Não se pode esperar menos daqueles que nasceram destinados a se destacarem.
No meio de tantos meninos e meninas, resgatados do caos que era o inverso que atingia os vácuos, um não se sentia privilegiado por ser escolhido. Mesmo que estivesse impressionado com todo o luxo que aquele lugar possuía, nada o fazia mudar seus pensamentos de que era uma prisão. Uma grande prisão luxuosa e bem feita.
A casa 298 tinha uma fachada azul, uma azul que aquele menino pálido e magro, nunca vira em seus nove anos. Era tão bonito que ele pensou até mesmo em sorrir, claro, se aquilo não fosse uma prisão.
- Todos em fileira, por favor. - Uma mulher, magra e alta, se pronunciou.
O menino se perguntou o porquê ela ser tão magra, na inocência supôs que ela já havia passado fome assim como ele, mas mudou seus pensamentos ao observar as roupas brancas como gelo, limpas demais para alguém que passa fome.
- Tudo bem, quero todos os meninos de sete anos de um lado, por favor. - Ela era educada, e mesmo que seu sorriso fosse acolhedor, o menino via em sua afeição algo tão falso quanto as joias que ela usava. - Agora, os de oito anos do outro lado. - Ela apontou para perto da passagem que tinha ao lado de algumas cadeiras de madeira.
O menino tinha quase certeza que se ele corresse ele poderia escapar. Mas não tinha total certeza. Lembrava de seu avô lhe dizer que nunca deve agir sem ter a certeza completa que se sairá bem.
- Os meninos de nove anos me acompanhe por favor. - Ela sorriu como se fosse mostrar o paraíso a almas inocentes e facilmente manipuláveis. Talvez fosse exatamente isso.
Ao tirar alguém da escuridão, qualquer coisa que tenha luz se torna uma dádiva. Mas para aquele menino, tinha algo errado em toda aquela gentileza.
Na casa não era tão frio como em seu lar. Dentro daquela casa ele parecia respirar melhor e sua boca não estava tão seca. Mesmo assim, aquela casa enorme cheia de crianças perdidas, não era e nunca seria seu lar.
- Quero todos em fileira. Darei a vocês roupas e seus objetos de higiene pessoal. - A mulher loira sorriu calmamente, enquanto algumas outras mulheres, com vestimentas menos limpas e mais simples, distribuíram os utensílios para cada criança. - Assim que tomarem seus banhos e enfim estiverdes vestidos adequadamente, então começaremos os testes. Ah! Após se alimentarem também. - Ela tinha a voz forçadamente gentil. Parecia até mesmo tortura ouvi-la fingir.
Todas as crianças daquele setor tomaram banho juntas, supervisionadas por empregados. E o garoto não se importou muito com o amontoado de crianças ao seu redor, porque aquela água quente era boa demais, talvez porque nunca tomara um banho tão reconfortante e de certa forma demorado. A roupa que vestira era tão macia e tão quente que ele se perdeu por um instante e se esqueceu de que aquele lugar parecia uma prisão. Se esqueceu do frio que sentiu ao lado de seu avô e se esqueceu que não queria estar naquele lugar, por mais estranho que fosse.
O garoto se esqueceu de como a minutos atrás ele estava sofrendo de frio e temendo a morte. Porque ali na sua frente, naquela mesa prata e limpa, um prato com comida era sua maior atração. As cores de cada ingrediente, que nem ao menos sabia quais eram, conduziu o garoto pensar que talvez aquele lugar não fosse tão ruim. Ele comeu. Comeu algo realmente bom. Algo diferente das coisas que ele costumava digerir para sobreviver mais um dia. Ele não teve que dividir ou limpar a comida, estava perfeita e era toda sua. E ele saboreou cada parte daquela refeição tão rápido que sentiu falta dela assim que terminou.
Porém, se lembrou o quão estranho aquele lugar com pessoas sorridentes e crianças perdidas poderia ser estranho.
Entrou em uma sala com mesas individuais às crianças que compunha o grupo de nove anos. O garoto então começou seus testes. Um por um, era chamado para os testes. Uma enfermeira colhia o sangue, outra averiguava se os olhos estavam bons, se os dentes estavam em decadência, se a pele era muito frágil. E então paravam de frente a um homem alto e bronzeado, usava óculos e um jaleco branco com uma etiqueta que dizia: subchefe. E então ele dizia algumas palavras difíceis de se entender, com um vocabulário diferente, chegando a ser quase formal, o que deixava muitas daquelas crianças com medo e perdidas.
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| 𝚃𝚑𝚎 𝚃𝚛𝚞𝚎 𝚂𝚊𝚟𝚒𝚘𝚛 | 𝙵𝚊𝚗𝚏𝚒𝚌 𝙱𝚃𝚂
FanfictionEm um futuro distópico, depois da quase extinção da humanidade, uma nova guerra se iniciava entre os que queriam ser livres e os que queriam poder. Sempre houve guerras, e não seria diferente agora. Enquanto a humanidade vive presa entre discrimin...