Capítulo 17: Conversa

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A festa que Joe deu no pátio se estende até agora: 1h da manhã. Como eu não estava com muita vontade assim, logo fui para o quarto deixando Amberly e Daya à vontade nas brincadeiras.

- Você tem certeza disso?

Como não conseguia dormir por causa do barulho da festa a minha primeira alternativa foi fazer uma chamada de vídeo com Peter. Sabia que ele estaria acordado fazendo sei lá o que.

- Uhum - respondo enrolando a ponta do meu cabelo - Casa eu tenho, precisava mesmo de coragem.

- Bom, se vocês acham que isso vai funcionar, boa sorte. - Peter dá um sorriso leve e faz uma massagem nas têmporas.

- Dor de cabeça?

- É. Elas têm sido comuns.

- Precisa ir ao médico.

- Não, acho que é estresse mesmo. - ele me olha por um tempo até se virar na cama - Lembra aquela vez na casa da árvore?

- Quando você abriu o joelho no prego?

- Aaah - ele resmunga passando a mão no braço arrepiado - Eu arrepio só de lembrar. - dou risada - Não era bem dessa parte que eu ia falar, mas cara, que dor.

Quando éramos pequenos meu tio Richard construiu uma casa na árvore pra nós dois. Decoramos do nosso jeito. Pegamos uma cortina velha e penduramos na janela, luzes de natal pra colocar envolta da porta, dois banquinhos velhos pra sentarmos, um tapete de crochê pra colocar no chão e mais um monte de trapo pra decorar. Ficávamos lá o dia todo. Mas ficávamos porque sabíamos que tia Mary levaria dois copos de suco e cookies pra comermos. E no almoço era um lanche ou as delícias culinárias que ela fazia. No jantar eu já precisava ir embora, minha mãe sempre me buscava às 19h em ponto. Minha mãe era irmã adotiva de Richard o que fazia os dois não serem nada parecidos, e mesmo crescendo juntos, a personalidade era.. Questionável. Só manias iguais.

Deixamos o silêncio tomar conta da ligação. Sempre soubemos quando não queríamos compartilhar determinadas coisas que aconteciam com a gente. E esse é um desses momentos. Peter tem seus segredos, suas frustrações. E eu tenho as minhas.

- Como você tá se sentindo com tudo isso? - Peter quebra o silêncio enquanto se encosta-se à cabeceira.

- Com medo.

- Não parece.

- Tento não demonstrar isso. - me sento cruzando as pernas - Mas eu tenho medo e me sinto sufocada. Achei que matando Leonard todos esses problemas acabariam, mas --

- Eles só aumentaram.

- É - dou um sorriso fraco - Eu quero me libertar, sabe? Só que eu não sei como. Sinto-me sufocada.

- Não é fácil ter o olhar da cidade inteira em cima de você.

- Você também ficou? - pergunto e Peter me olha - Com medo. Sufocado. Cansado.

Eu sabia em partes o que havia acontecido com Peter ao ponto de Matt precisar intervir por ele. Mas ao contrário dele, todos o adoravam então devia ter sido muito difícil lidar com tudo e o olhar torto de todos.

- Fiquei.. Apreensivo na verdade. - ele responde depois de pensar um instante. - Não por mim, mas pelos meus amigos. Eles perdiam oportunidades por mim causa. A razão de nunca descobrirem minha identidade era justamente por isso, pra protegê-los. Mas no fim aconteceu tudo ao contrário. E mesmo que tudo foi resolvido, as coisas não voltaram a ser como antes.

- Minha apreensão é mais por vocês também. Amberly, Daya.. - respiro fundo - Eu não ligo do que acontecer comigo. Pode parecer drama repetir isso toda vez --

- Não é. - ele me interrompe - Isso mostra que você é boa e se preocupa com a gente. Mas pensa que vai dar certo. É praticamente 0% a chance de algo der errado.

Mais uma vez me sinto tentada a contar sobre o ocorrido no fórum. Minha garganta coça pra poder dizer tudo e pedir um conselho, mas ainda não é o momento certo pra isso.

- Sabe o que vocês deviam fazer quando isso acabar? - Peter pergunta sem esperar uma resposta - Uma viagem. Alugar uma van e cair no mundo a fora - damos risada - Qual é? Seria uma boa. Quem sabe juntar todos nós e irmos pra um lugar relaxante.

- Não trabalha, não?

- Eu peço folga - Peter pisca pra mim. - Já comecem a ver aonde vamos que eu alugo a van.

- E quem vai dirigir? Você?

- Sou um ótimo motorista - Peter diz e dou risada - Dirigido por Peter, guiado por Deus. Pensa nisso.

.

Nossa conversa se estendeu por horas afins. Relembramos algumas coisas, fizemos piadinhas, rimos, choramos. Acho que tudo que tínhamos direito de fazer, fizemos.

Peter desligou o telefone duas horas depois, mas porque acabou dormindo durante a ligação e desligando na minha cara. Aproveitei que o barulho da festa tinha acabado pra dormir e nem vi o momento que Amberly entrou no quarto e se deitou ao meu lado.

Agora pela manhã terminamos de arrumar nossas coisas para irmos embora pra minha casa. O momento é agora, se não conseguir entrar lá, nunca mais vou conseguir. Como a polícia já havia tirado todas as provas da casa, Matt conseguiu que o juiz liberasse pra irmos pra lá. Como não temos um lugar fixo pra ir, o juiz aceitou que nos mudássemos com algumas condições mínimas, claro.

Antes de destrancar a porta, respiro fundo várias vezes pra ter coragem suficiente pra encarar a sala novamente. Assim que fiz, Amberly e Daya foram as primeiras a entrarem e Daya como sempre curiosa, percorreu com os olhos a sala toda até parar no carpete com mancha de sangue.

- A polícia liberou, mas vamos precisar fazer uma boa limpeza aqui. - digo pra quebrar o olhar de Daya.

- Ainda bem - ela responde - Tem suco de morango no chão. Vocês não tinham copos aqui?

- É.. Suco - respondo. - Se quiser ir escolhendo o quarto, tem mais dois além do de casal.

Daya sobe as escadas correndo toda animada com sua mochila nas costas. Amberly e eu aproveitamos pra colocar o resto das coisas pra dentro da sala. Já olhei tudo também para ver se não havia mais escutas pela casa. E quando digo tudo, foi tudo. Piso, janelas, portas, pia, geladeira, tudo.

SURVIVE - 2 TEMPORADA (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora