Meus olhos estavam pesados e meu corpo não queria se mexer. Eu sentia que alguém estava ao meu lado e pegava minha mão, mas não fazia ideia do que estava acontecendo.
— Eu sei que você não pode me ouvir — Caio sussurrou, apertando minha mão de leve —, mas... Fique viva, está bem? Eu não suportaria ver alguém que amo morrer assim.
Senti um beijo em minha têmpora e ele sussurrou mais perto:
— Eu te amo, Ana — passou um dedo em meu maxilar e soltou um riso sem humor —, veja como eu sou um idiota.
Gritei internamente. Minha vontade era de pular da cama e sair correndo. "O que está acontecendo? Por que eu não conseguia me mexer? O que aconteceu comigo?"
Uma dor lancinante atravessou minha cabeça e eu novamente caí em um limbo temporal.
— Você acha que ela vai acordar? — ouvi meu pai conversando com alguém.
— Cirurgias sempre tem algum risco — Outra pessoa falou —, mas estamos otimistas quanto à recuperação...
Mais uma vez fui jogada nos cantos de minha mente. Sem saber exatamente o que estava acontecendo.
— Ei, você precisa ficar boa — Aquela voz, suave e grossa, saindo pelos lábios que eu tanto conhecia. — Eu sei que você está aí em algum lugar, meu bem. Trate de voltar para mim, está bem?
Flashes de memórias começaram a me assombrar.
Mamãe sorrindo no carrossel. Mamãe com o rosto distorcido, caída no chão, seu rosto ainda levemente reconhecível, até mesmo para mim. Papai de jaqueta de couro. Consuela querendo sacar sua arma. Lucas me beijando. Caio me salvando do garoto. Uma serpente em uma caveira. Diego me espancando. Eu sendo levada para o hospital. Caio dizendo que me amava.
"Eu te amo, Ana", sua voz ecoando pela minha cabeça, em uma espiral infinita. Lucas me beijava, incessantemente, e no fundo daquilo tudo, a risada de mamãe preenchia meu coração.
— Vai ficar tudo bem, meu anjo — Naty sussurrou em meu ouvido, enquanto passava a mão em meus cabelos. — Você vai acordar logo, eu sei que sim.
Consuela tinha sido morta. Por mim. Mesmo que por acidente, eu tinha colocado fim naquela insanidade. Eu finalmente estava livre. Todos nós estávamos. Mas ao mesmo tempo, fui presa em uma jaula mental. Quão irônico o universo poderia ser?!
Um grande alívio tomou conta do meu ser. Toda aquela tortura psicológica e agressões físicas tinham chegado ao fim. Minha família e meus amigos não seriam mais assombrados. Viveríamos em paz, finalmente.
Então, o caos se instalou. Minha mente teve um clarão e eu comecei a afogar. Uma dor enorme tomou conta da minha cabeça e da minha garganta.
— SaO2 94%, FC 98bpm, FR 19mpm — Uma pessoa falou.
— Refaçam a oximetria, hemograma e EAS — Uma mulher falou um pouco distante. — Quero TC de crânio, tórax e abdômen. Já pode começar o teste funcional.
— Senhor Gomez, pode esperar lá fora enquanto fazemos os testes — Outra pessoa falou, ao meu lado.
— Não... Vou ficar aqui, se possível — Meu pai respondeu.
Abri os olhos, relutante. A claridade artificial machucava minha visão, pisquei várias vezes para conseguir me adaptar. Tinham 2 pessoas ao meu lado, um rapaz apenas fazia anotações e uma mulher começou a pegar em minhas pernas.

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Rostos Borrados
RomanceJá imaginou não conhecer a si mesmo? Rostos borrados, desconhecidos amigos, nenhum traço. Ana é uma garota sem rosto. E todos a sua volta também. Em meio a multidão desfocada, um amor da infância ressurge em sua vida depois de seis anos. Será que el...