudo bem. Eu estou aqui.
Ela parou de vomitar e apenas ficou com os olhos fechados. Seu corpo estava fraco e mole, mas eu conseguia ouvir o chiado da respiração. Meu rosto estava molhado e podia sentir o gosto de água salobra. Eu tremia da cabeça aos pés à espera de ajuda, com a expectativa de que talvez ela poderia ter salvação.
Depois de longos dez minutos finalmente a ajuda chegou. Lucas tinha explicado a situação, então os bombeiros também foram chamados para conseguir tirar ela do telhado. A operação não foi fácil, mas logo os socorristas a colocaram na ambulância. Eu e Lucas fomos juntos, mentindo que éramos da família.
O caminho até o hospital foi aterrorizante. A cabine da ambulância balançava muito e os equipamentos médicos faziam "bips" para todo lado. Nataly recebeu uma intravenosa no braço e colocaram a máscara de oxigênio - aquilo fazia um barulho muito esquisito. O socorrista nos avisou, que apesar de estar desacordada e os sinais vitais não estarem muito bons, ela ainda tinha chances.
A entrada no hospital foi caótica, e logo me vi perdida em um mar de pessoas. Lucas pegou meu celular e ligou para a mãe de Nataly, avisando onde ela poderia encontrar a filha. Pelo menos alguém ali estava sendo racional.
Eu permanecia estática, aérea, totalmente sem saber qual próximo passo eu devia tomar. Lucas me conduziu até um sofá na recepção e ficou abraçado comigo. Não tinha mais nada a ser feito, apenas esperar que ela saísse daquela situação viva.
Tia Laura chegou uma hora depois. Ainda não tínhamos recebido nenhuma notícia, e uma enfermeira disse para esperarmos até que algum médico fosse falar conosco.
O pai de Nataly sempre foi muito sério, mas, naquele momento, eu pude ver todo seu mundo desmoronando, pensando que sua filha estava prestes a morrer. Eu não sabia muito bem o que dizer, então apenas fiquei ali, em um silêncio mórbido.
— Obrigada por achá-la — Laura me abraçou com força. — Por sua causa nossa filhinha tem alguma chance. Obrigada, querida.
Minha mente estava entorpecida. Eu ouvia todo aquele barulho como se fosse uma televisão chiando. Tudo que eu queria era parar com aquele suspense e saber como ela estava.
Horas se passaram até que finalmente o médico encarregado deu notícias. Suas roupas brancas me deixaram enjoada.
— Conseguimos tratar e estabilizar o quadro — Ele disse, sério. — Apenas saberemos a extensão dos danos quando ela acordar. No momento ela está na Unidade de Tratamento Intensivo para monitorarmos de perto, assim que seu estado melhorar podemos transferir para os quartos. Sinto muito pelo bebê.
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Rostos Borrados
Roman d'amourJá imaginou não conhecer a si mesmo? Rostos borrados, desconhecidos amigos, nenhum traço. Ana é uma garota sem rosto. E todos a sua volta também. Em meio a multidão desfocada, um amor da infância ressurge em sua vida depois de seis anos. Será que el...