Carta para Nana

6 1 0
                                    

    Querida, Nana

    Por muito tempo andei sem rumo pela vida, sem entender o significado de ser importante ou de ter alguém importante.

    Fui criado para ter resultados e assumir a empresa dos meus pais, então cresci em uma casa que não tinha muito amor, tudo era muito mecânico e a perfeição era a única coisa aceita.

    A primeira vez que me senti bem comigo mesmo e senti algo profundo por alguém foi quando te conheci. Você era uma menina radiante que sempre via o lado bom das coisas. Posso dizer que você era uma Poliana da vida (quero ver você lembrar dessa referência!). Por mais que você tenha perdido um pouco dessa alegria quando sua mãe se foi, você continuava tentando seguir a vida da melhor forma possível e ser gentil com todo mundo. Eu amava isso em você. Amava seu cuidado, carinho e a sua habilidade de observar os mínimos detalhes.

    Meu mundo ficou meio cinza depois que você foi embora. E eu tive dificuldade de me conectar com as pessoas. Cresci aprendendo que todo mundo tem seu preço, e acabei colocando isso em prática por anos. Até que você apareceu na minha vida novamente, no momento certo.

    Reencontrar você, e me apaixonar novamente pela sua nova versão, abriu meus olhos para o que poderia significar amor.

    Sempre tive uma casa, mas foi com você que aprendi o que é ter um lar. Você é minha bússola, guiando-me pela tormenta e me mostrando a terra segura.

    Ainda não consigo acreditar que você foi meu primeiro amor, e eu te encontrei mais uma vez. Será você o meu destino?

    Sei que estou indo embora, e queria muito dizer para você me esperar e nunca encontrar outra pessoa. Mas não é justo te prender a mim, assim como já conversamos. Não podemos ser aquele tipo de casal, isso acabaria conosco.

    Não espere por mim. Viva ao máximo sua vida, como se o mundo fosse acabar amanhã. Até porque pode ser que ele acabe mesmo, como ambos sabemos que sim.

    Saiba que eu acredito em destino, e quero acreditar que você é o meu. Algum dia, daqui alguns anos, ainda irei pegar sua mão novamente e te tornar meu feliz para sempre - mesmo você teimando comigo que isso não existe.

    Não sei quando nos reencontraremos, mas pode ter certeza que iremos. Eu iria até o fim do mundo para te ver de novo.

    Guardarei cada momento que passei com você nesses últimos meses. Cada beijo, cada sexo (ah esses eu guardo num espaço especial aqui na mente) e cada risada.

    Você me fez o homem mais feliz do mundo, Ana Gomez Pereira.

    E este não é um adeus!

    Com amor, seu eterno destino.

    Quando o avião decolou chovia lá fora, e dentro de mim também. Guardei a carta na bolsa e me sentei em um banco. Pelas janelas enormes podia-se ver aviões decolando, rumo ao destino de várias pessoas. Fiquei imaginando qual deles seria o de Lucas, se ele já estaria no ar, indo para longe.

    Meu coração estava pesado, minha garganta apertada e meus olhos ardiam. Por mais que eu soubesse que esse dia chegaria, nada poderia ter me preparado para o que estava sentindo naquele momento. Como se uma parte de mim tivesse ido com ele. Eu tinha perdido minha bússola.

    — Vai ficar tudo bem, Ana — Uma voz conhecida sentou ao meu lado e me abraçou.

    — O que você está fazendo aqui? — perguntei, soluçando.

    — Nataly me contou que ele ia embora hoje, imaginei que você iria precisar de apoio — Ele começou a fazer carinho em meus cabelos.

    Fiquei calada, sem saber o que responder. Ficamos sem conversar por semanas, mas ele estava alí, bem quando eu mais precisava.

    — Obrigada — sussurrei.

    Caio me abraçou mais forte, deixando claro que ele não iria a lugar algum. Chorei mais um pouco, pela perda que tive e pelo alívio de saber que eu não estava sozinha.

    — Que tal ir para casa? — Ele propôs. — Você pode ficar aconchegada no seu sofá e assistir algum daqueles filmes clichês que você tanto gosta.

    — Você vai assistir comigo? — sussurrei.

    — Você tem certeza? Não sou uma boa companhia para assistir filmes românticos —Ele riu.

    — Não precisa ser romance — sorri ao pensar nele assistindo um clichê. — Mas meu pai fez aquele sorvete que você gosta.

    — Bom, então o que estamos esperando? Vamos logo, Gomez! — Ele se levantou e me levou junto, colocando seu braço em volta dos meus ombros.


    — O que você está fazendo, mulher?! Ele é o homem da sua vida! — Caio levantou do sofá, indignado.

    — Ei! — puxei a camisa dele para baixo - Fica quieto!

    — Mas a maluca vai procurar o cara errado! Como que pode? — falou indignado.

    — Eu achei que você não gostava de clichês — zombei.

    — Não gosto — Me olhou franzindo a testa, o que me fez rir mais ainda.

    Então as lembranças das noites que passei com Lucas no sofá me golpearam com força no estômago. O sorvete parecia ter gosto de cinzas em minha boca e o filme não tinha mais cores. Meus olhos ficaram embaçados e um rio de lágrimas se seguiu.

    — Sério, essa mulher... — Caio parou de falar quando viu que eu estava chorando - Ei, o que aconteceu?

    Coloquei a cabeça em seu colo e fiquei ali, apenas chorando com aperto no coração. Suas mãos acariciavam meus cabelos, mas eu apenas conseguia sentir a dor de não ter Lucas comigo. Cada pequeno detalhe me relembrava que meu amor tinha voado para longe.

    Passei dias no piloto automático. Indo para o colégio, assistindo as aulas, participando de conversas sem sentido com meus amigos e voltando para casa.

    Acordar. Colégio. Amigos. Casa. Dormir.

    Nada parecia ter graça e o mundo girava mais rápido do que eu conseguia acompanhar. Eu acordava apenas pensando no momento que eu iria dormir novamente, esperando que o tempo passasse mais rápido. Talvez quando eu acordasse daquele torpor, finalmente estaria nos braços de Lucas mais uma vez.

    "Você é patética, Ana. Você entregou seu coração e ele levou embora", pensei, enquanto observava meu borrão ridículo pelo espelho. Eu não tinha mais lágrimas para derramar, mas continuava com uma tristeza constante. Totalmente perdida e sem rumo.

    Meu celular tocou e a tela anunciava que Rafa queria falar comigo. Desliguei, ignorando completamente sua ligação. Eu já tinha pulado pelo menos 2 ou 3 encontros virtuais com ele, com nenhuma vontade de contar as novidades. Ele poderia esperar, pois a megera estava de luto.

Rostos BorradosOnde histórias criam vida. Descubra agora