Ladra sim, e agora?

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    O domingo passou rápido. Rafa não comentou nada sobre a boate; aliás, não conversou comigo depois daquilo. E também não fomos juntos para o colégio. Quando fui chamá-lo, ele já tinha ido embora.

    Passei em uma padaria e comprei alguns sonhos e croissant para mais tarde. Talvez Rafa se juntasse a mim para comer no intervalo.

    Chegando no portão do colégio, ouvi alguém chorando. Eu não me preocupava muito com os dramas alheios, mas fiquei curiosa. Uma pessoa estava abaixada e encolhida perto de uma árvore no pátio, logo ao lado do portão. Todos que passavam ali podiam ouvir. Pude perceber uns risos ao longe, não sabia se tinha alguma conexão.

    — O que aconteceu?  — perguntei me sentando ao seu lado.

    Ela se limitou a continuar a chorar. Acho que não conseguia formular uma frase correta. Percebi que tinha cabelos negros com pontas azuis, que batia no ombro. Lembrava de ter visto um cabelo assim em algum lugar...

    Fiquei ali, ela querendo companhia ou não. Eu podia ser uma megera, mas ninguém merece chorar sozinha.

    — Elas me odeiam —  Ela sussurrou entre soluços.

    — Quem? — instiguei.

    — As "Beverlys" — Sua voz estava abafada, por continuar com o rosto enterrado nos braços.

    — Você é uma delas, não é? — Lembrei de onde vira o cabelo.

    — Eu era —  suspirou. — Yan disse que gostava de mim, não da Laura. Ela surtou e agora eu não faço mais parte do grupo delas.

    Ela levantou o rosto para me encarar. Consegui perceber que tinha manchas pretas em seu rosto desfocado. Pelo que conhecia de garotas, aquilo era rímel borrado.

    — Nossa! — exclamei — Espere um momento.

    Revirei minha mochila e encontrei lenços umedecidos (que não estavam mais tão umedecidos assim). Joguei um pouco de água neles e comecei a passar nos borrões.

    — Elas podem ter te dado um pé na bunda — disse com um tom suave  —, mas você é melhor que isso. Você precisa levantar a cabeça e mostrar quem você é.

    — Elas eram tudo para mim! — choramingou. — Não sei o que fazer agora que não tenho mais elas. Com quem vou ficar no intervalo? Vou parecer uma idiota ficando sozinha. Ou pior... Vou parecer uma perdedora esquisita.

    — Só vocês pensam assim  — sussurrei.  — Olha... A vida não acabou só porque suas amigas falsas te rejeitaram. Você pode conhecer gente nova, ficar com esse tal de Yan também. O tanto de gente que tem nesse colégio, você não vai ficar sozinha.

    — Elas vão ficar zoando com a minha cara! — disse, desesperada.

    — Gata, elas só vão zombar de você se você deixar.

    — Eu não sou um Iceberg que nem você — falou rispidamente. — Eu tenho uma vida social para manter

    — Você é só mais uma boneca manipulável — Parei de limpar seu rosto e me levantei — Elas vão fazer o inferno na sua vida, porque você é burra o suficiente para se rastejar como um verme! E sabe de uma coisa... Melhor ficar no chão mesmo, é o lugar que você merece.

    Joguei os lenços em sua direção e peguei meu caminho. Eu sou legal, mas existem limites. Garotas mimadas não merecem solidariedade.

    No meio de uma das aulas do primeiro período recebi uma mensagem de um número privado.

Rostos BorradosOnde histórias criam vida. Descubra agora