Oxigênio

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— Hã... — tentei escolher as palavras com cuidado, me perguntando se havia de fato a necessidade de dar alguma explicação. Aliás, não queria abrir margem para interpretações errôneas. Ou certeiras demais para ser martirizada. Cocei a nuca, nervosa.

— Você o beijou — Lara afirmou, os olhos atentos na minha reação às suas palavras. Estava convencida, mas buscava a confirmação para fins de humilhação alheia.

Danilo também pode ler minha culpa nos olhos e colocou a mão na testa.

— E ela ainda está sorrindo diante das palavras — Franziu o cenho para Lara, feito um psiquiatra dando o diagnóstico.

Por via das dúvidas, endureci meu queixo. Abri a boca para me defender, entretanto, não achava a maneira de fazê-lo.

— Ai, Ju — Lara apoiou a cabeça na mão e o cotovelo no joelho. Parecia mais preocupada do que decepcionada.

— Não foi minha intenção — respondi numa voz fraca, na defensiva. Os dois me olharam sérios.

— Com certeza você tropeçou e caiu com a boca colada na dele — Danilo respondeu com ironia, deu uma risadinha de nervoso.

Revirei os olhos.

— Eu não estava falando sério sobre tirar casquinha, você não tem o mesmo dom que eu. Se pudesse me garantir que não significou nada, todos poderíamos descansar em paz essa noite — nem a própria Lara acreditava em tal teoria.

Danilo descartou a ideia com a mão.

— Ele tentou te persuadir a alguma coisa?

O som baixo do carro em movimento preencheu o silêncio enquanto eu tentava pensar. Só então me lembrei do motorista e dei uma olhadinha alarmada para ele, preocupada que estivesse prestando atenção na fofoca. Além de ser uma coisa privada, que naturalmente eu não gostaria que pessoas estranhas ficassem sabendo, havia a parte da notícia que as revistas estavam atrás.

Lembrei-me então que conversávamos em português. E ao mesmo tempo, quase sem desfrutar do alívio, ponderei que não sabíamos quem era o cidadão de barba média. Talvez fosse brasileiro ou soubesse português. Ele mantinha os olhos escuros e parcialmente puxados para a frente. Ainda assim, não me sentia segura.

— Conversamos em casa — respondi apenas e me voltei para a janela, encerrando o assunto.

Apesar dos suspiros impacientes, mantive minha decisão.

Momentos depois, preferi ter continuado falando. Minha mente me abstraiu do presente, me levando ao passado próximo e prazeroso com Justin. As luzes dos postes mal se comparavam a intensidade do brilho dos seus olhos dentro do seu veículo, e, me concentrando um pouco mais, eu podia sentir o calor de sua mão segurando meu queixo, minha nuca, descendo para minha perna, abraçando minha cintura; sentia sua respiração em meu rosto e a maciez dos seus lábios nos meus. A recordação tão vívida afetou minhas batidas cardíacas.

Então chegamos em casa e eu me lembrei que nem havia perguntado o que eles haviam feito de interessante naqueles dez minutos que pude desfrutar da companhia de Justin.

— Nem pensar, não te contaremos antes de nos descrever tudinho — Lara negou, abrindo a porta de casa.

Nossos pais estavam no quarto, pelo barulho que podíamos ouvir da televisão no andar de cima, portanto me joguei sentada no sofá da sala, a cabeça apoiada no encosto me permitindo olhar para cima em rendição e vergonha. A luz acesa no teto me lembrou episódios investigativos na TV em que colocam o suspeito embaixo de um holofote desnorteante.

— O que eu posso dizer? ... Aconteceu.

— Mais de uma vez? — Lara emendou a pergunta. Os dois permaneceram em pé, olhando para mim. Minhas bochechas queimaram.

Litigious LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora