Nervosa

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O amor é superestimado. Um pensamento um tanto curioso para uma escritora de histórias de romance que está deslanchando na carreira agora. Eu realmente não fazia a menor ideia de que escrever fanfics serviria de alguma coisa além de uma escapatória da vida real. Não que minha vida fosse ruim, eu recebi de presente dois pais e uma irmã muito compreensíveis.

Sim, estava certo de que eu sempre fui muito romântica e isso se traduzia nas minhas histórias e poemas, arriscava até algumas músicas. Entretanto, meu campo de experiência amoroso era praticamente nulo em todos os meus 18 anos. Talvez eu fosse exigente demais.

— Ela acha que aquele Justin vai vir diretamente para o Brasil pedir a mão dela em namoro, certamente — minha família comentava quase toda vez que nos reuníamos, em um tom de provocação — confesso que em algumas rodas de amigos também —. Aliás, todas as minhas primas já haviam levado os namorados para que conhecêssemos, e eu nunca havia levado ao menos um nome.

É verdade também que no início da minha adolescência eu pensava que nenhum garoto chegava aos pés daquele cabelo castanho e macio, os olhos cor de mel profundos e a boquinha rosada em forma de coração... Até cair a ficha da paixão platônica conforme eu amadurecia e continuava sozinha.

Minha escrita era meu refúgio, de qualquer forma, eu não tinha muito que me preocupar com minha vida no mundo exterior. Não havia muita coisa interessante além de um coração partido a cada três anos, quando eu me aventurava a desviar os olhos do caderno para o cara errado — toda vez.

— Hm, Júlia, não olha agora, mas aquele não é o Breno beijando a Fernanda? — lembrei-me da minha última decepção amorosa do colégio.

E então, o fato de postar minhas histórias na internet me deu uma vida mais apartada, isso mais acentuado ainda quando minha notoriedade foi gradualmente crescendo até que as editoras passassem a entrar em contato no segundo ano do meu colegial. Eu escrevia fanfics sobre o Justin Bieber desde os meus doze anos, tendo em vista que fiquei obcecada por ele com 11. Tudo aconteceu rápido demais, os livros mal chegavam nas prateleiras físicas e virtuais e foram devorados pelo público, alcancei muito mais do que a fanbase do meu cantor favorito, uma vez que tive que torná-la uma história original, ou seja, mudar todos os nomes para que pudesse ser publicada.

Já era inacreditável o bastante até que uma editora estadunidense entrou em contato com a minha para pedir autorização de publicar no país. O lançamento foi agendado para o começo do ano, de modo que pudéssemos ir no período de férias, chegando vinte dias antes daquele para fazer as reuniões que precisavam ser feitas e algumas entrevistas também. Minha mãe já era uma professora aposentada, e meu pai, gerente numa empresa multinacional de tintas, Carter Willians, pediu férias de trinta dias. Minha irmã estava apenas estudando por enquanto, e aquele era o período de recesso universitário de qualquer forma. Se precisássemos ficar mais por algum motivo profissional, minha mãe ficaria comigo e meu pai voltaria com Lara.

Eu me sentia como uma personagem estúpida de um filme adolescente. Ainda não conseguia acreditar na insanidade do que eu estava vivendo. Tinha a impressão de que piscaria e tudo voltaria ao normal. Por Deus, eu tinha até uma empresária agora.

Isso mudou todo o rumo da minha vida. Para me resguardar, eu decidi que faria uma faculdade de letras — até para aprimorar meu português —, com uma leve pressão dos meus pais, um plano alternativo caso eu não pudesse viver de fato como uma escritora para sempre. Com letras eu poderia ser professora pelo menos. Mas todos concordamos em me dar esse ano para me ajeitar com meu trabalho de escritora e depois prestar o vestibular.

O clima estava um pouco frio quando o avião pousou, uma diferença discrepante com o sol de 32º que havíamos deixado no Brasil. Abracei-me em meu casaco quente recém adquirido para a viagem, vendo os fios do meu cabelo voarem descontroladamente na frente dos meus olhos.

Litigious LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora