07_O garoto da bolsinha

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Anna

- Sou professor de literatura e você é aluna nova? - perguntou e eu assenti. - Apresente-se. - senti meu coração acelerar.

- Sou Anna, venho do Brasil. - o nervosismo era tanto que nem sabia mais quais características eu tinha.

Risinhos, suspiros, elogios, criticas, tédio, tem de tudo nessa sala.

- Pode sentar-se agora. - falou o professor e eu assenti, indo até uma carteira no fundo da sala. Nunca fui de sentar no fundo mas eu estava morrendo de vergonha.

- Professor, estão chamando o senhor na diretoria. - um garoto falou e o professor saiu da sala.

Depois disso minha carteira encheu de gente.

- Então, você é do Brasil? - perguntou uma garota com uma sobrancelha erguida. - Samba aí pra eu ver se você é do Brasil mesmo. - eu fiquei confusa.

Eu mal saio da cama, imagina sambar.

- Eu sei dançar isso, eu sei. - disse uma louca, começando a fazer movimentos estranhos parecendo uma lagartixa.

- Você tem fantasia de carnaval?

Só vejo carnaval pela TV.

- Não... - só as máscaras de papelão que davam na escola.

Uma calcinha rasgada, vale?

- Você conhece o Neymar?

- Ah pronto, se eu morasse no Japão ia ver o Naruto ou o Jack chan?

- Jack Chan é da China.

- Não importa. - olhei com tédio para um dos debiloides, enquanto me sentia burra.

- Dizem que as mulheres do Brasil são as mais lindas, eles estavam certos. - um garoto de cabelos longos falou e eu sorri como resposta.

Longe de toda aquela multidão percebi um garoto sentado na carteira ao meu lado.

Estava com um capuz e tenho quase certeza que estava dormindo por que não via o seu rosto.

Ele era o único que não estava me bajulando.

- Vai vai com o bumbum tan tan. - eu olhei debochada pro garoto que cantava isso.

Isso aqui virou feira, foi?

Eles são retardados ou se fazem?

- Que nome de fama chique o desse cantor, Fioti, vou pôr no meu filho. - eu segurei uma risada.

Eu estava tímida enquanto a atenção toda estava para mim.

Ainda bem que ninguém falou de Bolsonaro.

- E o presid... - tirei meu sapato, ameaçando jogar no garoto a minha frente. - E a Anitta? - concertou, assustado.

(...)

Depois de um tempo, todos foram para seus lugares e o professor não havia voltado.

Eu peguei um livro comecei a ler para disfarçar minha vergonha.

Um garoto veio em minha direção com um sorriso perveso e derrubou meu livro na mesa.

Fi de corno.

- Yae. - falou enquanto mascava chiclete e fazia um barulho estranho, isso me doeu nos nervos.

Ele deu um sorriso e eu retribui com um sorriso forçado, pra falar comigo não precisava derrubar meu livro.

Peguei meu livro novamente tentando manter toda a paciência do mundo e olhei para o garoto com as sombrancelhas franzidas.

- Me desculpa, o que foi? - olhei novamente para meu livro.

- Quando eu falar, olha pra mim, garota. - Dessa vez ele puxou meu livro e eu já tava perdendo minha paciência. Eu vou dar na cara dele.

- Se você não me deixar quieta, vou enfiar esse livro no seu cu. - sorri.

Ele acha que tô brincando mas quando tiver que fazer cirurgia pra tirar o livro do cu, vou dizer "eu avisei".

- Você por acaso é louca? Você sabe com quem está se metendo?

- Anderson Silva? Não, então cai pro pau. - ele me olhou confuso.

Por que eles não entendem?

- Você tá falando que sou gay? Para de afirmar o que você não sabe, garota.

Alguém riu baixo.

- Não, é apenas uma forma de cumprimentar no Brasil.

- Não gostei nada disso. - ele se aproximou um pouco. - se usar isso comigo de novo, essa sua carinha linda fica roxa.

Eu arregalei os olhos.

A sala estava um caos e a gente estava no fundo da sala, então ninguém notaria ele me falando isso.

Exceto o cara do capuz que provavelmente está dormindo.

- Vai passar glitter? - perguntei. - Tenho preferências, prefiro azul, claro. Espero que esteja falando disso ou...

- Ou o quê?

- Ou vou querer pagar pra ver se tem coragem e te garanto que você sai daqui sem pau e de brinde, preso. - ergui mais minha cabeça para intimidá-lo.

- Eita. - uma voz rouca soou baixinho seguido de uma risada baixa e me questionei de onde vinha o som, mas não indentifiquei, pois meus olhos estavam ocupados vendo se esse garoto tem essa coragem.

Ele cerrou os punhos e achei que agora eu levaria um soco mas ri apenas para irritá-lo.

Jamais abaixaria a cabeça pra um filhote de jumento, que não sabe nem mascar chiclete de boca fechada.

- Ah, merda, vou realmente precisar fazer isso? - falou em um tom auto o suficiente para me fazer desviar o olhar para o lado.

Ele tirou o capuz e só então notei que era o garoto da bolsinha.

tentei não transparecer minha surpresa.

- Trisca nela e eu te mato. - falou o garoto e sua voz grossa me fez estremecer.

- Eu... não estou fazendo nada, cara. - ele revirou os olhos cruzando os braços.

- Por quê não repete para mim o que falou para ela? A gente resolveria isso de uma forma justa, de homem pra homem. - disse com a voz arrastada. - Não precisa de violência amigo, precisa? Se sim, eu me garanto e você?

Vi o garoto na minha frente se encolher e o olhei confusa para ele.

Eu não conseguia desviar o olhar para o garoto ao meu lado por estar bastante concentrada no garoto a minha frente, mas esse maconheiro deve ser o rei da cocada preta nessa escola.

O cara fala e o idiota na minha frente treme.

- baixe sua bola, volte para seu lugar e de preferência fecha a merda dessa boca. - vi um tom de brincadeira.

Ele tá se divertindo?

Eu não consideraria isso uma briga, foi uma conversa, com tons normais.

Não entendi por quê esse otário a minha frente quase se cagou e o garoto da bolsinha nem precisou levantar.

Ele obedeceu o maconheiro ao meu lado, como se fosse seu pai.

- Escolha certa, garoto. - debochou ao meu lado quando o garoto se afastou.

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