Capítulo 2 - Cristopher

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Outro dia se iniciava e com ele as responsabilidades cotidianas. E após mais uma noite não tão interessante, preciso me levantar e ir para o escritório. Levanto-me e observo a cidade pela sacada. De onde moro é possível ver a praia e alguns edifícios. Desde muito cedo sempre fui ambicioso e almejei crescer profissionalmente. Criado em um lar totalmente machista, não é muito difícil imaginar o que eu me tornei e não tenho vergonha de admitir o quanto me sinto superior à estes. A minha mãe não foi possível conhecê-la inteiramente. Ela morreu quando eu era criança, com depressão. O que passou a responsabilidade de me educar ao meu pai.

Mesmo depois da morte de minha mãe, o meu pai nunca pareceu se abater. Ele me educou como seus pais o educaram, com muita rigidez e alguns resquícios de afeto, literalmente resquícios. Ele sempre dizia, quando eu caía, que eu deveria me levantar. Sem chorar, pois demonstrar emoções me tornaria um fraco. Ensinou-me que eu deveria ser o melhor no que eu faço e a nunca me misturar com pessoas inferiores à nós. E assim levo seus conselhos à risca, vinte e oito anos dando orgulho a mim e nossos antepassados. Após me formar na faculdade, com um investimento do meu pai, abri meu escritório de advocacia, B&M (Barnes e Magalhães), em homenagem a nossa família e me tornei o melhor advogado do Rio de janeiro. 

Sinto o celular vibrando e pela hora só poderia ser uma pessoa: Ricardo Alencar

_O que aconteceu? - Pergunto ríspido

_Bom dia, meu amigo. Você dormiu bem?

Eu e Ricardo éramos amigos há anos. Apesar dele ser alguns anos mais velho, nossas famílias sempre foram amigas, e isso facilitou o vínculo. Tínhamos visões muito diferentes, ele era intenso, tratava todos educadamente e dizia que somos todos iguais.
Um completo bom samaritano.

_Eu dispenso suas gracinhas, Ricardo. Eu não posso me atrasar. - Falo impaciente

_Eu preciso de um favor. - Dá uma pausa - Eu levei ponto na carteira ontem e apreenderam meu carro. Poderia vir me buscar?

_Você é um completo irresponsável! - Murmuro - Eu chego em 5 minutos.

Começo a me arrumar e desço com pressa, em direção a seu apartamento no leblon. O avisto de longe e ele caminha com o sorriso mais descarado do mundo. Fecho a expressão, com cara de poucos amigos.

_Você não acredita no que aconteceu... - Antes de perguntar, ele continua - Ontem eu fui sair com uma pretinha linda. E ela disse que tinha hora para chegar em casa, porquê os pais eram rígidos. Mas quando a noite estava ficando boa, eram quase onze da noite. Ela saiu desesperada e se vestiu em uma rapidez que até me surpreendeu.

_Essa garota era de menor? - Pergunto curioso

_Eu não fico com menor de idade.

_Como você perdeu o seu carro? - Pergunto sem desviar os olhos da rua

_Saímos correndo, as pressas. Eu tentei dirigir mais rápido porquê ela morava longe e quando fomos nos aproximando do seu bairro, havia uma blitz. Ainda bem que estávamos perto e eu tinha dinheiro para o táxi.

_Já começou errado pegando uma preta. Não tinha como dar certo.

_Você fica detestável quando expõe esse seu lado.

_Está contaminando a sua pele com a desse povo sujo.

Eu não suportava sequer imaginar o corpo nu de uma dessas e muito menos ousar tocar em uma.

_Você ainda vai se arrepender de ser tão babaca com as pessoas.

_No dia que isso acontecer, eu comprarei o seu carro dos sonhos.

_Enquanto isso não acontece, cuide do seu. - Arqueei a sobrancelha - Cristopher, cuidado!

Era tarde demais, eu havia atropelado alguém, por mais que tivesse usado os freios.

Ai meu carro!
Eu não posso levar multa!

O sinal estava fechado. Por que diabos tinha alguém no meio da rua?
Ricardo desce e em seguida eu saio também, e assim que a vejo soube o porquê de tanta estupidez.

Tinha que ser preto!
Ou melhor preta, era uma menina.

Além de estar quase atrasado, ainda tenho que amparar uma criatura dessa. Ela tenta se justificar mostrando ter salvo um gato, após de alguns minutos em silêncio. Enquanto Ricardo tentava ajudá-la, eu a observo. Ela era magra, usava roupas comuns e estava com os cabelos amarrados. Totalmente desinteressante e ainda por cima possuía a cor da dor.
Apesar de mais clara, ela era negra.
Cansado daquela falácia desnecessária, chamo o Ricardo para irmos. Eu não iria perder mais tempo com algo tão insignificante. Ela não precisava de ajuda e eu não queria ajudá-la. Entramos no carro e ela começou a caminhar. O percurso inteiro havia sido feito em um silêncio ensurdecedor e desconfortável, e quando chegamos no escritório, ele olhou-me com uma expressão dura.

_Por que está me olhando desta forma?

_Você quase matou a menina e ainda não a deu assistência necessária. - Entramos no elevador

_Ela estava bem. A mesma confirmou e o povo dela aguenta. - Encerro o assunto

_Para você não faz diferença nenhuma mesmo. É só menos um no mundo.

_A vida dela é tão insignificante quanto a de uma mosca.

_Não sei porque eu ainda sou seu amigo. - Começa a caminhar para a sua sala

Passo pela minha secretária e ela me cumprimenta, recebendo um breve aceno. Eu não dou abertura para ninguém no escritório, pois algumas confundem.
E essa nova secretária não parece ser diferente. Ela me olha discaradamente e as vezes tenta parecer sexy, mas só me causa tédio. Não demorará para ser demitida, pois eu não suporto mulheres oferecidas.

_Traga minha agenda, senhorita Lins.

Ela entra rapidamente na minha sala e lê a agenda prontamente.

_O senhor tem uma reunião hoje para a compra do terreno para o novo escritório.

_É só isso?

_Sim, senhor.

_Pode sair. - Ela se vira mas hesita quando a chamo - Senhorita Lins?

_O senhor precisa de algo?

_Eu gostaria de te fazer uma pergunta.

_Faça, senhor.

_O que você acha de mim? E não me refiro a minha personalidade.

Especifico para que não pense muito.
Ela sempre pareceu ser muito devagar no raciocínio.
Ela se aproxima da minha mesa e tentando ser sexy, abre um botão da blusa.

_Eu acho o senhor muito bonito, mas não me dá abertura para conhecê-lo. Eu queria ter a chance de poder tê-lo, pelo menos uma noite. - Diz sincera

Começo a rir, sentindo um profundo escárnio. Ela se mostra surpresa, nunca deveria ter me visto sorrir e me olha com um vergonha aparente.

_Você é patética! - Desmancho o meu sorriso - Deveria ter vergonha de se oferecer assim. Eu sou o seu chefe e gosto de profissionais responsáveis.

_Senhor...

_Está demitida! - Digo rudemente

Ela tenta se justificar, mas era impossível. Eu não suporto trabalhar com pessoas que o foco não seja o trabalho. Parece rude, mas se você não impõe limites as pessoas te usam como querem. Essa foi mais uma e eu teria que encontrar uma nova secretária.
Enquanto observo ela sair, eu me preparo para a Talvez o Ricardo estivesse certo sobre levar as coisas a sério, mas eu não me importava.
Ou faziam o certo ou não faziam nada e ponto final.

O outro lado do amorOnde histórias criam vida. Descubra agora