Fugitiva

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— Imagino que você tenha mais coisas a dizer do que eu — devolvi a bola, exagerando na compostura. Não queria que descobrisse minha escassez de palavras.

Ele assentiu sem muita determinação, hesitante, afinal, não sabia o que se passava em minha cabeça. Sendo muito honesta, nem eu.

Justin se ajeitou na cadeira, pigarreou, remexeu os ombros como se doessem, cruzou as mãos em cima da mesa e finalmente me olhou, decidido.

— Eu sei que eu já te pedi desculpas, e não quero ficar parecendo um disco quebrado, coisa que não ajudaria em nada, mas... — Agucei meus ouvidos, ele estava falando rápido, e embora meu progresso em inglês estivesse muito melhor do que quando cheguei, não me consideraria uma expert. Justin olhou para baixo por um momento e o próximo gesto me pegou desprevenida. Estendeu sua mão e alcançou a ponta dos meus dedos, os quais petrificaram de imediato — Me desculpa, Júlia. De coração. Eu lamento muito. Mas principalmente o fato de ter magoado você. Eu só estava confuso, eu... — mordeu os lábios e pareceu desistir do que diria, reformulando — Você merece realizar os seus sonhos e rechear cada segundo da vida de felicidade.

Uma pausa, apenas para se dedicar a encarar o fundo dos meus olhos, expondo-me vigorosa honestidade. Sua intensidade somada ao singelo toque me constrangeu e impedi todos os meus impulsos antes que ficassem transparentes. Inspirei, torcendo para que o ar clareasse minha mente. Dividi o assunto em partes.

Devia ao menos perdoá-lo, aliás isso não implicaria outras coisas. Não sabia se estava sendo frouxa demais. Mas afinal, perdoar era o papel do bom cristão.

Aquiesci uma vez, cautelosamente.

Ele deu um meio sorriso, percebendo minha resistência.

— Obrigado — e recolheu a mão.

Cruzei meus dedos no colo, irritada comigo mesma por ter lamentado que se afastasse tão rápido. Com meu dilema interno, quase não percebi que ele estava aguardando. O que queria que eu dissesse? Bem... Provavelmente o que eu disse que queria dizer. Ou esperava um pedido de desculpas também. Meu orgulho se manifestou, bem mesquinho, no sentido de que ele esperasse ali sentado se queria que eu me desculpasse depois do que havia me feito.

Mas, sinceramente, sabia que havia errado em magoá-lo com as palavras ditas no parque. E ainda assim, um dos meus maiores defeitos era não saber me desculpar.

Respirei fundo, me incentivando. Não doeria.

— E você sabe que eu não quis dizer aquelas coisas para você no parque — covarde o bastante, fiquei olhando para a mesa — Você não é nada daquilo. Eu só estava nervosa — e com um incentivo sobrenatural, ergui o queixo para olhá-lo — Me desculpa — a palavra pareceu estranha saindo da minha boca, entalada e depois cuspida.

Justin assentiu uma vez, mas o esgar da boca não parecia um sorriso. Apenas uma tentativa patética de mostrar que tudo estava bem. Ele não acreditava em mim. Pior, o ar tristonho indicava que a descrença se direcionava ao próprio valor. Havia levado a sério o teor de minhas acusações coléricas. A constatação apertou-me o peito, destruindo-me a compostura e sumindo momentaneamente com o orgulho.

— Justin — inclinei-me ansiosa em sua direção — Você tem tantas pessoas que te amam, literalmente do mundo inteiro. E isso é por quem você é. É óbvio que falei da boca pra fora.

Ele não me olhou.

— Não tem problema, Julia. Tudo bem — descartou. Mesmo sem o contato visual pude perceber que mentia.

Parabéns, anta.

— Se não acredita em mim, pergunte para Kendall. Tenho certeza de que ela vai concordar comigo nisso — ajeitei-me na cadeira, apelando. Esperava que o toque sutil de despeito não tivesse soado tão evidente para ele quanto para mim.

Litigious LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora